Para explicar as ligações entre o Grupo Lena e Angola, Sócrates dissera que “dois dirigentes da empresa Lena, em 2009, estiveram num jantar comício em Leiria”, que o apoiaram pessoalmente.

“Nesse seguimento, tendo sido referido que eles tinham uma obra em Angola, em que não lhes pagavam, e que já tinha sido executada, queriam que alguém intercedesse junto do Governo angolano de forma a que pudessem ser recebidos. Telefonei a Manuel Vicente” − vice-presidente de Angola entre 2012 e 2017 −, explicou o arguido.

Com o argumento de que as respostas de José Sócrates foram “imprecisas” sobre esta matéria, Rómulo Mateus insistiu para que a gravação da conversa fosse ouvida na audiência, o que aconteceu.

José Sócrates começa por devolver uma chamada que lhe tinha sido feita, que foi parar ao gabinete de Manuel Vicente.

Sócrates pede ao ex-vice-presidente angolano que receba “umas pessoas” que, explicou, gostaria “de lhe recomendar”.

“Umas pessoas que são minhas amigas, a quem devo muitas atenções”, detalhou.

Manuel Vicente acabou por sugerir que essa conversa acontecesse em outubro de 2013, mas, depois de uma referência à participação do antigo governate angolano na Assembleia das Nações Unidas, que aconteceria pouco tempo depois em Nova Iorque, Sócrates propôs que se encontrassem lá.

“Quero agradecer do fundo do coração a sua amabilidade”, rematou José Sócrates.

Depois, questionado por Rómulo MAtues sobre há quanto tempo é que devia “atenções”, José Sócrates disse ser “muito claro” que devia atenções a quem o “apoiou na campanha eleitoral”.

O antigo governante criticou o procurador por “esta ideia de ver maldade na expressão” de “sincera cordialidade nas relações nas pessoas”, e ainda acrescentou que é uma “mentalidade” que pensava não existir “na nossa sociedade”.

Interrogado pela juíza sobre se esta intermediação visava o reconhecimento do Grupo Lena, Sócrates garantiu apenas que nunca recebeu dinheiro e nunca se dedicou ao lobbying.

“Fico espantado quando alguém faz acusações”, concluiu.

Rómulo Mateus ainda questionou José Sócrates sobre se naquela altura, em 2013, havia dificuldade de exportar divisas a partir de Angola.

Garantindo que fazia ideia, o arguido disse apenas que “a empresa Lena queria falar ao Governo numa situação em que se achava devedora”.

Rómulo Mateus ainda apontou alguma “pressa” no encontro entre Sócrates e Manuel Vicente, por ter sugerido como palco desse momento Nova Iorque, mas o arguido só argumentou: “Essa pressa só existe no espírito do senhor procurador.”