O anticonvulsivo pregabalina, comumente prescrito para tratar a dor crônica, pode aumentar o risco de insuficiência cardíaca, particularmente nos pacientes com história de doença cardiovascular, sugerem novos dados.
Em uma coorte com mais de 240.000 beneficiários do Medicare com quadro dor crônica sem ser de origem neoplásica, o início da pregabalina foi associado a 48% mais risco de abertura do quadro de insuficiência cardíaca em geral e a um risco 85% maior entre aqueles com história de doença cardiovascular do que pelo início da gabapentina.
Este estudo foi publicado on-line em 1.º de agosto no periódico JAMA Network Open.
Medicamentos amplamente prescritos
A dor crônica acomete até 30% dos idosos com 65 anos ou mais. Medicamentos que não são derivados de opioides, como os gabapentinoides pregabalina e gabapentina, são amplamente prescritos para tratar o quadro, observaram os pesquisadores, liderados pela médica Dra. Elizabeth Park, do Columbia University Irving Medical Center, nos Estados Unidos.
A pregabalina tem maior potência que a gabapentina na ligação à subunidade α2δ do canal de cálcio do tipo L e, portanto, pode estar associada a aumento do risco de insuficiência cardíaca por causar retenção de sódio e água.
Para investigar a questão mais a fundo, os pesquisadores avaliaram 246.237 beneficiários do Medicare entre 2014 e 2018, dos quais 18.622 (8%) eram novos usuários de pregabalina e 227.615 (92%) novos usuários de gabapentina. Todos os pacientes tinham entre 65 e 89 anos, apresentavam dor crônica sem ser de origem neoplásica e não tinham história de insuficiência cardíaca.
Os pesquisadores usaram a probabilidade inversa de ponderação do tratamento para ajustar uma extensa lista de 231 covariáveis no intuito de diminuir os fatores de confusão e tentaram emular com precisão um estudo hipotético no qual pacientes do Medicare pegaram na farmácia seus medicamentos prescritos, pregabalina ou gabapentina, para tratar a dor, exceto a de origem neoplásica.
Considerando 114.113 pessoas-ano de acompanhamento, 1.470 pacientes foram internados ou tiveram que ser atendidos no pronto-socorro por insuficiência cardíaca. A prevalência de insuficiência cardíaca por 1.000 pessoas-ano foi de 18,2 para a pregabalina e de 12,5 para a gabapentina — o que representa aproximadamente mais seis casos de insuficiência cardíaca por ano para cada 1.000 pacientes tratados com pregabalina — com uma razão de risco ajustada (RRa) de 1,48.
A diferença foi ainda mais acentuada entre os pacientes com história de doença cardiovascular, com uma RRa de 1,85. Também foi observado aumento do risco de diagnóstico ambulatorial de insuficiência cardíaca (RRa de 1,27), mas não houve diferença no número de mortes por todas as causas entre os grupos.
Os autores disseram que as descobertas reiteram as recomendações atuais da European Medicines Agency para ter cautela ao prescrever a pregabalina para idosos com doença cardiovascular.
A American Heart Association dos EUA atualmente lista a pregabalina, mas não a gabapentina, como medicamento que pode causar ou agravar a insuficiência cardíaca.
Implicações clínicas imediatas
Convidados a comentar o estudo, os médicos Dr. Robert Zhang, do Weill Cornell Medicine, nos EUA, e Dr. Edo Birati, do Centro Médico Tzafon, em Israel, observaram que o estudo traz “informações oportunas e clinicamente relevantes” sobre a segurança cardiovascular desses dois gabapentinoides amplamente utilizados. Do ponto de vista clínico, as descobertas têm “implicações clínicas imediatas”, escreveram eles.
Para os idosos com dor crônica, particularmente os que têm doença cardiovascular, “os médicos devem ponderar os potenciais riscos cardiovasculares associados à pregabalina em relação aos seus benefícios analgésicos. A ponderação é particularmente relevante devido ao uso crescente de gabapentinoides para os idosos e aos eternos problemas de polifarmácia nessa faixa etária”, orientaram o Dr. Robert e o Dr. Edo.
“Além disso, se o uso da pregabalina for associado à abertura do quadro de insuficiência cardíaca, isso levanta a possibilidade de que o medicamento possa desmascarar uma doença cardiovascular subclínica, o que sugere a necessidade de uma avaliação cardíaca criteriosa antes de prescrever este medicamento”, acrescentaram os pesquisadores.
“O estudo serve como importante lembrete de que nem todos os gabapentinoides são criados da mesma forma e que, na busca por um controle mais seguro da dor, a vigilância contra iatrogenias inadvertidas continua sendo primordial”, concluíram os pesquisadores.
O estudo não teve financiamento comercial. Os autores e redatores do editorial informaram não ter conflitos de interesse.
Este conteúdo foi traduzido do Medscape