João Almeida vai ficar a pensar em muitos “ses” nesta edição da Volta a Espanha em bicicleta. Se a Emirates não tivesse perdido a batalha táctica com a Visma, se tivesse colegas mais motivados para o ajudar, se não tivesse havido protestos pró-Palestina a antecipar finais de etapas importantes, se o contra-relógio da última semana tivesse a distância prevista, talvez as coisas tivessem sido diferentes. Mas não vai ficar a pensar na etapa que, na prática, decidiu a vitória a favor de Jonas Vingegaard. O dinamarquês tinha uma vantagem a defender e, em vez de jogar à defesa, atacou.

Vingegaard é o vencedor virtual da Vuelta 2025, a sua primeira na prova espanhola, depois de uma categórica exibição na duríssima subida à Bola del Mundo, que consolidou a sua liderança na geral. O dinamarquês entrava nesta penúltima etapa com 44 segundos de vantagem sobre Almeida e acabou por deixar o português a 1m16s, com a sua terceira vitória em etapas, numa espectacular ascensão à Bola del Mundo, a mostrar pernas que mais ninguém teve naquela subida com 20% de inclinação, numa pista estreita e com piso irregular.

Todos os caminhos desta Vuelta levavam a esta penúltima etapa, a última onde alguma coisa ainda podia mudar na geral. Desta vez, João Almeida teve apoio adequado da equipa – Jay Vine, líder da montanha, levou o português até ao início da subida final, a cerca de 3km do topo. Almeida tomou o bastão da liderança, mas nunca atacou em força. Vingegaard nunca deixou a roda do português e, quando Jay Hindley atacou, ele foi atrás.

O português deixou-se ficar, voltou a colar aos da frente, mas, de imediato, Vingegaard, a cerca de 1km do topo, atacou. Almeida não se sentiu capaz de ir atrás e optou por limitar as perdas – terminou em quinto, dentro da margem de segurança para segurar o seu segundo lugar da geral.

“Foi muito duro”, disse João Almeida no final da etapa. “Estive no limite a etapa toda, mas tinha de tentar, não tinha nada a perder”, reconheceu. E qual era o plano para este dia? “Era dar tudo, meter um ritmo forte. Infelizmente, tenho estado doente esta semana e as sensações não eram as melhores. Mas não deixámos de tentar, é o que importa. Sem arrependimentos. Fizemos tudo o que podíamos.”

A etapa deste domingo, com chegada a Madrid, será apenas de consagração para Vingegaard e uma última oportunidade para os sprinters, e não há qualquer abertura para Almeida montar um último ataque. Não vai ficar com o prémio maior, mas Almeida demonstrou mais uma vez que é um voltista de elite – já foi terceiro no Giro (2023), quarto no Tour (2024) e já tinha sido quinto na Vuelta (2022).

Foi uma exibição consistente, do primeiro ao penúltimo dia, com classificações no “top 5” em oito etapas. A “cereja” para ele foi a vitória no Angliru, à 13.ª etapa, num duelo até ao último metro com Vingegaard. Este segundo lugar igual a melhor prestação de um português numa das três grandes voltas – Joaquim Agostinho também foi segundo na Vuelta em 1974.