Comer três porções de batatas fritas por semana está associado a um risco 20% maior de desenvolver diabetes tipo 2. Se o alimento surgir à mesa cozido ou assado, no entanto, o efeito não é significativo. Essas são as principais conclusões de um estudo publicado no jornal científico The British Medical Journal (BMJ) no início de agosto.
Além disso, a pesquisa identificou que a substituição de qualquer tipo de batata por grãos integrais foi associada a um menor risco de diabetes tipo 2, mas trocar o tubérculo por arroz branco aumentou o risco da doença.
Consumo frequente de batata frita pode aumentar o risco de diabetes, aponta estudo Foto: Paulina/Adobe Stock
As descobertas são baseadas em três grandes estudos americanos conduzidos entre 1984 e 2021 – no total, 205 mil voluntários participaram das análises. Inicialmente, eles não tinham diabetes, mas, ao longo de 40 anos de acompanhamento, 22.299 pessoas receberam o diagnóstico da doença. A cada quatro anos, os participantes respondiam questionários alimentares detalhados.
No comunicado oficial à imprensa, os pesquisadores explicam que se trata de um estudo observacional, que só estabelece certas relações, de modo que não é possível tirar conclusões definitivas sobre causa e efeito; ou seja, não dá para cravar que o consumo de batatas fritas levará ao desenvolvimento de diabetes.
Paulo Roberto Cavalcante de Vasconcelos, professor doutor de Nutrologia do Departamento de Cirurgia da Universidade Federal do Ceará (UFC), explica que os estudos observacionais têm limitações quando o assunto é nutrição, como medição imprecisa de dietas e ruído nos dados – já que os pesquisadores dependem do relato dos voluntários –, o que pode superestimar ou subestimar riscos.
De qualquer forma, a análise científica aponta que o problema não é a batata em si, mas o modo de preparo. “É como se a fritura ‘transformasse’ a batata em algo mais problemático”, diz.
A batata frita
Segundo a nutricionista Luciana Trindade, docente do Centro Universitário São Camilo, a batata frita está associada ao diabetes tipo 2 por conta de seu alto índice glicêmico e por ter elevado teor de gordura. Significa, em primeiro lugar, que a glicose fornecida pelo alimento cai na circulação rápido demais, aumentando os níveis de açúcar no sangue. E como a gordura leva mais tempo para ser digerida, essa situação pode se prolongar, levando a uma hiperglicemia tardia, segundo a especialista. Para completar, o excesso de gordura também se transforma em glicose, atrapalhando o controle glicêmico.
A composição da batata frita ainda contribui para o aumento da gordura corporal, uma situação que, de acordo com Luciana, pode resultar em maior resistência à insulina – o hormônio responsável por tirar o açúcar de circulação e colocar dentro das células para gerar energia. Com isso, a glicemia sobe.
Mas a observação dos pesquisadores acende um alerta vermelho também para outras frituras, uma vez que o mecanismo é similar. “Óleos quentes formam compostos tóxicos que promovem inflamação e resistência à insulina. Alimentos como frango frito, pastel ou coxinha, comuns no Brasil, podem elevar o risco de diabetes em até 35%, como mostra uma pesquisa de 2024 sobre métodos de cozimento”, destaca Vasconcelos.
Vale destacar que o consumo excessivo desse tipo de alimento, rico em gorduras consideradas prejudiciais, também é associado a um maior risco de doenças cardiovasculares.
Precisa excluir do cardápio?
Luciana pontua que a batata é fonte de magnésio, vitamina C e fibras, e que pode fazer parte de um plano alimentar personalizado e balanceado em carboidratos. “É necessário um equilíbrio. Não há necessidade de restringir completamente o consumo, mas sim controlar o tamanho da porção, o tipo de preparação, dando preferência para a cozida e assada. Se for batata frita, (a recomendação é) reduzir para uma vez por semana”, orienta.
Mesmo ao optar pela batata cozida ou assada, há truques para controlar a velocidade de absorção dos carboidratos. A sugestão de Luciana é combinar o tubérculo a alimentos ricos em fibras, substâncias que tornam a digestão mais lenta e fazem o açúcar ser liberado na circulação de forma mais vagarosa.
As fibras podem ser encontradas em itens como feijão, folhas, legumes, maçã, frutas cítricas com bagaço e aveia, para citar alguns exemplos.
Não existe alimento vilão
A nutricionista Anita Sachs, docente da Escola Paulista de Medicina (Unifesp), faz questão de frisar que nenhum alimento por si só é vilão. “Tudo em excesso faz mal e tudo que é radical não é saudável”, resume.
Segundo ela, qualquer alimento com alto valor calórico, rico em gordura e com pequena quantidade de nutrientes importantes para o organismo deve ser consumido com bastante moderação – não só a batata frita.
Anita ainda pontua que “a composição da alimentação (como um todo) é fundamental para garantir a saúde.” Nesse sentido, não adianta evitar a batata frita em uma situação isolada e fazer do refrigerante um componente diário da dieta, por exemplo. Vale lembrar que o excesso de calorias está vinculado ao surgimento de diabetes – e de vários outros problemas.
Fritadeiras elétricas
Voltando às frituras: uma alternativa mais saudável às preparações com óleo seriam as fritadeiras do tipo air fryer. “As calorias e gorduras trans são reduzidas em até 75%, mas não é perfeito. Um estudo de 2024 mostrou que esses equipamentos podem formar mais acrilamida em batatas do que frituras tradicionais, dependendo da temperatura e do pré-tratamento”, pontua Vasconcelos.
Ainda não há um consenso fechado sobre o efeito da acrilamida para a saúde humana, mas estudos em animais apontam que ela pode ser um composto cancerígeno – portanto, o ideal é maneirar no consumo.
De acordo com Anita, esses equipamentos podem ser uma opção desde que não se utilize batatas congeladas. É que elas já passam por uma fritura anterior e, com isso, apresentam grandes quantidades de gordura. O ideal é utilizar o alimento fresco – aí vale colocar temperos como páprica, tomilho e alecrim, incrementando o sabor.
O ideal, segundo Anita, é que um prato com batata frita não tenha outros tipos de fontes de carboidratos, como arroz, batata doce, mandioca ou abóbora. Em uma refeição com a batata, devem ser priorizadas verduras cruas e cozidas ou refogadas, hortaliças e um tipo de carne.