O Bobo da Corte Dom Diego de Acedo (1645) – Diego Velázquez – Museu do Prado, Madri
Quer escrever um livro?
Pergunte-me como.
Basta abrir um desses sites anunciados no Instagram, digitar duas ou três frases soltas — alguma coisa como “quero um romance histórico, com toques de humor, sobre os índios curimataús” ou “faça um guia espiritual para devotos de Santa Rita do Inharé” — e pronto: em menos de fósforo, um livro inteirinho surge como mágica.
Sem noites mal dormidas, sem bloqueio criativo, sem precisar saber a diferença entre prefácio e epígrafe.
Essas plataformas vendem o sonho dourado da capa dura, com seu nome em letras garrafais, para que você possa exibir orgulhosamente nas redes sociais o título de “escritor publicado”.
Quem vai perder tempo para escrever quando se pode pagar 49,90 reais para alguém — ou algo — fazer o trabalho?
Muitas dessas obras-primas nascem de instruções tão vagas que poderiam servir para qualquer tipo de livro.
Textos genéricos, recheados de frases prontas, que assoletradas, não dizem nada.
É como se um cardápio inteiro fosse feito só de sopas instantâneas: o sabor muda no rótulo, mas no fundo é sempre o mesmo caldo ralo.
Mas tudo tem de vir muito bem embrulhado.
Capas elegantes, sinopses empolgantes e diagramação de dar inveja a revista de colunista social.
O leitor menos atento até acredita estar diante de uma pedra preciosa, mas a pirita não passa de um manual reciclado com adjetivos novos e algumas palavras pernósticas.
No marketing, a primeira impressão vale mais do que o conteúdo, como uma imagem, que mil verbetes.
Há quem diga que isso é a democratização da escrita.
Na prática, é o mesmo que comprar um bolo de padaria e dizer que foi você quem fez.
Engana os convidados, até que alguém pergunte pela receita.
A inundação do mercado com livros descartáveis transforma a ideia de “escrever”, um apertar de botão. Ou será, um delicado toque na telinha do smartphone?
Escrever um livro já é tão fácil quanto pedir uma pizza,
Publicar um romance épico só depende de uma boa conexão de internet e um cartão de crédito de banco eletrônico.
Depois da big party do badalado lançamento em noite de autógrafos, é só esperar pela crítica.
Que pode ser tão ferina quanto a do neto de dez anos:
– Vovô, seu livro bateu todos os recordes.
O exemplar de estreia deste aprendiz de cronista, passado mais de um ano de doado à biblioteca da escola, a pedido dele, nunca recebeu uma só solicitação de empréstimo ou consulta.
O bobo da corte Don Juan da Áustria (1633) – Diego Velázquez- Museu do Prado, Madri
Nota do Redator
O segundo livro do autor, “Margarida por exemplo” está sendo lançado hoje – para convidados – já está disponível na Amazon/ Kindle e brevemente, na biblioteca da escola de Luiz.