Um oncologista identificou uma possível ligação entre corridas de longa distância e câncer de cólon em adultos jovens saudáveis. A pesquisa, realizada com 100 corredores de maratona e ultramaratona entre 35 e 50 anos, revelou que 15% dos participantes apresentavam adenomas avançados, lesões que podem evoluir para câncer colorretal.

O estudo foi conduzido na Inova Schar Cancer em Fairfax, Virgínia, após Dr. Timothy Cannon atender três pacientes jovens e extremamente ativos com câncer de cólon avançado. Entre os casos que o motivaram, dois participavam regularmente de ultramaratonas de 160 km e um terceiro havia completado 13 meias-maratonas em apenas um ano.

“Há um sinal aqui”, alertou Cannon durante apresentação na Sociedade Americana de Oncologia Clínica. “Não esperaríamos essas taxas de adenomas de alto risco em uma faixa etária como essa.”

As colonoscopias realizadas nos participantes mostraram que quase metade apresentava pólipos. A taxa de 15% de adenomas avançados encontrada entre os corredores é significativamente maior que os índices de 4,5% a 6% observados na população geral da mesma idade. Esse percentual supera até mesmo os 12% registrados entre nativos do Alasca, grupo historicamente mais vulnerável ao câncer colorretal.

A maratonista Laura Linville, de 47 anos, residente em Alexandria, Virgínia, nos Estados Unidos, participou como voluntária da pesquisa e descobriu sete pólipos durante sua colonoscopia, alguns tão grandes que necessitaram procedimentos adicionais para remoção. “Fiquei surpresa — você pensaria que correr é super saudável. Correr é normalmente associado a menor massa corporal, menos estresse e outros benefícios — você nunca ouve que possa ser ruim para você”, afirmou ao New York Times.

Alta em casos de câncer colorretal em jovens

Os achados surgem em um contexto de aumento de casos de câncer colorretal entre pessoas com menos de 50 anos. Esse fenômeno já motivou, em 2021, a redução da idade recomendada para a primeira colonoscopia de 50 para 45 anos para indivíduos de risco médio nos Estados Unidos.

O próprio Dr. Cannon, que participou da Maratona de Nova York em 2010, equilibra suas conclusões. “Não se deve dar desculpas para não se exercitar, porque a maior preocupação é a falta de atividade”, enfatizou. “Mas, depois de observar meus pacientes e os resultados do estudo, acredito que exercícios extremos podem aumentar o risco desse câncer”, completou ao New York Times.

O Dr. Eric Christenson, da Johns Hopkins, oferece uma orientação para os atletas. “Não digo para parar de correr, mas é essencial ouvir o corpo”, ressaltou. “Se houver sintomas, fale com um médico, mesmo sendo alguém considerado saudável.”

Entre os casos que motivaram o estudo estava Josh Wadlington, um geógrafo que participava regularmente de ultramaratonas, chegando a competir em duas ou três por mês. Ele completou o Savage Seven, um desafio de sete maratonas consecutivas em sete dias.

Apesar de apresentar sinais de alerta como fezes com sangue e alterações em exames de rotina, Wadlington atribuiu os sintomas aos efeitos de sua rotina de corridas. Ele foi diagnosticado com câncer de cólon em 2018, próximo dos 40 anos, e faleceu em 2021, aos 41 anos.

Os outros dois pacientes que inspiraram a pesquisa, incluindo uma triatleta, também não sobreviveram à doença. “Ele não bebia, não fumava, era vegano. Sempre foi saudável. Olhando para trás, percebemos quantas coisas deixamos passar. Mas você ignora sinais achando que está fazendo tudo certo”, compartilhou a viúva de Wadlington ao New York Times.

Limitações metodológicas

Especialistas consultados sobre a pesquisa observam que a maioria dos jovens diagnosticados com câncer de cólon não são maratonistas. O Dr. David Rubin, chefe de gastroenterologia da Universidade de Chicago, aponta limitações metodológicas importantes: “Faltou um grupo de controle de adultos jovens que não correm longas distâncias, e o histórico familiar de câncer entre os maratonistas não era totalmente conhecido”.

Um dos desafios para o diagnóstico precoce em atletas de resistência é que eles frequentemente ignoram sintomas como fezes com sangue, urgência intestinal e diarreia, confundindo-os com efeitos normais da corrida.

Uma possível explicação para o fenômeno seria a colite isquêmica, condição que ocorre quando o fluxo sanguíneo para o cólon é temporariamente reduzido durante exercícios intensos, sendo desviado para os músculos das pernas. Esse processo causa dano e inchaço nas células do cólon.

A hipótese é que a inflamação crônica resultante de exercícios extremos poderia induzir ciclos repetitivos de dano e reparo celular, criando um ambiente propício para mutações. No entanto, o Dr. Rubin observa que ainda não existem evidências conclusivas de que a colite isquêmica aumente efetivamente o risco de câncer colorretal.

Embora Linville não pretenda abandonar as maratonas, ela decidiu realizar exames regulares para monitorar possíveis sinais de câncer colorretal. O aumento de casos entre jovens tem intrigado a comunidade médica, com fatores como inatividade física e obesidade frequentemente apontados como possíveis causas.

O Dr. David Lieberman, professor emérito da Universidade de Saúde e Ciência do Oregon, reforça a necessidade de mais pesquisas sobre os limites do exercício físico e a importância da atenção aos sinais do corpo, mesmo entre indivíduos considerados extremamente saudáveis e ativos.