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O alerta chegou de madrugada. O presidente da Câmara da Covilhã pedia a quem estivesse em dez aldeias do concelho para não saírem. À tarde, era o Fundão a fazer o mesmo apelo nas zonas de Silvares e Lavacolhos. Na Pampilhosa da Serra nem era preciso qualquer pedido, as chamas eram tantas que ninguém se atrevia a sair no Carregal, em Dornelas do Zêzere, Malhada do Rei, Arranhadouro, Adurão, Porto de Vacas, Selada Porta, Portas do Souto, entre outras.
O incêndio de grandes dimensões que está a atingir estes três concelhos está a colocar em perigo várias casas esta segunda-feira em muitas aldeias que se viram obrigadas a ficar em confinamento. Em Lavacolhos, fez 350 a 400 pessoas (número superior ao habitual devido às férias dos emigrantes) refugiarem-se no centro da aldeia para se protegerem das chamas.
“O fogo passou pelas casas, mas não houve danos até agora. Conseguimos precaver. Agora há casas isoladas, mas as pessoas estão todas na aldeia, juntas, e não saem do centro”, afirmou o presidente da Junta de Freguesia de Lavacolhos, Paulo Barbosa, ao Observador.
O autarca denunciou a falta de meios no combate, referindo que “não há recursos“. “É uma desgraça mesmo. O plano agora é minimizar e tentar salvar o que resta do património das pessoas”, acrescentou. Segundo destacou Paulo Barbosa, a ajuda da população foi crucial: “Se não fossem os bombeiros e os populares, teria sido uma tragédia. Não há meios aéreos, faltam veículos e bombeiros”, disse Paulo Barbosa, reiterando que “os populares foram uma grande ajuda”.
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Na zona, ao início da noite, são várias as frentes ativas: uma proveniente do fogo da Covilhã que atingiu Silvares, uma frente que circundou Lavacolhos e outra que está a colocar em perigo a aldeia de Enxabarda. A Câmara do Fundão ativou, aliás, esta segunda-feira, o Plano Municipal de Emergência e Proteção Civil, devido aos incêndios na Covilhã que estavam na “iminência de entrar” no seu território.
Posteriormente, e já na tarde desta segunda-feira, a autarquia pediu, nas redes sociais, para “se evitarem deslocações desnecessárias, para evitar riscos e para não interferir com as operações de socorro”, uma vez que o fogo já “lavra no concelho, nomeadamente nas localidades de Lavacolhos e Silvares”.
Nas aldeias vizinhas de Barco e Dominguizo, na Covilhã, os habitantes relatam o receio pelo avanço das chamas, mas também descrevem a entreajuda da população perante a falta de meios no terreno.
Numa nota, o município da Covilhã tinha solicitado, já depois da meia noite, às populações para se manterem “em confinamento nas suas freguesias” e para escolherem um “local seguro para permanecer”.
A autarquia pedia ainda para que evitassem circular nas estradas das freguesias de Aldeia de São João de Assis, São Jorge da Beira, Sobral de São Miguel, Unhais da Serra, Cortes do Meio, Ourondo, Erada, Paul, Dominguizo e Barco/Coutada.
Uma colaboradora do restaurante “O Olival”, em Barco, descreve ao Observador um cenário que já ultrapassou a capacidade de controlo. “A situação está descontrolada“, lamenta a mulher, explicando que, até ao momento, as casas ainda não correm perigo, mas esse alívio pode ser temporário. A principal dificuldade, segundo explica, está nas condições atmosféricas: “Faz muito vento, o que dificulta toda a operação”.
Para além disso, a funcionária do restaurante lamenta a escassez de recursos no terreno. “Os habitantes estão a ajudar porque há falta de meios, poucos bombeiros“, descreve, destacando o papel da população na defesa das próprias casas e propriedades. A cooperação entre vizinhos torna-se essencial, mas também evidencia a fragilidade estrutural no combate ao fogo. “A serra vai arder toda. Não há hipótese”, lamenta.
Por seu turno, e noutra perspetiva, um empregado do restaurante “O Marinheiro”, em Dominguizo, procura transmitir alguma calma. “Só há fumo”, assegura ao Observador, reforçando que, neste momento, “não há incêndio, não há riscos nem casas em perigo“. Para este morador, o fogo mantém-se afastado, “para os lados da Coutada/ Barco”, o que, por enquanto, deixa a aldeia numa situação mais estável.
Apesar disso, o funcionário sublinha que a população não está a baixar a guarda: “Estão a seguir as ordens da autarquia: não sair à rua”. O cumprimento das instruções municipais é visto como uma forma de evitar riscos desnecessários, principalmente numa fase em que a evolução do incêndio pode mudar de um momento para o outro, devido aos ventos fortes.
“Um inferno”, viviam também as aldeias do concelho vizinho do Fundão, a Pampilhosa da Serra, igualmente atingida pelo fogo do Piodão, em Arganil, que começou no dia 13. “Isto parece o fim do mundo”, dizia ao telefone Alda Alves, que está a passar férias na sua aldeia natal, Portas do Souto, a dez minutos de carro da junta de freguesia de Dornelas do Zêzere.
Dali ninguém pensava em sair. Não havia como. O fogo caminhava de várias direções no sentido da aldeia. Os poucos residentes muniam-se ao fim da tarde de mangueiras, para tentar travar as chamas que vinham do lado direito, de Adurão, enquanto rezavam para que o fogo do Carregal, do mesmo lado mas de cima, não chegasse e queimasse o cemitério, que o incêndio que continuava mais acima mas do lado direito, na Selada Porta, não descesse o quilómetro que a separa da aldeia e que um outro abaixo, junto à ribeira, não galgasse os dois quilómetros até às casas.
Não havia bombeiros por perto. Estavam noutros pontos, como no Carregal, onde as chamas entravam na aldeia e um lar de idosos com 50 utentes fechava portas, janelas e estores para se protegerem, pois era mais perigoso retirá-los do que mantê-los encerrados nas instalações.
Com a noite a chegar, o medo aumenta nestas aldeias isoladas pelo fogo, que se preparam para, pela segunda vez consecutiva, não dormir.