A decisão que as capitais europeias tomarem nos próximos meses não se joga apenas em tanques, drones e sistemas de defesa aérea, mas em biliões de euros, fronteiras internas sob pressão e margem de manobra para o Kremlin testar a NATO. Um novo exercício de risco traça dois caminhos para a guerra na Ucrânia e calcula que o cenário em que Moscovo impõe os termos da paz pode sair quase duas vezes mais caro à Europa do que financiar, em larga escala, a capacidade de resistência de Kiev

Um estudo publicado a 25 de Novembro pela consultora Corisk e pelo Instituto Norueguês de Assuntos Internacionais parte de uma pergunta simples — quanto custa a guerra, dependendo de quem tem a vantagem? — e responde com contas pesadas para o lado europeu.

Os autores desenham dois cenários militares e económicos para o conflito, tendo como pano de fundo a pressão de Washington para um plano de paz que poderá ser desfavorável à Ucrânia, e concluem que, qualquer que seja o desfecho, a maior parte da factura cairá sobre os orçamentos dos países europeus. A diferença, sublinham, é que aceitar uma vitória parcial russa significaria pagar mais, durante mais tempo e mais perto de casa.

No primeiro cenário, Moscovo continua a avançar devagar, consolidando ganhos no terreno até ao Dnipro e obrigando Kiev a um acordo negociado em termos favoráveis ao Kremlin. Essa “vitória parcial” daria à Rússia margem para influenciar a orientação política e económica da Ucrânia, incluindo dossiers como a adesão à União Europeia e à NATO.

O estudo admite que o país possa perder até metade do seu território, mergulhar numa instabilidade política prolongada e sofrer recuos democráticos profundos, com risco de falência do próprio Estado. Entre seis e 11 milhões de pessoas poderiam sair da Ucrânia em direcção a outros países europeus, com custos estimados entre 524 e 952 mil milhões de euros em quatro anos apenas em resposta humanitária e integração de refugiados. Se a isto se somar o reforço da defesa no flanco leste da NATO, os autores calculam um encargo total entre 1,2 e 1,6 biliões de euros, num cenário em que a Rússia ficaria ainda com liberdade para deslocar meios militares para a Moldávia, os países bálticos ou o Árctico, exigindo novas camadas de dissuasão.

Segundo cenário: apoiar Kiev, poupar dinheiro 

O segundo cenário inverte o sinal das mesmas variáveis. Com aquilo que o relatório classifica como um nível de apoio “adequado”, a Ucrânia poderia reconstruir superioridade de combate semelhante à das contra-ofensivas de 2022, recuperar zonas ocupadas e forçar a Rússia a negociar termos que salvaguardem os interesses vitais de Kiev.

Para lá chegar, seria preciso concentrar num a dois anos um pacote de meios que inclui entre 1500 e 2500 carros de combate, 2000 a 3000 sistemas de artilharia, até oito milhões de drones de vários tipos, sistemas de defesa aérea e mísseis estratégicos. Entregues essas capacidades, o estudo admite que a Ucrânia consiga travar o avanço russo, retomar áreas consideradas estratégicas e criar condições para alguma normalização política e recuperação económica.

Uma vitória parcial ucraniana aceleraria a integração na UE, facilitaria o regresso de parte dos refugiados e reduziria os prémios de risco exigidos pelos investidores. Nesta hipótese, o custo agregado para a Europa, somando ajuda militar, apoio à indústria de defesa e uma pressão menor nos sistemas de acolhimento, é estimado entre 522 e 838 mil milhões de euros em quatro anos — sensivelmente metade do cenário anterior — e poderia ser ainda reduzido se forem usados activos russos congelados para financiar parte do esforço.

E Trump no meio disto tudo? 

Em ambos os caminhos, o estudo assume que os Estados Unidos vão retirar-se devagar da linha da frente financeira e militar, deixando aos europeus a responsabilidade principal de sustentar a Ucrânia e de reforçar a sua própria defesa.

Não há corte súbito, mas um deslizamento: a ajuda norte-americana deixa de crescer, torna-se mais difícil de aprovar em Washington e, ao fim de dois a quatro anos, quase todo o esforço adicional em armas, treino, reconstrução, fronteiras e integração de refugiados é pago a partir de capitais europeias.

As conclusões chegam num momento em que os autores antecipam um buraco nas contas públicas ucranianas a meio de 2026 e em que a Comissão Europeia, com Ursula von der Leyen à frente, tenta fechar um esquema de “empréstimo de reparações” baseado em cerca de 140 mil milhões de euros de reservas do banco central russo imobilizadas.

Apesar das reservas de alguns líderes, Bruxelas e a maioria dos Estados-membros querem um acordo no Conselho Europeu de 18 e 19 de Dezembro, precisamente porque, nas palavras implícitas do estudo, cada mês que passa torna mais caro decidir não decidir.