As taxas Euribor subiram em todos os prazos entre julho e agosto. Uma inversão de tendência que se deverá manter face aos sinais de que o Banco Central Europeu poderá não descer mais as taxas de juro. Ainda assim, os encargos com o crédito à habitação ainda deverão descer durante os próximos meses para, depois, entrarem num período de estabilização. Confira o seu caso
O Banco Central Europeu (BCE) poderá não descer mais as suas taxas de juro de referência em 2025 ao contrário do que se esperava, uma alteração que está a ter impacto nas taxas Euribor que, em agosto, vão subir face a julho a 3, 6 e 12 meses, algo que já não acontecia há praticamente dois anos. Apesar desta subida, as prestações com o crédito à habitação ainda deverão continuar a diminuir durante mais alguns meses e, depois, entrar num período de estabilização.
Na última reunião do BCE, realizada em julho, a instituição liderada por Christine Lagarde, deixou a taxa de depósitos, a principal taxa de referência, inalterada em 2%. Uma decisão tomada com bases nos dados positivos da taxa de inflação. “O Conselho decidiu manter as três taxas de juro diretoras do BCE inalteradas (…)”, refere o BCE em comunicado, salientando que o crescimento dos preços já tinha atingido “o objetivo de médio prazo de 2%”. Posteriormente, os dados da inflação de julho viera confirmar a manutenção desta estabilidade, com a subida homóloga dos preços a manter-se em 2%, muito longe dos 10,6% registados em outubro de 2022.
Estes dados, mas também o acordo comercial entre os Estados Unidos da América e a União Europeia, e as perspetivas de que, apesar de um crescimento débil, a economia da Zona Euro deverá escapar a uma recessão, com um crescimento de 1,1% este ano, vieram alterar a expetativa que existia no mercado de que o BCE ainda iria descer as suas taxas de referência pelo menos mais uma vez em 2025.
Exemplo disso é a sondagem que a agência Reuters faz habitualmente junto de um alargado conjunto de economistas. No inquérito realizado em julho, quase 60% dos economistas previa que haveria outro corte nas taxas ainda este ano, provavelmente na próxima reunião de 11 de setembro. Agora, acredita-se que os membros do BCE vão esperar até dezembro para decidir, mas já não há uma maioria de opiniões de que esse corte irá mesmo acontecer.
Na sondagem realizada entre 11 e 14 de agosto, a maioria dos economistas, 46 de 72, disse que as taxas de juro se irão manter inalteradas em setembro e apenas 47%, 34 de 72, esperam que haja mais um corte, provavelmente em dezembro, enquanto 31 não preveem mais reduções das taxas de juro em 2025.
“O mercado interpreta que não haverá mais alterações às taxas de juro de referência, que o círculo de cortes já terá terminado”, aponta Filipe Garcia, economista da IMF – Informação de Mercados Financeiros. Também Pedro Oliveira, ‘trader’ da sala de mercados do Banco Carregosa, partilha esta justificação: “Na última reunião do BCE houve uma pausa nesses cortes, mas é preciso também ter em conta os dados macroeconómicos que a antecederam”.
O que vai acontecer daqui em diante é sempre uma incógnita. Ainda assim, é possível traçar cenários, partindo do princípio de que o contexto geopolítico – que tem sido marcado por reviravoltas – se mantém estável.
“A probabilidade é de 60% de as taxas de juro se manterem neste nível por um período indeterminado”, aponta Filipe Garcia. E junta: “Esta subida [das taxas Euribor] reflete o fim de expectativas em relação ao corte [do BCE], ou seja, a expectativa do mercado de que afinal não vai descer mais. Mas não reflete nenhuma expectativa de subida”.
“Podemos falar de um final de ciclo, que era de descida. Mas não há evidência para se falar no início de um ciclo de subida da taxa”, insiste Filipe Garcia.
Visão similar traz Pedro Oliveira: “A tendência para o final deste ano, e ainda para o próximo ano, será a de a Euribor continuar a recuar, embora mais ligeiramente”.
O que acontece à prestação da casa?
E agora, a resposta à pergunta que o trouxe a este artigo. Deve preocupar-se com subidas do seu crédito à habitação? Provavelmente, não.
