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Imagens do satélite europeu Copernicus mostram como a China converteu, ao longo da última década, o recife de Mischief, nas disputadas ilhas Spratly, numa poderosa base militar. A transformação é descrita como a criação de um “porta-aviões inafundável”, com infraestrutura que inclui pistas de aviação, sistemas de mísseis e radares de longo alcance.

O recife de Mischief, originalmente um atol que emergia apenas na maré baixa, começou a ser alvo de obras de recuperação por parte de Pequim nos anos 1990, tendo a fase principal ficado concluída em 2015. Desde então, a China investiu dez anos na militarização da estrutura, que se tornou o maior entreposto chinês no arquipélago. A área encontra-se a cerca de 150 milhas da província filipina de Palawan e a 600 milhas da ilha chinesa de Hainan, situando-se dentro da zona económica exclusiva (ZEE) das Filipinas, onde, segundo o direito marítimo internacional, apenas este país tem direito à exploração de recursos naturais.

A disputa insere-se no quadro mais amplo da reivindicação chinesa sobre mais de 80% do mar do Sul da China, uma rota estratégica por onde circulam anualmente cerca de cinco biliões de dólares em comércio. Além da China, também Vietname, Filipinas, Malásia, Taiwan e Brunei reclamam soberania, total ou parcial, sobre as Spratly. Pequim criou mais de 3.000 acres de novas terras em sete recifes da região, dotando alguns deles — como Mischief, Subi e Fiery Cross — de pistas de aviação de 3.000 metros, hangares para caças, helipistas, sistemas de mísseis antinavio e sofisticadas instalações de radar.

O compromisso assumido em 2015 pelo presidente chinês Xi Jinping, perante Barack Obama, de não militarizar estas ilhas artificiais não foi cumprido, segundo especialistas internacionais. Gregory Poling, diretor do programa do Sudeste Asiático no think tank CSIS, afirmou à ABC Australia que a China, graças aos sistemas de radar implantados, “consegue ver, ouvir e comunicar em todo o mar do Sul da China de uma forma que ninguém mais, incluindo os Estados Unidos, consegue”.

Manila tem contestado a presença chinesa. O ministro da Defesa filipino, Gilberto Teodoro, recordou durante a conferência de segurança Shangri-La Dialogue, em Singapura, que em 1995 Pequim “afirmava que as estruturas de bambu erguidas em Mischief eram abrigos temporários para pescadores”. Hoje, disse, o local está “altamente militarizado”, o que ilustra o “défice de confiança” entre os dois países. O governo do presidente Ferdinand Marcos Jr. tem intensificado a cooperação com os Estados Unidos e outros aliados regionais para responder à crescente pressão militar chinesa.

Pequim, por seu lado, acusa outros países de estarem a agravar as tensões. Numa conferência de imprensa, o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Guo Jiakun, declarou que “as ilhas Nansha [Spratly] são território inerente da China” e que Pequim “se opõe firmemente às atividades de construção levadas a cabo pelos países envolvidos em ilhas e recifes ocupados ilegalmente”, prometendo tomar “as medidas necessárias para salvaguardar a soberania territorial e os direitos marítimos da China”.

O Vietname, outro dos reclamantes, tem vindo desde 2023 a acelerar o seu próprio programa de recuperação de terras nas Spratly, já com uma área total equivalente a dois terços da expansão realizada por Pequim. Também este país construiu pistas, portos e, segundo analistas, instalações com potencial militar. Ainda assim, são os incidentes cada vez mais frequentes entre forças chinesas e filipinas, em zonas que fazem parte da ZEE de Manila, que permanecem como o principal foco de tensão no arquipélago.