A degradação dos solos, a poluição do ar e o stress hídrico representam uma ameaça económica global directa, mas uma utilização mais eficiente dos recursos naturais poderia reduzir a poluição para metade, revela um relatório do Banco Mundial, que contraria a ideia de que o crescimento económico acaba por resultar em melhorias ambientais, à medida que os níveis de rendimento dos países aumentam.
O relatório Reiniciar o desenvolvimento: a economia de um planeta habitável, publicado pelo Banco Mundial no final de Agosto, descreve que “a pegada da humanidade cresceu de tal forma” que, actualmente, 92% da população mundial enfrenta pelo menos uma das três formas de poluição, estando exposta à poluição atmosférica, a riscos acrescidos para a água ou a solos degradados.
Mas a análise demonstra que os problemas ambientais ocorrem muitas vezes em simultâneo: cerca de 78% da população está exposta a pelo menos duas destas pressões ambientais e 20% — uma em cada cinco pessoas no planeta — está exposta às três.
Isto aumenta não apenas os riscos enfrentados pelas populações, mas também os desafios no desenho de políticas eficazes. “A abordagem isolada de um factor de stress ambiental pode ter benefícios limitados se persistirem outros riscos sobrepostos”, lê-se no documento.
Solos e florestas
Os danos resultantes da poluição são particularmente graves nos países com baixos rendimentos, mais ameaçados pela pobreza, pelas alterações climáticas e pela perda de biodiversidade, onde cerca de 80% das pessoas estão expostas aos três tipos de poluição, afirmou Axel van Trotsenburg, um dos directores-gerais do Banco Mundial, à agência Reuters.
No Sul da Ásia, por exemplo, 92% da população está exposta à poluição do ar e aos riscos da água, estando os restantes 8% expostos aos três factores de stress. Do mesmo modo, na África Subsariana, 30% da população está exposta à poluição do ar e aos riscos da água, e 66% está exposta aos três factores de stress.
Entre os países mais afectados encontra-se o Burundi, onde oito milhões de pessoas enfrentam riscos de poluição da água e do ar e sete milhões enfrentam a degradação dos solos. No Malawi, 12 milhões de pessoas enfrentam os três riscos em simultâneo, elenca o relatório.
O Banco Mundial calcula ainda que as florestas contribuem para a formação de cerca de metade das nuvens de chuva do mundo. Assim, conclui o relatório, a desflorestação reduz a precipitação a um custo de 14 mil milhões de dólares por ano, só na região de nove países na Amazónia Internacional, o que representa um impacto significativo para os países afectados.
Isto também significa que as paisagens são menos capazes de armazenar e libertar humidade lentamente ao longo do tempo, o que amplifica os efeitos das secas e resulta num prejuízo de 379 mil milhões de dólares, ou seja, 8% da produção económica agrícola mundial.
O relatório aborda ainda o “paradoxo do azoto” — os fertilizantes aumentam os rendimentos, mas a sua utilização excessiva em algumas regiões prejudica as culturas e os ecossistemas.
Já passou a era do “limpar depois”
O relatório do Banco Mundial demonstra que as ameaças ecológicas causadas pela “incapacidade de manter um planeta habitável”, frequentemente vistas como distantes, passaram a ter impactos económicos reais, que estão a ocorrer agora.
Ao longo de várias gerações, os recursos naturais “impulsionaram o desenvolvimento, apoiando a saúde, a alimentação, a energia e as oportunidades económicas”, mas num planeta de recursos finitos os limites estão a tornar-se cada vez mais visíveis, pondo em risco o próprio progresso que ajudaram a criar, lê-se no documento.
Desligar a degradação ambiental do crescimento económico é um dos grandes desafios globais contemporâneos, visível em esforços como a descarbonização das actividades económicas, mas os investigadores defendem que o pensamento económico também tem que mudar de forma mais profunda.
“Temos repetido este mantra de que os países precisam de crescer primeiro, poluir e limpar depois”, afirma Richard Damania, economista-chefe do Banco Mundial para o desenvolvimento sustentável e co-autor do relatório, citado pela Reuters. “O que estas provas nos dizem é que isso é simplesmente falso.”
Fica arrumada a hipótese da “curva de Kuznets ambiental”, segundo a qual o crescimento económico conduz inicialmente à degradação ambiental, mas acaba por resultar em melhorias ambientais à medida que os níveis de rendimento aumentam. A análise do Banco Mundial sugere, pelo contrário, que “o crescimento económico tem um impacto negativo persistente na biodiversidade em várias fases de desenvolvimento”.
No entanto, a mensagem do relatório não é de restrição, mas de possibilidade: “Quando gerida de forma sensata, a natureza pode impulsionar o crescimento, criar emprego e reforçar a resiliência”, e uma utilização mais eficiente dos recursos “produz benefícios que excedem largamente os custos”. A redução da pegada ambiental é, aliás, um dos resultados de “maximizar a eficiência” do ponto de vista económico.
Contexto fracturante
O relatório adverte que os custos ocultos da poluição — que “prejudica silenciosamente a saúde, a produtividade e a cognição, minando o potencial humano” — são demasiado elevados para serem ignorados.
Entre as recomendações, o relatório insta os países a reorientar os subsídios actualmente gastos em actividades prejudiciais, como a exploração de combustíveis fósseis, apelando a uma mudança para “sectores mais limpos” e para a produção de “coisas melhores”, que proporcionam novas fontes de crescimento, criando mais empregos por cada dólar investido.
Esta proposta para “reiniciar o desenvolvimento”, contudo, é publicada num contexto político fracturante.
O Banco Mundial e outros credores multilaterais aguardam o resultado de uma revisão das suas operações pelos EUA — o maior accionista individual do banco —, ordenada pelo Presidente Donald Trump, em Fevereiro.
Avizinham-se também difíceis negociações sobre o financiamento climático na COP30, a cimeira que se realiza em Novembro, no Brasil. Os dados do Banco Mundial permitem fundamentar as discussões sobre a degradação ambiental entre os governos dos seus membros.
Axel van Trotsenburg garante que o Banco Mundial está empenhado em dar resposta a estes desafios, numa altura em que muitos países reduziram os orçamentos de ajuda internacional. “O nosso compromisso é acabar com a pobreza num planeta habitável, ponto final. Não vacilaremos nesta matéria”, assegura van Trotsenburg.