Terry Reid, alquimista vocal e compositor britânico cuja poderosa voz lhe rendeu o apelido de Superlungs (Superpulmões), morreu em 4 de agosto, em Rancho Mirage, Califórnia. Ele tinha 75 anos. Reid recusou a oportunidade de se tornar o vocalista do Led Zeppelin e, mesmo assim, foi celebrado como o “cantor dos cantores” por lendas como Aretha Franklin.
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Sua esposa, Annette Grady, informou que Reid morreu em um hospital devido a complicações de um câncer. Ele enfrentava diversos problemas de saúde e cancelou apresentações que estavam agendadas para julho.
No auge da carreira, no final dos anos 1960 e nos anos 1970, os estilos vocais poderosos de Reid foram comparados de forma elogiosa aos de Rod Stewart e Paul Rodgers, do Bad Company. Graham Nash, que produziu o álbum de Reid de 1976, “Seed of a Memory”, uma vez descreveu seu talento como “fenomenal”. Robert Plant, do Led Zeppelin, o chamou de “provavelmente o melhor cantor daquela época”.
Após lançar seu álbum de estreia, “Bang, Bang You’re Terry Reid”, em 1968, com apenas 18 anos, Aretha Franklin declarou: “Só existem três coisas acontecendo na Inglaterra: os Rolling Stones, os Beatles e Terry Reid.”
Capa do disco ‘bang, bang, you’re Terry Reid’: a partir da esquerda, o baterista Keith Webb, o vocalista Terry Reid e o tecladista Bill Bonham — Foto: Divulgação
Reid nunca teve um grande sucesso nas paradas, embora alguns de seus álbuns tenham se tornado obras-primas cult — especialmente “River” (1973), com sua mistura de blues, jazz, folk, R&B e música brasileira. Apesar de ter alcançado apenas a posição 172 na Billboard 200, a revista britânica Mojo mais tarde descreveu “River” como “um dos discos mais preguiçosamente magníficos daquele ou de qualquer outro ano.”
Sua música “Without Expression”, que ele compôs aos 14 anos e incluiu em seu primeiro álbum, foi posteriormente regravada por John Mellencamp, REO Speedwagon e outros artistas. Jack White, dos White Stripes, gravou a música “Rich Kid Blues”, de Reid, em 2008 com sua banda The Raconteurs.
Mesmo assim, a carreira de Reid frequentemente foi lembrada pelo que ele não fez.
Sua chance de alcançar a imortalidade no rock surgiu no final de 1968, quando o “mago da guitarra” Jimmy Page, ex-Yardbirds, estava formando seu novo projeto, inicialmente chamado New Yardbirds — que se tornaria o Led Zeppelin.
Page já conhecia bem o talento de Reid — uma voz que podia ir de um sussurro rouco a um grito de blues incandescente — já que Reid havia feito shows de abertura para os Yardbirds e ambos compartilhavam o mesmo empresário, o intimidador ex-lutador Peter Grant.
“Jim me ligou e disse: ‘Você seria ótimo como cantor da banda’”, contou Reid em uma entrevista à Mojo em 2016. Mas havia complicações, começando pelo seu contrato com o produtor pop Mickie Most, responsável por hits de artistas como The Animals e Donovan.
Além disso, havia os Rolling Stones. Reid havia feito um acordo informal com o guitarrista Keith Richards para acompanhá-los em sua turnê de 1969.
“Eu disse: ‘Sim, adoraria tentar’”, lembrou Reid em entrevista de 2007 ao jornal britânico The Independent. “‘Mas preciso dar uma passada rápida nessa turnê dos Stones e não quero ser o cara que vai dizer ao Keith que não vou mais.’”
“Ah, não, temos que fazer isso agora”, Reid se lembra de Page insistindo. O supergrupo Cream, com Eric Clapton, Ginger Baker e Jack Bruce, havia acabado, e “todo mundo em Londres estava tentando montar uma dessas bandas, então era uma corrida pra ver quem chegava primeiro”.
Em vez disso, Reid sugeriu dois integrantes de uma banda chamada Band of Joy — Plant, que tinha uma voz igualmente intensa, e o baterista explosivo John Bonham.
“Eu contribuí com metade da banda”, disse Reid depois. “Isso já é o suficiente da minha parte.”
Terrance James Reid nasceu em 13 de novembro de 1949, em St. Neots, cidade em Cambridgeshire, Inglaterra, filho único de Walter Reid, vendedor de carros, e Grace (Barker) Reid. Ele cresceu na vila próxima de Bluntisham e estudou na St. Ivo Academy em St. Ives.
Ele montou sua primeira banda, os Redbeats, aos 13 anos. Dois anos depois, abandonou a escola e entrou para Peter Jay and the Jaywalkers, que tiveram visibilidade ao abrir os shows dos Rolling Stones na turnê britânica de 1966.
Um dos shows, no Royal Albert Hall, foi “só meninas gritando”, contou Reid à Mojo. “Foi assustador. Você não ouvia nada, os ouvidos desligavam.”
Os Jaywalkers se separaram pouco depois, e Reid iniciou sua carreira solo. Sua habilidade de evitar momentos históricos continuou.
Na turnê dos Stones em 1969, Reid optou por não participar do show final — o caótico e violento Altamont Speedway Free Festival, onde um fã morreu. “Eu tive um mau pressentimento sobre Altamont e falei isso ao Keith”, lembrou mais tarde.
Nessa mesma época, outra oportunidade bateu à porta quando o guitarrista Ritchie Blackmore o convidou para ser o vocalista do Deep Purple, substituindo Rod Evans. Mais uma vez, Reid recusou, deixando a vaga para Ian Gillan.
“Eles estavam indo para um som mais hard rock, que não era muito a minha praia”, disse depois à Mojo.
Reid passou anos preso em litígios com Mickie Most. Eventualmente, se livrou disso e mudou-se para os Estados Unidos, onde assinou com a Atlantic Records.
Quando o presidente da gravadora, Ahmet Ertegun, ouviu “The River” pela primeira vez, disse a Reid: “Você me deu um álbum de jazz”, lembrou Reid à Mojo. “E era mesmo, no sentido em que “If I Could Only Remember My Name”, de David Crosby, ou “Astral Weeks”, de Van Morrison, são jazz.”
Sua carreira solo diminuiu nos anos 1980, embora ele tenha feito participações com artistas como Jackson Browne, Don Henley e Bonnie Raitt. Seu álbum de retorno, “The Driver”, lançado em 1991, contou com participações de Joe Walsh, Enya e Stewart Copeland, conhecido como baterista do The Police. Seu último álbum de estúdio, “The Other Side of the River”, saiu em 2016.
Além da esposa, Reid deixa duas filhas de um relacionamento anterior, Kelly e Holly Reid; e duas enteadas, Erin Grady Barbagelata e Chelsea King.
Após a morte de Reid, Plant — que permaneceu seu amigo — prestou homenagem nas redes sociais: “Que carisma. Sua voz, seu alcance… suas músicas capturando aquela era despreocupada… Superpulmões de fato.”
“Ele me lançou em um mundo novo e intenso que ele próprio escolheu não seguir”, acrescentou Plant.
Por sua parte, Reid — que passou a vida lidando com perguntas sobre a oportunidade que perdeu com o Led Zeppelin — não tinha certeza de que teria se tornado uma superestrela como Plant, em algum universo alternativo.
“Quem pode dizer o que teria acontecido se eu e o Jim tivéssemos montado uma banda?”, disse em entrevista ao The Independent. “Poderia ter sido um fracasso completo.”