O presidente da Câmara dos Deputados do Brasil conseguiu abrir oficialmente a sessão do plenário após dois dias de boicote e obstrução de deputados afectos ao ex-Presidente Jair Bolsonaro, que exigem a votação de um projecto de amnistia.
Passavam já das 22h locais (2h de quinta-feira em Lisboa) quando Hugo Motta, a muito custo, com cânticos, gritos, empurrões e rodeado de deputados bolsonaristas, conseguiu sentar-se na mesa da presidência da Câmara.
A Câmara dos Deputados foi aberta após as férias parlamentares e com dois dias de atraso, e a sessão durou cerca de meia hora.
“Está aberta a sessão sob a protecção de Deus”, disse Motta, rodeado de deputados em pé, à sua volta, e com os restantes deputados também em pé no local onde estão as cadeiras do plenário.
“Não podemos deixar que projectos pessoais e até projectos eleitorais possam estar à frente do que é maior que todos nós: o nosso povo”, disse, acrescentando, contudo, que não se vai “omitir sobre qualquer tema”.
Ainda assim, Mota voltou a avisar: “Essa mesa não será refém de nenhum tipo de ameaça. Não é um gesto de enfrentamento, é um gesto de reafirmação da democracia brasileira.”
Parlamentares da extrema-direita brasileira ocuparam as cadeiras das mesas directivas do Congresso e boicotaram os trabalhos pelo segundo dia e garantiram que só sairiam quando fosse colocado a votação o projecto de amnistia aos acusados de golpe de Estado.
Os parlamentares, que no dia anterior taparam a boca com fita adesiva em referência a uma alegada censura, pernoitaram no Congresso, desta vez acorrentando-se à mesa do presidente da Câmara dos Deputados, por forma a impedir o início das sessões parlamentares.
O boicote foi liderado pelos membros do Partido Liberal (PL), formação liderada por Jair Bolsonaro, em resposta à decisão tomada na segunda-feira, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), de ordenar a prisão domiciliária do ex-Presidente, no âmbito do processo em que é acusado de tentativa de golpe de Estado.
A decisão do STF ocorreu após a publicação de uma mensagem de Bolsonaro nas redes sociais dos seus aliados, e respectiva leitura durante as marchas que os seus apoiantes realizaram no domingo em várias cidades.
O juiz Alexandre de Moraes, instrutor do processo contra Bolsonaro, afirmou que a publicação da mensagem constituiu uma violação das medidas restritivas impostas anteriormente ao ex-Presidente, que o impedem de se expressar nas redes sociais.
Os deputados da oposição condicionam a normalização dos trabalhos no Congresso à votação de uma série de projectos a que chamaram “pacote da paz”, entre os quais figura uma amnistia que beneficia todos os condenados ou acusados de tentativa de golpe de Estado.
A proposta de amnistia visa centenas de bolsonaristas já condenados por terem participado nos violentos assaltos às sedes dos três poderes em 8 de Janeiro de 2023, quando milhares de radicais tentaram forçar um golpe de Estado.
O ex-Presidente está a ser julgado no Supremo Tribunal Federal num processo em que é acusado de ter liderado uma conspiração para tentar impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva, que o derrotou nas eleições de 2022.
O chamado “pacote da paz” também inclui um projecto para destituir Alexandre de Moraes como magistrado do STF e uma emenda constitucional para acabar com o privilégio de jurisdição, para que os deputados e ex-presidentes sejam julgados por tribunais de primeira instância e não directamente no Supremo Tribunal Federal, como acontece actualmente.