Os documentos que os Estados Unidos têm enviado para a União Europeia têm anexos. E são esses anexos que preocupam
A Europa e a Ucrânia continuam a tentar perceber como é que podem sair por cima nas negociações de paz, mas os Estados Unidos já estão a pensar muito mais à frente. Sempre com olho no negócio, Donald Trump deixou bem claro, em vários documentos, que há mais para lá do fim dos combates.
Há sobretudo dinheiro para ganhar.
De acordo com Wall Street Journal, entre os vários documentos que têm chegado aos parceiros europeus está uma série de propostas financeiras que prometem revolucionar a economia da Ucrânia e talvez até a da Europa.
O problema, pelo menos na ótica europeia – e certamente que na ótica ucraniana – é que este plano prevê um regresso total da Rússia à economia global.
Desde o já muito falado setor das terras raras à perfuração de petróleo no Ártico, Donald Trump quer garantir que há negócio de sobra para as empresas norte-americanas, no que a Casa Branca espera que seja um restaurar das relações com o Kremlin.
Se estas ideias ainda pairam apenas nos bastidores, o que a Rússia vai dizendo confirma que essa é mesmo a direção em que caminhamos. Questionado sobre esta notícia do Wall Street Journal, o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, abriu as portas ao investimento estrangeiro, incluindo aquele que vem dos Estados Unidos.
E uma das portas de convergência pode entrar em choque direto com a União Europeia. De acordo com os vários anexos entregues pelos Estados Unidos, Donald Trump tem uma ideia diferente para os mais de 200 mil milhões de euros de bens russos que estão congelados no Velho Continente: em vez de os usar para reconstruir a Ucrânia como forma de reparação, o presidente norte-americano sugere antes que sejam investidos em projetos futuros, incluindo um centro de dados que será operado a partir de uma central nuclear atualmente ocupada pela Rússia.
Algumas das fontes do lado europeu que falaram ao Wall Street Journal sublinharam que não têm a certeza se algumas das propostas são para levar a sério, num claro sinal de que as pretensões de Donald Trump não foram bem acolhidas por este lado.
Um dos responsáveis comparou mesmo algumas ideias à já mítica Riviera que o presidente dos Estados Unidos chegou a sugerir para a Faixa de Gaza. Outro lembrou a Conferência de Ialta, na qual Estados Unidos, União Soviética e Reino Unido acordaram dividir a Europa no fim da Segunda Guerra Mundial.
Em sentido contrário está a União Europeia, que até está em vias de aprovar uma lei que prevê o fim total da importação de energia russa até 2027. Além disso, a tal questão dos bens congelados ameaça, desta forma, tornar-se um irritante entre aliados, sendo que mesmo entre os 27 a coisa está tremida, nomeadamente porque a Bélgica quer garantias de proteção legal, já que é lá que está a maioria do dinheiro em causa.
No fundo, e como escreve o Wall Street Journal, as divisões entre União Europeia e Estados Unidos ameaçam ir para lá das questões territoriais, entrando agora no campo económico.
Com a Rússia finalmente a sofrer as primeiras consequências económicas de vários meses e pacotes de sanções – há dados de uma recessão técnica nos últimos seis meses -, a União Europeia teme que o investimento norte-americano volte a dar pujança ao inimigo.
Se a perspetiva de deixar a Ucrânia na mó de baixo para conceder à Rússia uma vitória militar assusta a Europa, a ideia de que os Estados Unidos não só vão permitir, como vão contribuir para o ressurgimento do inimigo é uma pedra no sapato ainda maior.