As críticas à presença do primeiro-ministro, Luís Montenegro, e de vários membros do Governo na Festa do Pontal, no calçadão de Quarteira, no Algarve, enquanto o país tentava combater dezenas de incêndios, que têm surgido sobretudo da esquerda, estenderam-se à direita. Os ex-líderes do CDS e da Iniciativa Liberal (IL), Francisco Rodrigues dos Santos e Rui Rocha, respectivamente, também reprovam a actuação do chefe do executivo.
Para Rodrigues dos Santos, o Pontal “não foi uma rentrée, foi um tiro no pé” e “nunca o contraste entre os festivaleiros de Quarteira e os residentes do país rural, do interior de Portugal, foi tão gritante e clamoroso”.
Já Rui Rocha disse que o anúncio do regresso do circuito de Fórmula 1 ao Algarve “está ao nível de afirmar que a final da Champions é uma compensação para os profissionais de saúde” ― uma afirmação feita por António Costa em 2020, na sequência da pandemia, que causou polémica.
O que aconteceu nos últimos dias “é todo um tratado sobre o abandono do interior do nosso país, e eu posso dizê-lo com propriedade porque sou de Oliveira do Hospital e senti de perto a frustração, o pânico com que estas pessoas se debateram a tentar proteger-se e ao seu património”, afirmou Rodrigues dos Santos, este sábado à noite, no seu espaço de comentário na CNN Portugal.
Para o ex-líder do CDS, “só houve uma coisa em comum entre a agenda do primeiro-ministro e o resto do país: é que ela foi pintada em tons de cor de laranja”. “Por um lado, as do partido do primeiro-ministro que estava em festa, sendo a grande figura de cartaz o próprio, e o cor de laranja que luzia das chamas que contaminaram zonas do país, lançando o terror”, continuou o centrista, que entende que a resposta do executivo foi “negativa” e que perdeu uma oportunidade “para dizer ‘presente’”.
Quanto às férias de Luís Montenegro — que foram canceladas no dia a seguir —, Rodrigues dos Santos destaca que “é óbvio” que o facto de o primeiro-ministro não estar de férias “não fazia com que os incêndios terminassem mais depressa”, mas “havia uma consequência política, de simbologia”.
Para o centrista, “este fogo veio mostrar aquilo que tem faltado a este Governo, que é presença, empatia e liderança”. “Aquilo que Luís Montenegro teve para oferecer foi silêncio, ausência e apatia. E isto não é perdoável a um primeiro-ministro”, que “falhou no capital de confiança que nunca se pode romper”, defendeu.
Sobre o discurso no Pontal, a análise de Rodrigues dos Santos é a de que “Luís Montenegro, como é seu apanágio, só fala na maré alta” e que não visitou nenhum dos territórios afectados pelos incêndios “para não passar a imagem de político impotente e inconsequente na gestão de uma crise desta dimensão e magnitude”.
O anúncio do regresso da Fórmula 1 ao Algarve
O ex-líder do CDS disse ainda ter assistido, através do arquivo digital da RTP, “a um vídeo do antigo Presidente da República, Ramalho Eanes, em 1980”. “Quando ardia a Serra de Lousã, deslocou-se ao terreno, e quando o jornalista lhe perguntou se a situação não era demasiado perigosa para um Presidente da República estar no local, respondeu que não, porque era preciso transmitir calma às populações e às pessoas”, relatou.
“Ora, Luís Montenegro achou que a forma de o fazer era anunciar o regresso do ciclo de Fórmula 1 ao Algarve. Enfim, acho que em 1980 tínhamos Ramalho Eanes a Presidente da República e Francisco Sá Carneiro a primeiro-ministro. Hoje, temos Marcelo Rebelo de Sousa e Luís Montenegro, que tantas vezes citou Francisco Sá Carneiro que parecia querer ser um novo Francisco Sá Carneiro. Acho que com esta situação acabou por ser um novo Miguel Albuquerque. Já não bastava as suspeitas sobre as suas actividades económicas, respondeu da mesma maneira: em férias, bronzeado, quando o seu território ardia”, concluiu.
Também o ex-presidente da IL, Rui Rocha, foi crítico do discurso de Luís Montenegro no Pontal. Na rede social X, ainda na noite de quinta-feira, escreveu: “Anunciar a Fórmula 1 numa noite em que parte do país é consumido por incêndios está ao nível de afirmar que a final da Champions é uma compensação para os profissionais de saúde.”
No dia a seguir, depois de ter sido noticiado que Portugal iria activar o Mecanismo Europeu de Protecção Civil (MEPC), o liberal fez outra publicação onde questiona o que mudou, argumentando que no dia anterior o Governo considerava que esse instrumento “não era necessário”.
O próprio deu a resposta: “Simples: ontem era o Pontal e seria uma vergonha ainda maior festejar enquanto se pedia ajuda à Europa. A chegada do auxílio teve de esperar pelo fim da festa.”