Lars Lokke Rasmussen, ministro dos Negócios Estrangeiros da Dinamarca, convocou nesta quarta-feira Mark Stroh, encarregado de negócios da embaixada dos Estados Unidos e o mais alto representante diplomático norte-americano no país, depois de a emissora pública DR ter noticiado que os serviços secretos dinamarqueses avisaram o Governo sobre operações de influência levadas a cabo por pessoas próximas da Administração Trump no território semi-autónomo da Gronelândia.
Argumentando que se trata de uma questão de “segurança nacional” para os EUA, Donald Trump já disse várias vezes que quer “controlar” a Gronelândia. Apesar de se tratar de um território de um aliado seu na NATO e de os EUA terem uma importante base militar e espacial em solo gronelandês, o Presidente norte-americano não exclui o uso da força militar para alcançar esse objectivo.
Tanto as autoridades nacionais como os dirigentes políticos gronelandeses rejeitam e condenam as ameaças de Trump e de outros membros da sua Administração, denunciando uma “interferência grosseira” na Gronelândia, uma vasta ilha no Atlântico Norte, com apenas 57 mil habitantes, que tem 80% do seu território permanentemente coberto por gelo, mas que é rica em recursos minerais e que tem uma posição geoestratégica privilegiada para o acesso ao Árctico, região que tem merecido a atenção e o investimento recente de potências como a Rússia ou a China.
Em declarações à imprensa dinamarquesa, sem se referir directamente aos EUA ou às notícias da DR, Rasmussen admitiu, ainda assim, que o Governo está “ciente de que actores estrangeiros continuam a demonstrar interesse pela Gronelândia e pela sua posição no reino da Dinamarca” e disse que “não é surpreendente que haja tentativas externas para influenciar” o território.
Citando fontes com conhecimento sobre o caso, a DR diz que os serviços secretos informaram o executivo liderado pela primeira-ministra Mette Frederiksen de que pelo menos três cidadãos norte-americanos, com ligações à Administração Trump, têm estado envolvidos em operações de influência na Gronelândia, recolhendo informações sobre o território, e promovendo e alimentando o debate sobre a sua independência e posterior adesão aos EUA.
O vice-presidente norte-americano, J.D. Vance, e o próprio filho de Trump, Donald Trump Jr., já estiveram este ano na Gronelândia, com outras pessoas próximas do Presidente, para operações de charme no território.
Em Maio, recorda o Financial Times, o Governo dinamarquês já tinha convocado Stroh para lhe exigir explicações, pouco depois de o Wall Street Journal ter noticiado que as agências dos serviços secretos norte-americanos tinham sido mandatadas para identificarem apoiantes das ambições territoriais da Casa Branca na Gronelândia e na Dinamarca.
O encarregado de negócios da embaixada é o principal diplomata dos EUA no país enquanto Ken Howery, empresário, co-fundador do PayPal e figura próxima de Elon Musk, que foi escolhido no final do ano passado por Donald Trump para embaixador na Dinamarca, não assume funções.
Objectivo: “Criar divisão”
Num comunicado publicado esta quarta-feira, o Serviço Nacional de Segurança e de Informação da Dinamarca dá conta de que o “a Gronelândia, especialmente na situação actual, é alvo de campanhas de influência de vários tipos”, que “têm como objectivo de criar uma divisão na relação” com as autoridades nacionais dinamarquesas.
“Isto pode ser feito explorando desacordos, existentes ou inventados, relacionados, por exemplo, com questões específicas que são conhecidas, ou promovendo e reforçando certas opiniões na Gronelândia sobre o reino da Dinamarca e os Estados Unidos, ou sobre outros países com interesse especial na Gronelândia”, diz o comunicado, citado pela Reuters.
Semi-autónoma desde 1979, depois de ter sido uma colónia da Dinamarca durante vários séculos, a Gronelândia não tem poder de decisão em assuntos relacionados com política externa e defesa, mas obteve, em 2009, o direito a decidir os passos seguintes tendo em vista a independência.
Em Março deste ano, após umas eleições legislativas muito marcadas pelas ameaças de Trump ao território, a Gronelândia elegeu um novo primeiro-ministro, Jens-Frederik Nielsen, líder do partido independentista Demokraatit, de centro-direita, que defende, no entanto, um caminho mais lento e ponderado rumo à secessão.
“O Presidente Trump diz que os EUA vão ter a Gronelândia. Deixem-me ser claro: os EUA não vão conseguir isso. Não pertencemos a ninguém. Somos nós que determinamos o nosso próprio futuro” afiançou Nielsen pouco depois de assumir o cargo.