Depois de 30 anos de tentativas frustradas, múltiplas internações e mais de 20 tratamentos sem sucesso, um homem de 44 anos que sofria de depressão resistente experimentou um renascimento emocional. Pesquisadores desenvolveram uma nova técnica de estimulação cerebral profunda e conseguiram aliviar sintomas severos, levando o paciente à remissão total, que já dura dois anos.
O caso que pode mudar a psiquiatria
O paciente procurou os pesquisadores enquanto eles recrutavam voluntários para um novo ensaio clínico. Ele havia sido diagnosticado com depressão aos 13 anos, passou por diversas internações e enfrentou três tentativas de suicídio.
Mesmo com tratamentos tradicionais — como medicações, psicoterapia intensiva e eletroconvulsoterapia (ECT) —, os resultados foram limitados. Após três rodadas de ECT, apenas a primeira trouxe melhora parcial; as seguintes foram ineficazes.
Segundo os cientistas, o desafio é que o mapeamento cerebral tradicional segue um padrão “tamanho único”, sem considerar as diferenças individuais:
“Estimular as mesmas áreas para todos não funciona, porque cada cérebro é único”, explica Damien Fair, coautor do estudo.
Uma abordagem personalizada: como funciona o PACE
Para resolver esse problema, a equipe criou um método chamado PACE (Precision Adaptive Cognitive Enhancement), que personaliza a estimulação elétrica para cada paciente. O procedimento envolve quatro etapas:
- Mapeamento cerebral individualizado
Os cientistas usaram ressonância magnética funcional (fMRI) para identificar redes cerebrais associadas à depressão. Descobriram que a rede de saliência do paciente era quatro vezes maior que a média, o que poderia explicar parte dos sintomas. - Implantação de eletrodos
Foram implantados quatro conjuntos de eletrodos diretamente sobre áreas críticas do cérebro ligadas a humor, planejamento e processamento de estímulos. - Estimulação direcionada
Cada rede foi estimulada individualmente. Ao atingir a rede do modo padrão (DMN) — ligada a pensamentos internos —, o paciente começou a chorar de alegria.
“Ele disse: ‘Não estou triste. Estou feliz. Não sei o que fazer com essas emoções’”, relata o psiquiatra Ziad Nahas, autor principal do estudo. - Ajuste contínuo e feedback
Por seis meses, o paciente recebeu estimulações diárias, com sessões de 1 minuto a cada 5 minutos. A equipe ajustava os parâmetros mensalmente com base no feedback do paciente.
Resultados surpreendentes
Os efeitos foram graduais, mas consistentes:
- 7 semanas após a cirurgia → os pensamentos suicidas desapareceram;
- 6 meses → melhora significativa nos sintomas;
- 9 meses → remissão completa;
- 2 anos depois → a melhora persiste.
Segundo Nahas, o diferencial do PACE é combinar estimulação de múltiplas redes cerebrais com ajustes individualizados:
“Na psiquiatria, não temos ‘curas’. Mas isso é o mais próximo que já chegamos.”
Próximos passos da pesquisa
O estudo, disponível no PsyArXiv (ainda sem revisão por pares), já implantou um segundo paciente e se prepara para um terceiro caso. O objetivo é avançar para um ensaio clínico duplo-cego com mais participantes, avaliando a eficácia e segurança do método em larga escala.
O primeiro paciente, hoje, relata que voltou a viver plenamente. Recentemente, enviou um e-mail aos pesquisadores durante uma viagem de carro com a família:
“Estou aproveitando cada momento.”