Por Laura Brito* — O Agosto Laranja foi criado pela Associação Amigos Múltiplos pela Esclerose com o objetivo de ser um movimento para conscientização sobre a condição crônica, fomento do diagnóstico precoce, acolhimento, respeito e dignidade para quem convive com a esclerose múltipla, seus amigos e familiares.

Esses movimentos de conscientização ultrapassam e muito a ideia de colorir roupas e ambientes. Eles são muito importantes para informar as pessoas sobre sintomas, validar desconfianças pessoais (será que o que eu estou sentindo é normal?) e incentivar a busca de um diagnóstico. Condições como a esclerose múltipla (EM) são complexas e a obtenção de uma resposta pode levar muito tempo, prejudicando o tratamento e a tomada das rédeas da própria saúde. Quanto antes acontecer a percepção e a orientação, melhor.

A esclerose múltipla é uma doença crônica, imunomediada e progressiva que pode levar à perda da autonomia com o avanço dos sintomas. As manifestações mais comuns são a fadiga crônica e o comprometimento severo da mobilidade. Contudo, ela se manifesta de formas muito diferentes nos indivíduos e suas consequências na vida da pessoa dependem do tipo de EM e do contexto biopsicossocial: o momento do recebimento do diagnóstico, os tratamentos a que a pessoa foi submetida e a qualidade de vida que ela pode manter.

Diante disso, a pessoa que vive com EM pode vir a ter o desejo de explorar seu prognóstico e elaborar diretivas antecipadas de vontade. As DAVs mais conhecidas são o mandato duradouro e o testamento vital. O primeiro é a nomeação de um procurador de saúde que possa tomar decisões caso o mandante não possa comunicar sua vontade. O testamento vital, por sua vez, é um documento em que o paciente define os cuidados, tratamentos e procedimentos médicos que deseja ou não para si mesmo, que deverá ser colocado em prática em caso de doença que ameaça a vida e de impossibilidade de manifestação da vontade.

Além dos desafios físicos, a esclerose múltipla pode trazer disfunção cognitiva. Dificuldade em encontrar as palavras, lapsos de memória, dificuldade de planejamento ou concentração são possibilidades no avanço dessa condição neurológica. Por isso, a pessoa com EM pode ter a necessidade de ser apoiada ou representada em suas decisões, ou seja, ter outra pessoa indicada para assisti-la ou representá-la na gestão de sua renda e/ou patrimônio.

No Direito brasileiro esse apoio ou representação acontecem por meio da tomada de decisão apoiada ou da curatela, que podem ser determinadas judicialmente para que a pessoa vulnerabilizada pela esclerose tenha proteção financeira. Para garantir que essa representação seja de acordo com a sua vontade, ela pode deixar orientações sobre quem deseja que seja seu curador em caso de necessidade, a autocuratela.

Isso sem falar que a pessoa que recebe o diagnóstico de esclerose múltipla pode querer fazer um planejamento patrimonial voltado para a proteção de sua dignidade ou de sua família.

Por isso, a conscientização da esclerose múltipla passa também pelo campo jurídico, pela divulgação da informação de que há muitos instrumentos no Direito de proteção da autodeterminação, inclusive frente a um diagnóstico desafiador da autonomia.

Advogada especialista em direito de família e das sucessões, possui doutorado e mestrado pela USP e atua como professora em cursos de pós-graduação*

Opinião – Correio Braziliense