A informação de que Joe Schwarcz é mágico amador, no posfácio de “O Surpreendente Mundo da Ciência” (Editora Contexto), não está ali para fazer graça. Desde os nove anos de idade, quando assistiu a um show de ilusionismo em que, em vez de um trivial abracadabra, o profissional usou uma “substância química mágica”, o destino de Schwarcz estava selado. Virou doutor em química, e segue fazendo truques fantásticos nas horas vagas.
Seu livro mais recente acaba de ser lançado no Brasil, resultado de uma colaboração entre o Instituto Questão de Ciência e a Editora Contexto. O título promete um compilado sobre “superalimentos e outros casos curiosos”, e Schwarcz entrega 75 capítulos curtos, mas recheados de dados científicos. Fala sobre os mais variados temas, de aparentemente inócuos cocôs de bicho-da-seda à seriedade da astronomia que pode levar humanos a Marte.
(Abordando os animaizinhos, aliás, Schwarcz relembra um dos primeiros brinquedos científicos que ganhou na infância: a Fábrica de Seda, numa embalagem com ovos de bicho-da-seda e instruções sobre como chocá-los para que se tornassem insetos de fato e pudessem, então, fiar casulos.)
“O Surpreendente Mundo da Ciência” é prato cheio para os fãs da magia do dia a dia, e defende que a curiosidade é a “pedra angular da ciência”, especialmente quando se trata de descobrir como as coisas funcionam e como podem funcionar melhor. Schwarcz, que é, além de mágico, diretor do Centro de Ciência e Sociedade da Universidade McGill, em Montreal, no Canadá, de fato investiga a fundo tudo sobre o que escreve. Uma questão que vez ou outra se impõe é a linguagem escolhida para expor sua investigação.
Sua paixão pela ciência é genuína, e dá a base sólida dos textos. Mas, quando ela sai de controle e Schwarcz, digamos, se empolga, o risco é perder a abrangência do alcance da nova obra –como se, ao pesar a mão no mundo técnico, o texto migrasse do que pode ser um adorável “Ciência for Dummies” para algo mais nichado.
Já na abertura, “Respiração e Combustão” traz uma impressionante linha do tempo feita com estudiosos e descobertas sobre o gasto de energia, mas não é a melhor escolha para demonstrar a destreza no mundo da literatura pop de que Schwarcz é capaz.
“Abelhas e Bananas”, por sua vez, faz um ótimo contrapeso: aponta o mecanismo de defesa das abelhas em ataques e o que ele tem a ver com o odor das bananas. “Devemos parabenizar esses pesquisadores. Suspeita-se que uma boa dose de destreza manual é necessária para realizar a dissecação anatômica do cérebro de uma abelha”, escreve.
Ainda no campo comida, o capítulo sobre a margarina se destaca. Começa em uma busca por truques químicos usados para fazer peculiaridades como “guacamole sem abacate”, e acaba contando a história de como esse alimento foi criado –spoiler: o segredo está em edamames triturados.
Também é boa a narrativa sobre os superalimentos que dão título à obra. Nela, Schwarcz aborda as inúmeras “ondas” na história da alimentação, desde a antiguidade até o iogurte em tempos mais recentes. Bananas (elas de novo) chegaram a ser consideradas superalimentos para quem sofria com doença celíaca, conta. Eram incluídas em uma dieta junto de leite, sopa, gelatina e carne, e viraram heroínas sem que se soubesse que a chave do sucesso estava não nelas, mas na exclusão do glúten. “‘Superalimento’ é um termo da propaganda, não da ciência”, afirma o escritor.
Um dos pontos mais divertidos é “Atletas em Conserva”, sobre a aplicabilidade do “suco de picles” na prevenção de cãibras em atletas. A explicação técnica é curiosa e acessível, e a contextualização redonda faz o texto fluir, tropeçando apenas em detalhes da tradução, esporádicos ao longo da obra. É o caso do engessado “concernentes”, no lugar de um corriqueiro “referentes” ou sinônimo.
“O Surpreendente Mundo da Ciência” ganha contornos de um animado livro de true crime em “Acônito Assassino”, e dali mantém um bom ritmo na sequência, com “As Armadilhas da Proposição 65”. Ao abordar a popularidade do nylon, Schwarcz também se sobressai. Ele relembra o primeiro lote de meias da história, que se esgotou em um único dia de vendas, e a época da Segunda Guerra Mundial, quando mulheres tiveram de abrir mão do nylon que guardavam nas gavetas para que o material virasse lotes de paraquedas para soldados.