Uma nova imagem revelou o vislumbre mais nítido de sempre de um visitante interestelar a passar pelo nosso sistema solar.

O Telescópio Hubble e a sua Wide Field Camera 3 [câmara de campo amplo] obtiveram uma vista incrível do cometa 3I/ATLAS, que veio de fora do nosso sistema solar, a 21 de julho, quando este estava a 445 milhões de quilómetros da Terra.

Na imagem, pode ver-se um casulo de poeira em forma de lágrima a sair do núcleo gelado do cometa. O núcleo de um cometa é o seu núcleo sólido, feito de gelo, poeira e rochas. Quando os cometas se aproximam de estrelas como o Sol, o calor faz com que libertem gás e poeira, o que cria as suas caudas características.

O venerável telescópio é apenas um dos muitos que estão a ser usados para seguir o cometa, descoberto pela primeira vez a 1 de julho, à medida que se aproxima a uma velocidade de 209.000 quilómetros por hora. A sua velocidade faz do 3I/ATLAS o objeto mais rápido originário de fora do nosso sistema solar a ser observado a viajar através dele.

Novas observações, como as feitas com o Hubble, estão a lançar mais luz sobre o tamanho do cometa. O pequeno núcleo, que não pode ser visto diretamente, pode ter até 5,6 quilómetros de diâmetro ou 305 metros de largura, de acordo com um novo artigo aceite pelo The Astrophysical Journal Letters.

Entretanto, outros telescópios espaciais como o James Webb Space Telescope, o Transiting Exoplanet Survey Satellite e o Neil Gehrels Swift Observatory, juntamente com observações terrestres do W.M. Keck Observatory no Havai, poderão revelar mais sobre a composição química do objeto. Espera-se que o cometa permaneça visível aos telescópios terrestres até setembro, antes de passar demasiado perto do Sol para ser visto até reaparecer do outro lado da nossa estrela no início de dezembro.

Mas subsistem grandes questões sobre o 3I/ATLAS, algumas das quais poderão ser impossíveis de responder – incluindo a sua origem exata.

“Ninguém sabe de onde veio o cometa. É como vislumbrar uma bala de espingarda durante um milésimo de segundo. Não se pode projetar isso com precisão para descobrir onde começou o seu percurso”, diz o autor principal do estudo, David Jewitt, professor de astronomia na Universidade da Califórnia, em Los Angeles, em comunicado.

Um visitante veloz

Os astrónomos da Agência Espacial Europeia observaram o cometa interestelar 3I/ATLAS no início de julho. ESA/Observatório de Las Cumbres

Embora o cometa pareça comportar-se como os que têm origem no nosso sistema solar – como evidenciado pela pluma de poeira que o Hubble captou – a velocidade do 3I/ATLAS é um indicador de que se trata de um visitante de outro sistema solar da nossa galáxia.

Os cientistas estimam que tem estado a viajar pelo espaço interestelar há milhares de milhões de anos. À medida que os objetos viajam pelo espaço, sofrem um efeito de fisga gravitacional ao passarem por estrelas e viveiros estelares, o que aumenta o seu impulso. Assim, quanto mais tempo o 3I/ATLAS tiver passado no espaço, mais depressa se move.

O cometa é apenas o terceiro objeto interestelar conhecido a ser observado no nosso sistema solar, depois do Oumuamua em 2017 e do 2I/Borisov em 2019.

“O 3I, em particular, é notável devido à sua velocidade”, observa Matthew Hopkins, estudante de doutoramento no departamento de física da Universidade de Oxford, no Reino Unido, autor de um estudo separado sobre o objeto. “Esta velocidade é muito útil para nós, em particular, porque nos últimos anos eu e os meus coautores temos vindo a construir um modelo que nos permite prever propriedades de (objetos interestelares), tais como a sua idade e composição, apenas a partir da sua velocidade.”

Para Hopkins, a descoberta do 3I/ATLAS foi incrivelmente fortuita. A descoberta ocorreu apenas cinco dias depois de ele ter terminado o seu trabalho de doutoramento, que envolveu muito tempo gasto a fazer previsões sobre futuras descobertas de objetos interestelares. Dentro de alguns meses, Hopkins iniciará uma bolsa de investigação de pós-doutoramento na Universidade de Canterbury, na Nova Zelândia, onde continuará a investigar o 3I/ATLAS.

Durante os seus estudos de doutoramento, Hopkins e os seus colaboradores na Nova Zelândia desenvolveram o modelo Ōtautahi-Oxford, uma combinação de dados da população estelar da Via Láctea e de modelos de formação de sistemas planetários que podem ajudar os astrónomos a determinar como devem ser as populações de objetos interestelares. Agora, Hopkins é o autor principal de um estudo separado sobre o 3I/ATLAS.

Detetar objetos interestelares no futuro

É difícil determinar a idade dos objetos interestelares, mas Hopkins e os seus colegas acreditam que o 3I/ATLAS tem cerca de 67% de hipóteses de ter mais de 7,6 mil milhões de anos – enquanto o nosso Sol, o sistema solar e os seus cometas têm apenas 4,5 mil milhões de anos, afirma.

É um puro acaso que o cometa interestelar tenha entrado no nosso sistema solar – mas não é totalmente raro, considera Hopkins. Na maior parte das vezes, não vemos estes visitantes.

“Os objetos interestelares estão sempre a passar pelo Sistema Solar, especialmente os mais pequenos, que são mais numerosos: 80 do tamanho do Oumuamua (cerca de 200 metros de diâmetro) passam pela órbita de Júpiter todos os anos, mas são demasiado pequenos para serem detetados, a não ser que se aproximem muito da Terra”, escreveu Hopkins num e-mail.

No entanto, os astrónomos estão ansiosos por ter o Observatório Vera C. Rubin [situado no Chile], que divulgou as suas primeiras imagens este verão, a varrer os céus em busca de objetos interestelares. Com o seu enorme espelho primário de 8,4 metros de diâmetro, o observatório consegue detetar objetos pequenos, ténues e distantes – e está a varrer todo o céu de três em três noites, o que permite ao telescópio ver melhor os objetos interestelares que se movem rapidamente.

Os coautores de Hopkins estimam que o Rubin poderá espiar entre cinco e 50 objetos interestelares nos próximos dez anos, e Hopkins está otimista quanto a esta última hipótese. A descoberta de mais objetos interestelares pode ajudar os astrónomos a determinar a sua variedade ou semelhança, especialmente porque os três primeiros são tão diferentes uns dos outros, aponta Hopkins.

“Este último turista interestelar faz parte de uma população de objetos anteriormente não detetados, que irão emergir gradualmente”, indica Jewitt. “Isto é agora possível porque temos poderosas capacidades de observação do céu que não tínhamos antes. Ultrapassámos um limiar”.