Comecei a assistir a “Indomável” por sugestão de leitores que me escreveram elogiando a aventura. Ao fim dos primeiros episódios, até considerei desistir, mas não consegui. Ao contrário, acabei maratonando em dois dias. A minissérie em seis capítulos está na Netflix e eu não fui a única a ser fisgada: ela lidera a lista do “Flixpatrol” das produções mais vistas da plataforma no mundo. A trama se apoia em fórmulas conhecidas — algumas delas até surradas. É um suspense como milhões de outros que povoam o streaming. Ao mesmo tempo, tem frescor e originalidade.
“Indomável” faz pensar que as séries americanas são mestres em montar aquilo que os franceses chamam de ambiance. A história se desenrola no Parque de Yosemite, na Califórnia (mas foi gravada em Vancouver, no Canadá). Ela conta com um grande personagem incorpóreo, mas de fortíssima presença, ainda que não humana: o próprio parque.
A geografia de puro encantamento que vemos na tela é realista apenas o suficiente para dar credibilidade à ação. A uma certa altura da trama, alguém comenta que os turistas “só conhecem dez por cento do território do Yosemite”. No mais, é um ecossistema selvagem. Em seus recantos inexplorados, vivem invasores ilegais e alguns indígenas. Não são figuras decorativas. O primeiro grupo é perigoso. Já a cosmogonia dos povos originários tem importância na narrativa.
Naya Vasquez (Lily) com os invasores — Foto: netflix
Na primeira cena, dois montanhistas escalam o El Capitan. O paredão rochoso emblemático do parque já faz o espectador prender a respiração. Mas a tensão se aprofunda quando eles são atingidos pelo corpo de uma moça que despenca. É esse acontecimento que faz a história disparar.
O agente da Divisão de Serviços de Investigação (ISB) Kyle Turner (Eric Bana) comanda a investigação que se segue. A cargo de alguém menos talentoso que Bana, o personagem cairia na caricatura. Ele é uma figura típica das séries policiais: capaz de desvendar crimes com uma intuição de profeta. Além disso, é um poço de extravagâncias. Para começar, se desloca a cavalo quase o tempo todo. Vive sozinho numa cabana, é ranzinza, atormentado, sofre com um trauma que vai sendo revelado aos poucos, evita o contato humano e tem problemas com o álcool. Nunca desempacotou a própria mudança e sua sala é ocupada por um amontoado de caixas. O ator, carismático e contido, evita as armadilhas. Ele, aliás, já foi visto num personagem ambíguo em “Dirty John”, em que fez uma dupla afiada com Connie Britton (a série está na Netflix e tem crítica aqui).
Eric Bana/Indomável — Foto: netflix
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“Indomável” tem viradas e se abre em inúmeras subtramas. O roteiro não evita os clichês e abusa das analogias entre os mistérios criminais e a vida selvagem no Yosemite. Isso irrita, mas não chega a ser um crime. O espectador é carregado para aquele universo e seduzido por suas paisagens idílicas. O ritmo ganha força a cada episódio e vale a pena chegar até o fim. É puro entretenimento.