O que estão compartilhando: vídeo publicado no Instagram lista alimentos que seriam capazes de “matar” o câncer. Uva roxa, tomate cozido, ovo, castanha-do-Pará, cúrcuma, frutas vermelhas e pimentão seriam capazes impedir a formação de tumores.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso. Alguns dos alimentos citados contêm substâncias antioxidantes e anti-inflamatórias, que podem ser benéficas para pacientes oncológicos. Apesar disso, especialistas consultados pela reportagem indicam que nenhum alimento, de forma isolada, impede o desenvolvimento de câncer. Eles explicam, na realidade, que uma soma de hábitos saudáveis é que reduz fatores de risco – manter uma alimentação saudável, praticar exercícios físicos e evitar o consumo de álcool e tabagismo, por exemplo.
Procurada pelo Verifica, a responsável pela postagem não respondeu.
Vídeo engana ao listar alimentos que ‘matam’ o câncer Foto: Reprodução/Instagram
Saiba mais: apesar de a alimentação saudável ser uma peça-chave para prevenção do câncer, alimentos isolados não são capazes de “matar” tumores, ao contrário do que divulga uma postagem viral. O conteúdo enganoso foi publicado no Instagram de uma usuária que se apresenta como criadora de conteúdo digital sobre saúde.
O oncologista Wesley Pereira Andrade, médico titular da Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM) e da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (Sbco), explica que o câncer é multifatorial. Isso significa que o desenvolvimento da doença envolve genética, ambiente e estilo de vida. Dessa forma, segundo o especialista, nenhum nutriente isolado é capaz de garantir proteção total contra o câncer.
“Não existem ‘superalimentos’ capazes de curar ou matar o câncer. O que a ciência mostra de forma consistente é que a prevenção da doença depende da soma de hábitos saudáveis”, afirmou.
De acordo com a médica Bruna Manes, pós-graduada em Endocrinologia e Nutrologia da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran), alguns dos alimentos listados na publicação contêm substâncias bioativas, como antioxidantes, vitaminas, minerais e compostos anti-inflamatórios.
Substâncias bioativas, segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), são moléculas orgânicas que apresentam efeitos diversos sobre organismos vivos, relacionadas a mudanças no comportamento, fisiologia ou metabolismo.
Bruna explica que elas podem ajudar a reduzir processos de oxidação e inflamação no organismo, que são fatores relacionados ao desenvolvimento de tumores. Segundo ela, as substâncias resveratrol (presente na uva roxa), antocianina (também na uva roxa) e ácido elágico (em frutas vermelhas) têm propriedades benéficas verificadas em laboratório. Mas o corpo humano é mais complexo, afirma a médica.
“Nenhuma substância isolada é capaz de prevenir, sozinha, o câncer ou outras doenças graves”, disse.
O oncologista Wesley Andrade cita que o resveratrol e a curcumina, presente na cúrcuma, apresentam propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias. Em estudos laboratoriais, segundo o médico, essas substâncias demonstraram inibir a proliferação de células tumorais. Ele ressalta, contudo, que o consumo desses alimentos não compensa hábitos de risco, como tabagismo, alcoolismo e sedentarismo.
A nutricionista Adriana Cavalcanti, que atua no Grupo Valsa Saúde, do Rio de Janeiro, explica que uma dieta saudável deve conter alimentos protetores e minimizar ultraprocessados. Veja abaixo a recomendação da especialista:
- Alimentação rica em frutas, legumes, cereais integrais, leguminosas (feijão, lentilha, grão-de-bico) e oleaginosas (castanhas, nozes, amêndoas);
- Evitar ultraprocessados (refrigerantes, biscoitos recheados, salgadinhos, embutidos), álcool, carnes processadas (salsicha, presunto, linguiça, bacon) e consumo excessivo de carnes vermelhas.
Os três especialistas indicam que a alimentação equilibrada também deve estar alinhada com outros hábitos saudáveis. Fatores importantes incluem a prática regular de atividade física e a manutenção do peso corporal, por exemplo.
“O que realmente importa é o conjunto da alimentação, associado ao estilo de vida. Ou seja, consumir frutas vermelhas eventualmente não terá efeito significativo se a pessoa tiver, por exemplo, excesso de ultraprocessados, tabagismo ou sedentarismo”, exemplificou Bruna.
As recomendações dos especialistas estão de acordo com as orientações do Instituto Nacional do Câncer (Inca). A entidade aponta para a importância do peso corporal dentro dos limites recomendados de índice de massa corporal (IMC) e a atividade física como parte da rotina diária. Além disso, orienta evitar o tabagismo, bebida alcoólica e carnes ultraprocessadas.
Como lidar com postagens do tipo: desconfie de postagens que indicam soluções simples para problemas complexos. Entidades confiáveis, como o Inca, indicam que o câncer não é uma doença de causa única. Formas de prevenção são variadas: manter alimentação saudável, praticar exercícios físicos e evitar a exposição aos fatores de risco de câncer. Alimentos isolados não garantem uma proteção total.