Matthew McConaughey, o astro de Hollywood dono de um Oscar e de um Globo de Ouro, casou-se com a mineira Camila Alves na presença de um pastor, de um padre e de uma mãe de santo. Os detalhes dessa cerimônia meio texana, meio brasileira, realizada há 13 anos, fazem parte das memórias publicadas em “Sinal verde”, livro do americano, de 55 anos, que chega aqui agora pela editora Sextante. Lançada em inglês em 2020 e atualizada em 2024, a obra parte de diários escritos ao longo de mais de 35 anos.

— Peguei 36 anos de diários e passei 52 dias sozinho no deserto lendo-os — contou o ator, em entrevista ao GLOBO por e-mail.

Matthew McConaughey quando criança — Foto: Divulgação/Sextante Matthew McConaughey quando criança — Foto: Divulgação/Sextante

Essas lembranças foram postas no papel não nos moldes de uma autobiografia tradicional, ele avisa logo nas primeiras linhas, “embora conte histórias do passado”. O livro trata de “estratégias” e “abordagens”, por isso as frases de efeito destacadas, os trechos encorajadores e, em última instância, as metáforas dos sinais que dão título ao livro. “Sinal verde” diz respeito a aprovações, incentivos e vitórias saboreados por um jovem que largou a faculdade de Direito para estudar cinema, virou ator de sucesso em comédias românticas e conseguiu se reinventar no drama. As situações de sinais “amarelos” e “vermelhos” —uma tumultuada passagem pela Austrália quando jovem, as tensões da vida familiar, as armadilhas da fama e a complexidade de uma transição de carreira —marcam os tiros pela culatra transformados, no futuro, em oportunidades.

— O que parece um retrocesso, muitas vezes, carrega a semente do próximo capítulo. Alguns anos atrás, me afastei da atuação. No início, parecia um sinal vermelho, não tinha certeza de qual seria meu próximo trabalho. Mas essa pausa se transformou num sinal verde porque me permitiu ser pai em tempo integral e, eventualmente, escrever o livro — diz. — A perda do meu pai foi o sinal vermelho mais difícil, mas, com o tempo, as lições que ele deixou se tornaram uma bússola que me mantém vivo.

Matthew McConaughey em seu primeiro filme, 'Jovens, loucos e rebeldes' — Foto: Divulgação/Sextante Matthew McConaughey em seu primeiro filme, ‘Jovens, loucos e rebeldes’ — Foto: Divulgação/Sextante

Matthew é o mais novo dos três filhos de um casal de classe média do Sul dos Estados Unidos. O plano inicial daquele que fora coroado o garoto mais bonito da escola e namorava as meninas com as mesmas credenciais era ser advogado. Até começar a escrever contos e ouvir de um amigo que deveria estudar cinema.

Na segunda faculdade, fez um teste para o filme “Jovens, loucos e rebeldes”, dirigido por Richard Linklater, em 1993. Sem nenhuma experiência de atuação e agindo instintivamente, iniciou uma carreira que teve como ponto alto “Clube de compras Dallas”, em 2013. O filme em que interpreta um eletricista com Aids nos anos 1980 lhe rendeu o Oscar de melhor ator em 2014, anos depois de Matthew ter sido colocado na caixinha de bonitão de filmes pipoca do tipo “Como perder um homem em dez dias” e “Casamento dos meus sonhos”. No livro, ele registra todo o sufoco para colocar “Clube de compras Dallas” na lata, uma produção com dificuldades de financiamento e que o obrigou a chegar em 61 quilos, distribuídos em 1,82m. Um processo todo registrado também em diários que nunca deixaram de ser escritos até hoje.

—Isso ainda é a minha bússola. No começo, só escrevia quando estava perdido; agora, faço isso quando as coisas estão indo bem, para poder dissecar o que está funcionando — reflete ele, que, no livro, passa voando por momentos de sua vida que certamente renderiam cliques como a perda da virgindade e um estupro sofrido na adolescência. — Não quis me deter em fofocas ou dores sem propósito.

Já o casamento e a paternidade são assuntos bem documentados. Matthew viu Camila, mineira da cidade de Itambacuri, pela primeira vez no fim de 2006 num bar em Los Angeles (“Ela falava português, nunca entendi português tão bem quanto naquela noite, e nunca mais desde então”, ele escreve). Da paixão, nasceram três filhos: Levi, de 16 anos; Vida, de 15; e Livingston, de 12. O primogênito, por sinal, acaba de estrear nas telas. Ele faz parte, junto com o pai e a avó, a mãe de Matthew, Kay McConaughey, do elenco de “O ônibus perdido”, exibido no Festival de Cinema de Toronto no último fim de semana. O longa estreia mundialmente na Apple TV+ em 3 de outubro.

Matthew McConaughey e Levi McConaughey — Foto: Cole BURSTON / AFP Matthew McConaughey e Levi McConaughey — Foto: Cole BURSTON / AFP

—O Brasil está em nossa casa, literal e figurativamente. Comemos feijoada, arroz e feijão, pão de queijo e brigadeiro. Dançamos samba e da bossa nova. Vejo a força e a ternura da Camila nessas tradições, que enriqueceram minha alma texana e deram aos nossos filhos uma base multicultural sólida — diz ele.

O ator conta ter assistido com a brasileira a “Ainda estou aqui”, dirigido por Walter Salles e estrelado por Fernanda Torres, que ganhou o Oscar de melhor filme internacional em março.

—É um filme deslumbrante. Sentimos orgulho e alívio por ver uma história tão pessoal ressoar no mundo todo. É um sinal verde para os artistas brasileiros e um lembrete do poder de contar a verdade — diz ele, que garante manter o otimismo com o seu país, mesmo casado com uma imigrante latina, população alvo de políticas de deportação do presidente Donald Trump.— Continuo sendo um cara do copo meio cheio. Mas meu otimismo não é ingênuo. Ensinamos nossos filhos a celebrar tanto o Texas quanto o Brasil, a servir aos outros por meio da nossa fundação e a buscar luzes verdes mesmo quando a vida nos lança amarelas ou vermelhas. Essa forma de pensar me mantém esperançoso em relação aos Estados Unidos.