Antes de ser completamente deixada de lado de uma discussão sobre uma guerra que decorre no seu próprio território, a Europa juntou-se para mandar uma mensagem externa e interna: também existe, está a ver tudo o que se passa e tem exigências
A Europa precisa de salvação e os Estados Unidos aparecem como um autêntico herói para o garantir. E isso vai acontecer “outra vez”, frisou o vice-presidente norte-americano, que está em Inglaterra.
Foi lá que JD Vance revelou uma conversa que teve com Donald Trump uns minutos antes de falar aos soldados norte-americanos estacionados numa base inglesa.
“Falei com ele mesmo antes de subir a palco e ele disse muito simplesmente que vamos fazer da nossa missão como administração voltar a trazer a paz à Europa outra vez”, disse.
Um discurso paternalista, sim, mas que muda um pouco o chip em relação àquilo que tem sido a visão que os Estados Unidos têm do Velho Continente. Afinal é para proteger os antigos aliados, tal como se protegeu nas duas guerras mundiais.
Contudo, e quase que adivinhando as palavras de JD Vance, a União Europeia fez por aparecer como um ator relevante, mesmo que a guerra que decorre na Europa vá ser discutida a meio mundo de distância e sem qualquer representante europeu.
O presidente do Conselho Europeu foi uma das vozes a aparecer de firmemente para mostrar ao mundo que também estamos em jogo. “Ninguém além da Ucrânia pode negociar os assuntos ucranianos”, afirmou António Costa, um dos altos representantes dos 27 Estados-membros numa reunião virtual que, além de Donald Trump, também contou com Volodymyr Zelensky e responsáveis dos vários governos europeus.
Very useful calls today on Ukraine 🇺🇦 with @POTUS, @ZelenskyyUa, and European leaders, ahead of the important bilateral meeting in Alaska.
The EU is determined to work closely and in unity with the U.S. to end Russia’s war of aggression and secure a just and lasting peace.
We… pic.twitter.com/dWr1Nnn5Vk
— António Costa (@eucopresident) August 13, 2025
Além da representação de Bruxelas, não faltaram ao encontro os líderes de França, Alemanha, Reino Unido, Itália ou Polónia.
Estão todos com Zelensky, que vê os seus aliados “positivos e unidos”, incluindo para a reunião de sexta-feira. Talvez com uma dose de utopia, o presidente ucraniano até soltou que espera poder ver um passo concreto rumo à paz no final desta semana.
A mensagem da União Europeia, essa, é clara: não há espaço a qualquer discussão territorial sem que a Ucrânia esteja na mesa das negociações. “Tudo ficou muito claro e expresso pelo presidente Trump… as questões territoriais sobre a Ucrânia só podem ser e só vão ser negociadas pelo presidente da Ucrânia”, reiterou Emmanuel Macron, que participou na chamada ao lado de António Costa.
“Esta é a posição que apoiamos e isso foi claramente dito por Trump”, acrescentou o presidente francês, colocando em palavras claras que Estados Unidos e Europa são um “nós”.
Em paralelo, o secretário-geral da NATO veio dizer que Estados Unidos e Ucrânia estão “unidos” para resolver o conflito, numa nova demonstração de união, mesmo que não muito forte.
E se do Alasca não sair nada de concreto? Aí, a União Europeia fez saber a Trump que tem de ser mais agressivo com o Putin. Foi o que disse o chanceler da Alemanha, Friedrich Merz, que pediu uma pressão renovada à Rússia caso não se verifiquem avanços em Anchorage.
Mostrando alinhamento com esta posição, o próprio Trump sugeriu que a Rússia “vai enfrentar consequências” caso continue com esta guerra. Mas o presidente norte-americano está mais confiante que isso, acreditando até que do Alasca pode sair um entendimento para uma reunião entre Putin e Zelensky que pode acontecer rapidamente.
Quanto ao grande medo da Europa, esse parece posto de lado. Segundo Macron, Trump concordou que eventuais concessões territoriais terão de ter sempre a palavra da Ucrânia. Se isso vai acontecer e, pior, como vai acontecer, é mais difícil de prever, já que Zelensky rejeita desde o primeiro minuto da invasão ceder qualquer milímetro de território ao invasor.
Aliás, em Kiev a questão vai muito para lá da ocupação de Lugansk, Donetsk, Zaporizhzhia ou Kherson. Só se entende a guerra por terminada com a devolução da Península da Crimeia, anexada pela Rússia em 2014.
Sem se falar de localidades em concreto, Costa retirou três coisas da chamada: “Primeiro que tudo, um cessar-fogo. Em segundo, ninguém além da Ucrânia pode negociar os assuntos ucranianos. Em terceiro, a disponibilidade dos Estados Unidos e da Europa em conjunto para fortalecer as condições de segurança assim que chegarmos a uma paz justa e duradoura na Ucrânia”.
Quanto à reunião da próxima sexta-feira, que vai deixar a Europa a ver navios, Macron e Costa, que depois falaram aos jornalistas, desejaram “o maior sucesso”, esperando mesmo que do Alasca saia algo que possa “obter um cessar-fogo e um caminho justo e aberto para a paz na Ucrânia”.