Radicado em São Paulo desde os anos 1970, o jornalista e escritor mineiro Humberto Werneck (foto) volta a Belo Horizonte na próxima semana para bate-papo e autógrafos do mais recente livro. “Viagem no país da crônica” (Tinta da China, 304 páginas), lançado em junho, será um dos principais temas da conversa com José Eduardo Gonçalves em edição especial do projeto “Letra em cena”, na terça-feira (19/8), às 19h, no Centro Cultural Unimed-BH Minas (R. da Bahia, 2244), com leitura de textos de Werneck por Arildo de Barros. “Jornalista de saber enciclopédico quando se trata de refletir sobre a crônica, gênero no qual ele pontifica como um dos grandes, Humberto nos traz mais um tesouro lapidado com a verve habitual”, afirma José Eduardo. “O livro ‘Viagem no país da crônica’ é um verdadeiro inventário de temas e personagens que marcam a crônica brasileira. É impossível sair desse livro sem o desejo febril de ler todos aqueles craques”, complementa. As inscrições para o evento são gratuitas e podem ser feitas na Sympla.

Ainda na cidade natal, o autor de “O desatino da rapaziada” e “O santo sujo” autografa o novo livro (que traz um tristonho “patinho feio” na capa, em referência ao tratamento pejorativo que a crônica costuma receber) no próximo sábado, às 11h, na Livraria Quixote (R. Fernandes Tourinho, 274). “Este livro reúne quase 80 textos que escrevi para o Portal da Crônica Brasileira, território abençoado que nos oferece nada menos de 3.600 crônicas de grandes autores, a maioria delas jamais publicada em livro”, conta.

Confira, a seguir, a entrevista de Humberto Werneck ao Pensar do Estado de Minas.

Que país é narrado nas crônicas do livro?

O país em questão é aquele onde a crônica, trazida da França há mais de século e meio, se sentiu em casa – mais à vontade até do que no país de origem. Assim como o futebol, importado da Inglaterra, aqui ela se miscigenou, ganhou uma cara e uma cintura que não tinha lá. No livro em questão, a viagem se concentra no momento mais brilhante da bem-vinda forasteira: a chamada Era de Ouro de Crônica, cintilante de meados dos anos 1940 a meados dos 60.

Por que a crônica ainda é considerada o patinho feio da literatura e o que a impede de virar cisne?

A crônica foi rebaixada a patinho feio porque uns feitores da literatura nacional – cada vez menos numerosos, felizmente – torceram o empinado nariz e a carimbaram como subgênero das letras. Sou a favor de que a crônica, tão próxima de nós, assuma com orgulho o rótulo de patinho feio, bem mais simpático que o de cisne, esse posudo parente. Posudo e bem-comportado. Sabia que os cisnes vivem em regime de monogamia?

A crônica, ou ao menos o gênero como foi estabelecido por nomes como Paulo Mendes Campos, Drummond e tantos outros, morreu no século 20 ou ela é “um perpétuo vaivém”?

A crônica sempre dependeu da imprensa para existir, e quando os meios digitais começaram a sangrar os jornais e as revistas, também ela entrou em crise. Despejada, ainda não sabe onde poderá morar. Mas assim como o jornalismo, que com certeza vai se adaptar e sobreviver à crise da imprensa, nosso indispensável patinho feio também vai encontrar seu pouso.

Quando o cronista rende crônica? E quando a palavra é assunto?

A crônica, como a vejo, não é lugar para quem se deleita na contemplação do próprio umbigo. O cronista genuíno é um observador apaixonado do que há em torno. O que não impede que ele às vezes descubra em si mesmo algo digno de ser mostrado. Acontece quando o cronista topa com um caco de espelho, e esse espelho lhe devolve imagem mais interessante do que seu umbigo. Quanto à palavra, a gente sabe que um bom observador costuma ser também um bom escutador.

Por que tantos mineiros se tornaram cronistas tão conhecidos?

Há quem diga que em outros tempos o escritor mineiro esteve condenado ao isolamento e à moral abafada da província. Longe da praia, com a visão toldada pelo biombo das montanhas, o jeito foi refugiar-se na literatura, passando a viver no papel o que no mundo era impraticável. O tempo deu um jeito nisso, diz quem sustenta tal enredo, e Minas já não é aquela. Mas ficou nos mineiros o gosto de viver por escrito – inclusive entre aqueles que batem asas rumo a praças mais pródigas em aplausos & cifrões.