As novas regras para a venda de créditos em incumprimento estão finalmente transpostas para o direito nacional, um processo que arranca com quase dois anos de atraso face à data limite fixada por Bruxelas (29 de Dezembro de 2023). Em causa a venda, por parte de instituições bancárias, de carteiras de crédito que podem incluir empréstimos à habitação e ao consumo.

O Decreto-Lei n.º 103/2025, publicado esta quinta-feira em Diário da República, que transpõe parcialmente a Directiva (UE) 2021/2167, relativa aos gestores de créditos e aos adquirentes de créditos, com a criação do regime da cessão (ou cedência) e gestão de créditos bancários (RCGCB), executa o Regulamento (UE) 2017/2402, criando ainda um novo regime da Central de Responsabilidades de Crédito (CRC), e entrará em vigor dentro de 90 dias (meados de Dezembro).

Para os particulares, e no caso de incumprimento, a principal vantagem do diploma está na possibilidade de retoma de pagamento do empréstimo, situação até agora praticamente impossível, uma vez eu era exigida a liquidação de toda a dívida de uma só vez.

O novo regime também reforça os direitos dos devedores em caso de alienação de créditos em cumprimento (sem atrasos) a outros fundos de titularização de créditos, a sociedades de titularização de créditos, a instituições de crédito, a sociedades financeiras e organismos de investimento alternativo de créditos.

Com o RCGCB, define-se “a cessão de créditos e a actividade de gestão de créditos objecto de cessão, estabelecendo condições específicas conforme o tipo de cessionário e a situação do crédito. Releva destacar que este regime garante a neutralidade da cessão, assegurando que o devedor não é colocado numa posição jurídica menos favorável, mediante a exigência, para a eficácia da cessão, da notificação ao devedor e da contratação de entidade habilitada a gerir créditos, quando legalmente exigível”, lê-se no preâmbulo do diploma.

Ou ainda que “o cessionário fica sujeito a deveres decorrentes da cessão, traduzindo-se em deveres gerais de actuação e tratamento do devedor”, que abrangem “o dever de segredo profissional, com o sentido e extensão do segredo bancário”, ficando ainda “vinculado a padrões de conduta exigentes na sua relação com o devedor, incluindo, de lealdade e de respeito pelos legítimos interesses do devedor”.

Outra alteração importante prende-se como a exigência de as entidades cessionárias terem de nomear um gestor do crédito, registado no Banco de Portugal, que passa, assim, a supervisionar estas entidades.

Alteração à Central de Responsabilidade de Crédito

Uma das novidades introduzidas no diploma prende-se com a informação a enviar à Central de Responsabilidade de Crédito (CRC), a base de dados onde estão registados os créditos de cada devedor, bem como a situação de cumprimento e incumprimento, entre outros elementos.

A venda de créditos tem gerado uma falta de actualização da informação que consta da CRC, nomeadamente porque as instituições de crédito retiram a informação de incumprimento, porque o crédito já não lhe pertence, e os gestores de créditos não a actualizavam, porque não estavam autorizados a fazê-lo.

O atraso na transposição da directiva levou a Comissão Europeia a abrir um procedimento contra Portugal, e outros Estados-membros, no Tribunal de Justiça da União Europeia. Com a alteração proposta, as instituições financeiras ficam obrigadas a comunicar à CRC os créditos objecto de cessão, e o mesmo se aplica aos gestores de créditos, nomeadamente quando recorrerem à subcontratação de actividades de gestão de créditos.