Márcia Abadi diz que cerca de 30% a 50% de doenças podem ser prevenidos por meio da vacinação. Fernanda Polo / Agência RBS
A importância do diagnóstico precoce de doenças e da vacinação para transformar a vida de pacientes foi o tema central do evento “MSD em Pauta”, realizado em Porto Alegre na manhã desta terça-feira (9) pela empresa farmacêutica MSD.
Segundo dados apresentado pelos especialistas no evento, o câncer é uma das principais preocupações globais, com 9 milhões de mortes e 19 milhões de casos registrados no mundo em 2022. A projeção é de que o número de casos chegue a 30,2 milhões até 2040, devido ao aumento da longevidade, aos hábitos modernos e à maior detecção de diagnósticos.
No cenário mundial, os cânceres mais incidentes são de pulmão, mama e colorretal, enquanto os mais letais incluem pulmão, colorretal e fígado. No Brasil, o câncer é a segunda principal causa de morte, com os tipos mais comuns sendo mama, próstata, colorretal e pulmão.
De acordo com Márcia Abadi, diretora médica da MSD Brasil, cerca de 30% a 50% dos casos podem ser prevenidos por meio da vacinação (contra HPV e hepatite B) e do controle de fatores de risco, como tabagismo, sedentarismo, dietas pobres em frutas e vegetais e ricas em carnes vermelhas e processadas, consumo de álcool e obesidade.
Além disso, o diagnóstico precoce – somado ao tratamento – é crucial para a cura. Por exemplo, o câncer de mama descoberto em estágio 1 tem cerca de 99% de chance de sobrevida em cinco anos, aponta Márcia.
No entanto, cânceres de alta mortalidade, como os de pulmão e de cabeça e pescoço, são frequentemente diagnosticados em estágios avançados no Brasil, o que reduz as chances de cura e aumenta exponencialmente os custos do tratamento, gerando impactos sociais e econômicos.
Avanços em terapias combinadas com a cirurgia – principal tratamento nos diagnósticos precoces –, incluindo a imunoterapia, têm aumentado as chances de cura e reduzido a recorrência da doença.
— Quanto mais precoce a gente diagnosticar, maior é a chance de curar esse câncer. Isso tem impacto na vida do paciente, na vida familiar, na vida da sociedade, e um impacto econômico — afirma Márcia. — Precisamos incentivar a mudança no cenário do diagnóstico.
Um dos tipos mais incidentes e preocupantes, o câncer de pulmão tem 85% de seus casos ligados ao tabagismo, aponta Manuela Cavalcanti, pneumologista da Santa Casa de Porto Alegre e presidente da Sociedade de Pneumologia do RS. Ela alerta ainda para uma preocupante reversão na queda do consumo de tabaco.
O diagnóstico precoce, realizado antes do surgimento dos sintomas, é fundamental para aumentar a chance dos pacientes, já que, quando os sinais aparecem, a doença já progrediu. Atualmente, a maioria dos diagnósticos (75%) ocorre em estágios avançados, resultando em uma taxa de sobrevida de apenas 18% em cinco anos.
Segundo especialistas, para reverter esse cenário, é essencial o rastreamento ativo de pacientes assintomáticos entre 50 e 80 anos com histórico significativo de tabagismo. O exame adequado pode reduzir a mortalidade em até 20%. É preciso identificar a população de maior risco e buscá-la, ressalta Manuela Cavalcanti, pneumologista da Santa Casa de Porto Alegre e presidente da Sociedade de Pneumologia do RS.
— Não estamos buscando ativamente, estamos esperando (o paciente) chegar com sintomas — alerta.
Iniciativas como o Projeto Rastrear da Santa Casa de Porto Alegre demonstram sucesso, diagnosticando 38% dos pacientes em estágio inicial ao acompanhar a jornada do paciente anualmente. Além do rastreamento, programas para incentivar a cessação do tabagismo são essenciais.
Informação é a melhor prevenção
O câncer de colo de útero também preocupa: no Brasil, causa a morte de aproximadamente 19 mulheres diariamente e é a principal causa de óbito entre mulheres com até 35 anos, e a segunda até os 60.
Uma pesquisa recente do Instituto Locomotiva, encomendada em parceria com o Grupo Eva, apontou um conhecimento muito baixo sobre a doença: 60% das mulheres não têm informações adequadas, e apenas quatro em cada 10 sabiam que o HPV é responsável por 99% dos casos de câncer de colo de útero.
Além disso, três em cada 10 não sabiam para que o exame Papanicolau serve, evidenciando uma das barreiras significativas para a prevenção.
Cerca de 80% a 85% da população será exposta ao HPV em algum momento da vida, mas o vírus é eliminado pela maioria das pessoas, alerta Valentino Magno, ginecologista no Hospital de Clínicas de Porto Alegre, professor da UFRGS e membro da diretoria da Associação Brasileira de Patologia do Trato Genital Inferior e Colposcopia.
Valentino Magno apresentou dados sobre a importância da vacinação para prevenir o HPV.Fernanda Polo / Agência RBS
Além do diagnóstico precoce, a imunização tem um impacto transformador. O câncer de colo de útero é totalmente evitável e potencialmente erradicável, por meio da vacina e rastreamento, que detectam lesões pré-cancerígenas de forma eficaz.
— Se vacinássemos todo mundo, tiraríamos o HPV de circulação. De 10% a 15% dos casos de câncer na mulher desapareceriam. Isso é muito. Eu não consigo pensar em medidas tão importantes, exceto cessação de tabagismo, água encanada, coisas só desse porte que a gente tem tanta proteção pra nossa população — enfatiza Magno.
O impacto social do câncer do colo de útero é devastador: pode impedir a mulher de ter filhos, antecipar a menopausa e dificultar relações sexuais, além de ser a segunda maior causa de crianças órfãs no mundo, atrás apenas do câncer de mama.
A vacina contra o HPV é extremamente segura e eficaz, protegendo contra os tipos que causam a maioria dos cânceres e lesões pré-cancerígenas. Países como a Austrália já registram redução superior a 90% nessas lesões após a implementação da vacinação em massa.
No Brasil, a cobertura vacinal melhorou após forte queda durante a pandemia de covid-19, mas ainda está abaixo do ideal – devido à incorporação relativamente recente no SUS, voltada a uma faixa etária restrita, o que significa que a maioria das mulheres acima de 30 anos não recebeu a imunização.
Além disso, o Brasil está implementando o novo teste de HPV para rastreamento, capaz de antecipar o diagnóstico de câncer em até 10 anos, reforçando ainda mais a prevenção quando combinado à vacinação.
— O útero é onde a vida começa, e não onde ela deve terminar — encerra o médico.
Doenças raras
O evento também aprofundou o debate sobre doenças raras, como a hipertensão arterial pulmonar (HAP), uma condição grave que eleva em até 10 vezes a pressão arterial nos vasos pulmonares, dificultando a oxigenação e causando sintomas como cansaço e falta de ar.
Segundo Gisela Meyer, cardiologista do Centro de Hipertensão Pulmonar da Santa Casa de Porto Alegre, a mortalidade da HAP é superior à de muitos tipos de câncer, com expectativa de vida de apenas 2 a 2,5 anos sem tratamento.
A doença afeta principalmente mulheres e jovens e tem um impacto devastador, embora novos medicamentos ofereçam melhores perspectivas de vida aos pacientes.