Pelas 14h, os habitantes de Vale Frechoso já intuíam que o último 19 de agosto não seria mais uma terça-feira banal — o que, de resto, também não podia ser dito dos últimos dias na aldeia do concelho de Vila Flor, em Bragança. Ao contrário do habitual, via-se um incêndio no horizonte, vindo de Mirandela, que se foi agigantando com o vento e, em vez do cheiro a fumo, as labaredas tornaram-se a principal preocupação.

Quase cercadas pelas chamas, às pessoas restava uma de duas soluções: ou evacuar ou confinar. A experiência da equipa ao comando das operações optou pela segunda hipótese. O local, como definido no plano da Aldeia Segura, seria na Igreja Paroquial. Lá, pelo menos 100 pessoas encontraram refúgio e abrigo para, com esperança, aguardar a passagem, com o mínimo de destruição possível, do incêndio.

Os minutos de espera tornaram-se em horas e houve pessoas a ficar no espaço, pelo menos, até à meia-noite. Outros, como Silvana Martins, saíram mais cedo. “Quando eu passei [pelas chamas], a minha perceção é que aquilo ia afetar a aldeia e chegar às casas”, conta ao Observador a grávida que regressou a casa vinda do trabalho sem a certeza se iria conseguir entrar na aldeia.

“Aos poucos as pessoas foram indo para casa, entre a noite e a madrugada”, relata José Santos Ferreira, presidente da junta de freguesia, que enaltece a colaboração da Câmara Municipal de Vila Flor e o trabalho da GNR numa noite que teve mais fatores adversos. “A aldeia esteve duas ou três horas sem luz. Quando chamámos as pessoas já não tínhamos luz”.

“É fundamental o trabalho da GNR junto da comunidade, de falar com as pessoas. Não se consegue confinar sem diálogo. Se não dialogarmos, não conseguimos garantir o sucesso da operação”, explica ao Observador o Major Hernâni Martins, Oficial de Comunicação e Relações Públicas de Bragança da GNR e voz de comando da operação dos militares no apoio à população.

O fogo que começou no domingo em Mirandela tinha-se mantido afastado da pequena aldeia, mas o vento intenso que se sentiu na passada terça-feira deixou moradores e autoridades em estado de alerta. “Tínhamos o incêndio a progredir apoiado pelo vento com alguma intensidade”, conta o Major. As chamas subiram descontroladas e, ao estarem mais perto das casas, a GNR entrou em ação.

“Percebemos que era previsível que fosse afetar a aldeia. Quer chegasse em meia hora ou em 15 minutos”, continua o militar. Assim, em articulação com as demais autoridades, começaram a alertar a população para a necessidade de reunir num ponto seguro.

“Tocámos os sinos e andamos a avisar as pessoas com a GNR. Estava muito vento, as chamas começaram a agravar-se e daí a necessidade de alertar as pessoas, pelo menos uma parte da aldeia, mais afetada pelas chamas”, explica o presidente da junta.

Se frisa que não houve necessidade de confinar a totalidade da aldeia, enfatiza, por outro lado, a dificuldade em conseguir chamar todas as pessoas e de alertar para o perigo iminente numa altura em que, recorde–se, ainda não havia luz, além de se registarem falhas ocasionais na rede móvel. Todavia, frisa que esteve na igreja “a aldeia quase toda”.