Manter a vacinação contra gripe, COVID-19 e outros vírus respiratórios atualizada é uma poderosa estratégia para reduzir significativamente o risco de infarto e acidente vascular cerebral (AVC). A conclusão é de uma abrangente revisão de estudos científicos conduzida pelo cardiologista Múcio Tavares de Oliveira Jr., da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), em conjunto com os infectologistas Mônica Levi e Renato Kfouri.
A análise, que compilou dados de pesquisas europeias, norte-americanas e multicêntricas, demonstra que a imunização funciona como um escudo para o sistema cardiovascular, especialmente em pessoas que já possuem doenças cardíacas, hipertensão ou são idosas.
Como uma infecção respiratória afeta o coração?
Quando o corpo é infectado por um vírus como o influenza ou o SARS-CoV-2, ele dispara uma intensa resposta inflamatória para combater o invasor. Nesse processo, há um aumento na produção de citocinas, as plaquetas se agregam com mais facilidade e o organismo entra em um estado “pró-trombótico”, ou seja, mais propenso à formação de coágulos.
Segundo o professor Múcio Tavares de Oliveira Jr., essa cascata de eventos pode desestabilizar placas de gordura já existentes nas artérias. “Essa inflamação sistêmica pode levar à ruptura de placas ateroscleróticas, causando a obstrução de artérias no coração ou no cérebro e, consequentemente, um infarto ou AVC”, explica o cardiologista. A ciência já demonstrou que o risco de infarto chega a ser seis vezes maior nos sete dias seguintes ao diagnóstico de gripe.
Estudos comprovam a redução expressiva de riscos
Os números que sustentam essa recomendação são robustos. Um dos principais estudos analisados, com 2.500 pacientes que já haviam sofrido um infarto, revelou um dado impressionante: aqueles que receberam a vacina contra a gripe tiveram 41% menos mortes por causas cardiovasculares no período de um ano, em comparação aos não vacinados.
Outras pesquisas reforçam os benefícios:
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Insuficiência Cardíaca: Um estudo com 5.000 pacientes mostrou que a vacina da gripe reduziu em 23% a mortalidade cardiovascular e em 24% as hospitalizações por complicações da doença.
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COVID-19: Pacientes vacinados contra a COVID-19 tiveram até 37% menos necessidade de internação em UTI e uma redução de cerca de 30% na mortalidade geral em um ano.
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Vírus Sincicial Respiratório (VSR): A infecção por este vírus pode aumentar em até 18 vezes o risco de eventos cardiovasculares graves, como infarto e arritmias, nos seis meses seguintes.
A ligação é tão clara que dados populacionais, como um levantamento russo com 35 mil mortes, mostraram que o risco de infarto era 30% maior durante os meses de pico da temporada de gripe.
Uma nova ferramenta na prevenção cardiovascular
O conceito de usar a imunização como uma intervenção cardioprotetora está ganhando força globalmente. A Sociedade Europeia de Cardiologia, uma das mais influentes do mundo, já incluiu a vacinação contra influenza e COVID-19 em suas diretrizes oficiais de prevenção para cardiopatas e idosos.
As evidências foram publicadas em revistas científicas de altíssimo impacto, como New England Journal of Medicine, The Lancet e Journal of the American Medical Association, e foram tema de destaque no recente Congresso Europeu de Cardiologia.
No Brasil, o Programa Nacional de Imunizações (PNI) já oferece gratuitamente pelo SUS as vacinas contra gripe e COVID-19 para grupos de risco, que incluem pessoas com doenças cardíacas. Para os especialistas, tratar a vacinação não apenas como uma forma de evitar doenças respiratórias, mas como parte integral do cuidado cardiovascular, pode representar um avanço substancial para a saúde pública.