O responsável pela UNRWA não arrisca desenhar já o futuro para Gaza. No entanto, entende que a questão fundamental é “se Gaza continuará a ser uma terra para os palestinianos no futuro”.


Por isso, apela a que todos se esforcem para garantir que Gaza continue a ser dos palestinianos porque este cenário é “o único em consonância com o desfecho aceite pela comunidade internacional: a solução de dois Estados”.

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Nesta entrevista ao jornal El País durante o curso de verão Quo Vadis Europa XIII, organizado pela Universidade Internacional Menéndez Pelayo, em Santander, Philippe Lazzarini volta a dizer que a fome em Gaza não é o resultado de vários fatores, é apenas “provocada pelo homem”. “Há meses que alertamos para os sinais de fome e soamos o alarme, mas os nossos avisos caíram em saco roto”.

“Vimos isso nos nossos centros de saúde, onde o número de crianças com desnutrição aguda [na capital] aumentou seis vezes nos últimos [seis] meses”, sublinha Lazzarini.
A Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinianos teme agora que a fome se espalhe por toda a Faixa de Gaza e “não atinja apenas a cidade de Gaza e a província”.


É absolutamente obsceno que mais de 1500 pessoas também morreram enquanto procuravam desesperadamente ajuda alimentar em centros de distribuição instalados perto das posições das Forças de Defesa de Israel, geridos pela infame Fundação Humanitária de Gaza [GHF, operada por soldados israelitas e seguranças privados dos EUA].”

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“O nível de inação da comunidade internacional também é chocante. (…) Enquanto isso, a Cisjordânia está a passar por níveis sem precedentes de violência e deslocamento forçado de pessoas, o que certamente estaria nas manchetes de hoje se não tivesse sido ofuscado pelo desastre em Gaza”, denuncia Philippe Lazzarini ao El Pais.

O impacto na UNRWA das campanhas de desinformação de Israel “foi tal que, 48 horas após a acusação, 16 países anunciaram um congelamento temporário das suas contribuições”, lembra o responsável da agência.

Isto depois de Israel ter afirmado que elementos do Hamas se tinham infiltrado na UNRWA em janeiro de 2024. Ficou claro que “o desmantelamento da agência” era “um objetivo de guerra”.



“Os políticos israelitas veem uma oportunidade única para desmantelar uma organização que, aos seus olhos, representa o direito de regresso dos refugiados palestinianos. (…) Assim, desmantelar a agência e retirar aos palestinianos o seu estatuto de refugiados é também uma forma de minar o direito à autodeterminação. E, portanto, uma forma de minar a solução de dois Estados, de modificar os parâmetros de qualquer futura resolução política para o conflito”, explica Plhilippe Lazzarini.

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Apesar do corte de doações para a UNRWA, houve países “que aumentaram as suas contribuições, como Espanha, Luxemburgo e Portugal, entre outros”. No entanto, “não compensou o corte nas doações.”

Quanto ao impacto no futuro das ações de Israel, Estado-membro da ONU, o diretor-geral da Agência da ONU assegura: “Gaza está a tornar-se o cemitério do direito humanitário internacional humanitário. Tudo foi descaradamente ignorado…”.

“A impunidade prevalece e há uma sensação crescente na região de que o direito internacional humanitário não é universal. (…) Tornámos as Convenções de Genebra quase irrelevantes. O que está a acontecer e a ser aceite hoje em Gaza não é algo que possa ser isolado; tornar-se-á a nova norma para todos os conflitos futuros”, conclui Lazzarini.