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Tudo a Ler
A crise de refugiados, o brexit e a chegada de Donald Trump à Presidência dos Estados Unidos foram algumas “mudanças sísmicas” sentidas pelo irlândes Paul Lynch quando começou a escrever “A Canção do Profeta” (Rogerio W. Galindo, R$ 88,90, 304 págs.). O romance venceu o Booker, o prêmio mais importante da língua inglesa, e agora chega ao Brasil pela editora DBA.
A erosão da democracia vem se tornando fonte de inspiração para a literatura distópica contemporânea. Em sua ficção especulativa, Lynch imagina o que pode vir a se tornar seu país, conjecturando a partir de situações que já aparecem no presente. A reportagem de Walter Porto aponta que distopias costumam ser mobilizadas por medo ou ódio.
A estratégia de Lynch ao abordar os temores de hoje como perigos de amanhã serve à ideia de que as pessoas não respondem emocionalmente a fatos, mas a histórias —conclusão que explica não só a relevância do trabalho do irlandês, mas de muitos que vieram antes dele. Por exemplo, o ainda alarmante “1984”, de George Orwell, que há décadas imaginou um cenário hoje temido pelo escritor Jason Stanley.
No livro de não ficção “Apagando a História: Como os Fascistas Reescrevem o Passado para Controlar o Futuro” (trad. Denise Bottmann, L&PM, R$ 69,90, 224 págs.), o filósofo americano discute como poderes políticos são capazes de apagar memórias coletivas e formar cidadãos dóceis através das narrativas que perpetuam. A obra, segundo a crítica Sylvia Colombo, “mostra que a memória coletiva é o campo onde se decide se sociedades permanecerão democráticas”.
Acabou de Chegar
“Para John” (trad. Marina Vargas, HarperCollins Brasil, R$ 89,90, 224 págs.) reúne transcrições das sessões de psiquiatria da escritora americana Joan Didion. Ao longo de três anos, a autora reflete sobre a relação com seu marido John Dunne e sua filha Quintana Roo. Para o crítico Gabriel Trigueiro, o novo livro soa como o material bruto que deu origem a outros de seus livros mais bem lapidados, como “O Ano do Pensamento Mágico” e “Noites Azuis”.
“Te Dou Minha Palavra” (Companhia das Letras, R$ 79,90, 208 págs.) é o livro mais autobiográfico da paulistana Noemi Jaffe, que ela vê como a culminação de toda a sua trajetória. Na obra, histórias e memórias se misturam em suas percepções. Como a autora diz ao editor Walter Porto, “essa disparidade entre o que você sente e o que você vê é muito chocante”. “E as duas coisas estão certas.”
“Berg” (trad. Gisele Eberspächer, DBA, R$ 76,90, 184 págs.) marca a chegada de Ann Quin ao Brasil, já como uma autora clássica, segundo o crítico Felippe Cordeiro. O livro subverte o mito de Édipo e tem como protagonista um filho que se prepara para matar o pai. “A redescoberta de Quin é um presente para a literatura contemporânea, pois oferece a oportunidade de ‘reler’ pela primeira vez uma voz única, que se recusou a ser domesticada”, escreve o resenhista.
E mais
Gilberto Gil registra sua turnê de despedida no livro “Tempo Rei” (Gege Edições Musicais, R$ 96), com fotos de momentos marcantes e cifras das músicas apresentadas nessa última leva de shows. Gil já declarou não ter vontade de recontar sua história por um mecanismo tradicional como uma autobiografia e diz se interessar mais pelas interpretações dos outros sobre sua obra. Ele também afirma ao jornalista Walter Porto estar aberto à escrita depois de terminar os shows.
Na obra “Na China com o Green Day?!!” (trad. Alvaro Dutra, Terreno Estranho, R$ 115, 176 págs.), Aaron Cometbus, um ex-roadie do grupo punk, narra suas memórias durante uma turnê por países da Ásia em 2010. A obra é, segundo a crítica de André Barcinski, “uma espécie de acerto de contas do Green Day com Cometbus, que havia criticado a banda em algumas ocasiões por ter supostamente se vendido ao comercialismo”.
Em 1592, o jovem poeta português Bartolomeu Fragoso foi preso pela Inquisição em Salvador. Na ocasião, teve seus papéis sequestrados pelo governo, entre eles o manuscrito “O Cancioneiro das Baldaias”. Mais de 400 anos depois, o pequeno livro foi encontrado na Torre do Tombo, em Lisboa, pela pesquisadora Sheila Hue, e vai ser publicado no Brasil pela editora Chão, como conta o Painel das Letras.
Além dos Livros
A Anthropic respondeu aos processos por uso indevido do conteúdo de livros com um acordo de US$ 1,5 bilhão (equivalente a R$ 8,1 bilhões). A empresa de inteligência artificial se comprometeu a fazer o pagamento a autores que a acusaram de usar suas obras para treinar o chatbot Claude e também se comprometeu a destruir milhões de cópias de livros piratas armazenados em seus servidores. O episódio tem sido considerado o primeiro grande acordo da era da IA generativa.
Após voltar ao mercado, a editora Cosac prepara novas publicações de livros da antiga Cosac Naify, além de uma versão inédita de “Romeu e Julieta” e uma coleção de teatro de Pasolini. Como conta o Painel das Letras, a nova edição da obra de Shakespeare traz um ritmo mais veloz, voltado ao teatro, com tradução e notas do professor de artes cênicas Ricardo Cardoso.
No último mês, aconteceu no interior de Minas Gerais a terceira edição do Fliparacatu, festival literário que oferece a grandes escritores um momento de convivência calma e festiva. O evento é idealizado por Afonso Borges, gestor cultural por trás dos similares Fliaraxá, Flitabira e Flipetrópolis. Autoras como Carla Madeira, Ana Maria Gonçalves e Míriam Leitão passaram por lá e também aproveitaram a oportunidade para falar de seus novos livros.