Depois de, pela manhã, terem mostrado alívio por se estar a evitar uma guerra comercial incerta, os investidores nas bolsas europeias começaram à tarde a mostrar mais dúvidas em relação ao impacto do acordo entre a UE e os EUA na economia europeia. O valor das acções caiu e o euro voltou, depois de semana de valorização, a perder terreno face ao dólar.

A reacção inicial nos mercados ao anúncio do acordo que prevê a aplicação de tarifas de 15% sobre cerca de 70% dos produtos exportados pela União Europeia para os EUA até foi positiva. Nas várias capitais europeias, as bolsas registaram subidas nos seus índices, e o euro manteve-se estável face ao dólar, perto dos máximos dos últimos quatro anos.

A ideia parecia ser, como explicou em declarações ao The New York Times o analista da ING Research, Carsten Brzeski, a de que “quando se está preparado para um furacão, de alguma forma uma tempestade acaba por ser um alívio”.

O “furacão” era um cenário em que, não havendo acordo, os EUA passariam a aplicar tarifas de 30% sobre todos os produtos importados da UE, o que conduziria a que, uma semana depois, Bruxelas retaliasse com o seu próprio aumento das taxas alfandegárias, aplicadas sobre uma lista de produtos norte-americanos previamente escolhidos e aprovados pelos líderes europeus.

Com esta alternativa em mente, as tarifas de 15% agora acordadas, havendo a expectativa, ainda não detalhada, de isenções de taxas para alguns sectores de actividade, podem ser vistas como uma “mera tempestade”, que acaba igualmente por ter o mérito de reduzir o nível de incerteza em relação à política comercial seguida pelos dois blocos económicos.

À medida que as horas foram passando, contudo, outro tipo de análises começou a ser feita. Talvez incentivados pela reacção negativa de alguns responsáveis políticos europeus, especialmente o primeiro-ministro francês que disse estarmos perante um “dia sombrio” de “submissão” da Europa, os investidores dos mercados financeiros internacionais começaram a fazer contas ao impacto económico que a UE pode vir a sentir pelo facto de, a partir de agora, ter uma parte muito significativa dos seus produtos a serem sujeitos a tarifas de até 15% que lhes retiram competitividade face aos seus concorrentes dos EUA.

Há pouco mais de meio ano, quando Donald Trump voltou a tomar posse como presidente dos EUA, as tarifas que eram aplicadas pelos norte-americanos às importações provenientes da UE eram em média de pouco mais de 1% (acontecendo o mesmo no sentido inverso). E, por isso, embora o acordo tenha feito reduzir a incerteza em relação a um conflito comercial aberto, ficou-se também com a certeza que a economia europeia irá mesmo de ter de viver com tarifas muito mais elevadas do que antes no mercado para o qual mais exporta.

Vários analistas assinalam a desigualdade do acordo atingido, com a Europa, apesar de evitar os custos imediatos da incerteza, a sair com uma posição menos favorável para a sua economia muito dependente das exportações. “Os termos desiguais do acordo sugerem que a UE deu prioridade à saúde económica de curto prazo em detrimento do braço de ferro de longo prazo com os EUA”, assinala a consultora Oxford Economics, numa análise aos resultados das negociações.

As razões para que a Europa tivesse aceitado um acordo deste tipo são também claras. “Um desempenho económico negativo e a recente subida da inflação fez com que os governos nacionais, especialmente na Alemanha e França, não estivessem disponíveis para arriscar mais dor económica ao tentarem obter um melhor resultado negocial”, explicam os analistas dos ABN Amro, lembrando ainda a dificuldade que Bruxelas tem em conciliar os interesses das diversas capitais e a dependência da UE face aos EUA nas questões relacionadas com a defesa.

Perante este tipo de análises, começou a prevalecer nos mercados uma imagem de derrota europeia nas negociações comerciais. As bolsas, que tinham começado o dia com subidas nos seus índices, acabaram o dia com perdas importantes: de 1,02% na Alemanha, de 0,43% em França, de 0,12% em Espanha e de 0,44% em Portugal.

E ainda mais significativo em relação às expectativas de longo prazo, o euro, que ao longo dos últimos meses beneficiou com as dúvidas relativamente ao efeito que a política proteccionista de Trump poderia vir a ter no poderio económico norte-americano, registou uma perda superior a 1% face ao dólar e de 0,8% face à libra.

Os detalhes do acordo, que nos próximos dias irão ser definidos ainda entre as duas partes, poderão agora ser decisivos para aquilo que serão as consequências económicas tanto nos EUA como na UE e a respectiva reacção dos mercados às mudanças.