Para já, quem tiver os seus contratos a serem revistos nos próximos meses, ainda deverá sentir um alívio na prestação a apagar ao banco. Isto acontece porque a comparação a fazer não é com a evolução mensal das Euribor, mas com o valor das taxas de juro em vigor na data da última revisão do contrato. Por exemplo, quem tiver um contrato indexado à Euribor 6 meses (o mais utilizado em Portugal) e a revisão do contrato aconteça no próximo mês, as taxas Euribor a levar em conta são a média mensal de agosto (que como já referido subiu em relação a julho) e a taxa que serviu de base à última revisão do contrato, a taxa média de fevereiro. E nesta comparação, entre a Euribor 6 meses de fevereiro e de agosto, ainda há uma descida de 2,46% para 2,085%, resultando daí uma diminuição da prestação a pagar ao banco.
Ainda assim, se esta subida das taxas Euribor se mantiver nos próximos meses, a diminuição das prestações que se faz sentir sensivelmente desde o início de 2024, irá acabar. Por exemplo, se a Euribor 6 meses nos próximos meses se mantivesse a subir ao mesmo ritmo que subiu entre julho e agosto, quem tivesse o seu contrato a ser revisto em dezembro já poderia sentir uma ligeira subida da prestação a pagar ao banco. Mas este é apenas um exemplo teórico, uma vez que não é expetável que as taxas subam significativamente, mas sim que estabilizem.
“O impacto é negligenciável, tendo em conta aquilo que já aconteceu, quer para cima, quer para baixo, nos últimos anos”, refere Filipe Garcia, lembrando o impacto sentido pelas famílias aquando da crise inflacionista.
É certo que cada contrato tem as suas peculiaridades, mas será difícil que estas variações acabem por deixar o orçamento familiar em sufoco. “O presente diz-nos que quem está a reindexar a taxa ainda vai ter descidas na prestação, tendo em conta os últimos meses. O que não está a baixar é de julho em diante”, junta Filipe Garcia.
Pedro Oliveira também considera que esse impacto, a acontecer, “não será significativo”. “Poderia estar a impactar na Euribor a três meses, que reage mais rapidamente. Para seis e 12 meses será muito neutral”, diz.
Com este cenário de estabilidade no horizonte é, no entanto, importante recordar que é uma estabilidade que tem um preço. Mesmo apesar das descidas das prestações ocorridas ao longo dos últimos meses, o valor a pagar ao banco está muito longe dos valores praticados há três anos, quando as taxas Euribor tinham valores negativos. No caso dos contratos indexados à Euribor 6 meses, por exemplo, a prestação ainda se encontra cerca de 20% acima do valor praticado em 2022.
Confira o seu caso
Para já, a única certeza é de que quem tiver o seu contrato a ser revisto em setembro irá continuar a sentir uma diminuição da prestação a pagar ao banco.
Pegando no exemplo de um contrato de 200 mil euros, a 30 anos, indexado à Euribor 6 meses, com um spread (margem do banco) de 1%, a descida da prestação irá atingir quase 40 euros. Para o mesmo exemplo, mas indexado à Euribor 12 meses, a queda ainda será maior, devendo chegar a quase 110 euros, uma vez que a comparação é feita com a Euribor em vigor na última revisão do contrato, em agosto do ano passado.
Confira o seu caso:
Quanto já aumentou e como vai evoluir em setembro a prestação da casa
Empréstimo a 30 anos com spread de 1% || Dados de agosto até dia 28
EURIBOR 3 MESES
EURIBOR 6 MESES
EURIBOR 12 MESES
NOTA 1 | Como foram feitos os cálculos
Os cálculos partem do princípio de que há três anos o capital em dívida era de 50, 100, 150 ou 200 mil euros, consoante o exemplo, e que o prazo de pagamento era de 30 anos, com um spread de 1%. A partir desse ponto, a cada revisão do contrato, aplica-se a taxa de juro correspondente e diminui o montante em dívida e o prazo de pagamento do crédito.
NOTA 2 | O que são as taxas Euribor
Euribor é a abreviatura de Euro Interbank Offered Rate. As taxas Euribor baseiam-se nas taxas de juro que um conjunto de bancos europeus está disposto a pagar para emprestar dinheiro uns aos outros. No cálculo, os 15% mais altos e mais baixos de todas as cotações recolhidas são eliminados. As restantes taxas são calculadas como média e arredondadas a três casas decimais. O valor das taxas Euribor é determinado e publicado diariamente. Existem cinco taxas Euribor diferentes, todas com diferentes maturidades (uma semana, um mês, três meses, seis meses e 12 meses).