Um aumento exponencial no número de satélites colocados em órbita baixa da Terra trouxe avanços nas telecomunicações, incluindo acesso à banda larga em áreas rurais e remotas ao redor do mundo. Isso também causou um aumento na poluição luminosa no espaço, que coloca em risco o trabalho realizado por observatórios astronômicos em órbita.
Um novo estudo liderado pela Nasa, focado em quatro telescópios espaciais — dois atualmente operando e dois planejados — estima que uma grande porcentagem das imagens obtidas por esses observatórios na próxima década pode ser comprometida pela luz emitida ou refletida por satélites que compartilham a mesma órbita baixa da Terra.
Os pesquisadores calcularam que cerca de 40% das imagens feitas pelo Telescópio Espacial Hubble, da Nasa, e cerca de 96% das imagens feitas pelo observatório SPHEREx, também da agência norte-americana, podem ser contaminadas pela luz dos satélites.
Eles calcularam que cerca de 96% das imagens do planejado observatório ARRAKIHS, da Agência Espacial Europeia, e do planejado telescópio Xuntian, da China, podem ser afetadas de forma semelhante.
O Hubble seria menos impactado devido ao seu campo de visão estreito, disseram os pesquisadores.
Telescópios em órbita são uma parte vital da exploração espacial. Eles podem observar uma faixa mais ampla do espectro eletromagnético do que as ferramentas terrestres, e a ausência de interferência atmosférica permite imagens mais nítidas do cosmos, possibilitando a observação direta de galáxias distantes ou de planetas fora do nosso Sistema Solar.
“Embora até agora a maior parte da poluição luminosa viesse de cidades e veículos, o crescimento das constelações de satélites de telecomunicação está começando a afetar rapidamente observatórios astronômicos em todo o mundo”, disse o astrônomo Alejandro Borlaff, do Centro de Pesquisa Ames da Nasa, na Califórnia, autor principal do estudo publicado na revista Nature.
“Enquanto os telescópios observam o Universo tentando revelar galáxias distantes, planetas e asteroides, satélites às vezes cruzam diante de suas câmeras, deixando rastros brilhantes que apagam o sinal fraco que recebemos do cosmos. Esse já era um problema conhecido para telescópios terrestres. Mas, até agora, acreditava-se que telescópios espaciais — muito mais caros e colocados em pontos de vista aparentemente intocados no espaço — estavam quase livres da poluição luminosa produzida pelo homem”, disse Borlaff.
Em 2019, havia cerca de 2.000 satélites em órbita baixa da Terra. Hoje, esse número é de aproximadamente 15.000. Borlaff disse que propostas da indústria preveem cerca de 560.000 satélites em órbita baixa da Terra na próxima década.
“Para se ter uma ideia de quanto esse número aumentou recentemente, lançamos mais satélites para a órbita baixa da Terra nos últimos quatro anos — de 2021 a 2025 — do que nas sete décadas anteriores de voos espaciais combinadas”, disse Borlaff.
Os pesquisadores usaram informações de operadores de satélites para simular as camadas orbitais de cada constelação — da Starlink (SpaceX), Guowang (China) e Amazon, entre outras. Depois consideraram propriedades específicas dos telescópios, como altitude orbital, trajetória, campo de visão e outros fatores.
“Quando tínhamos os telescópios simulados observando nosso universo simulado, só precisávamos contar o número de vezes que os satélites cruzavam — ou ‘fotobombavam’ — nossos observatórios, e quão brilhantes estavam no momento do evento”, disse Borlaff.
Os satélites refletem e emitem vários tipos de luz.
“Eles refletem diretamente a luz do Sol com seus painéis solares, mas também refletem luz da lua e da Terra, que é extremamente brilhante da órbita baixa. Além da luz óptica, os satélites também emitem radiação infravermelha gerada pela temperatura de seus componentes, além de refletirem ondas de rádio tanto da Terra quanto das próprias antenas”, explicou Borlaff.
Os pesquisadores disseram que uma forma de enfrentar o problema seria colocar satélites em órbitas mais baixas do que aquelas em que os telescópios operam.
Alguns deles colocados em órbitas mais distantes estão melhor protegidos contra poluição luminosa. O estudo, por exemplo, não analisou os efeitos dos satélites sobre o Telescópio Espacial James Webb, o observatório Euclid da ESA ou o planejado Telescópio Nancy Grace Roman, da Nasa.
Seus orbitais estão muito mais distantes da Terra do que os satélites de telecomunicação. “Por esse motivo, eles provavelmente não serão afetados por esse tipo de contaminação, por enquanto”, disse Borlaff.
No entanto, esses telescópios não representam a maior parte das observações astronômicas. “Eles são usados apenas para objetivos científicos muito específicos e têm um tempo operacional bastante limitado”, afirmou Borlaff.