Como é a vossa gestão familiar neste sentido, considerando que ambos têm trabalhos muito dinâmicos e os dois têm filhas pequenas?
DN: Eu faço questão que as nossas filhas comam o melhor que puderem. A toda hora, todos os dias. Os fornecedores e mercados, já tenho isso tudo, naturalmente. Não é um dilema.
CMP: Antes não tinha essa preocupação, comprava coisas banais no supermercado. E hoje em dia, acho que faz parte da rotina. Já sabemos que compramos as coisas no Miosótis, que já tem essa seleção ótima de produtos.
DN: No Miosótis e no Celeiro – sendo que é por esta ordem – compro coisas mais transformadas. Depois temos o Mercado do Príncipe Real, que está muito perto de cá, onde já vou há muitos anos, também para os restaurantes, e onde tenho relações com algumas pessoas que vendem, estabelecidas já há muitos anos. Mas também compro profissionalmente, mando e-mails, encomendo coisas. É toda uma dinâmica que se cruza, não é? Eu sou profissional de cozinha. Às vezes, quando compro para os eventos e projetos, também compro aqui para casa. Quando compramos proteína animal, comemos, maioritariamente, peixe. Depois, quando comemos carne, compramos às Manas (Talho das Manas) e aí compramos cabazes maiores e alguma coisa congelada, que nos permite também ter essa gestão diária em casa um bocadinho diferente.

E as meninas gostam? 
DN: As nossas filhas adoram. A filha da Carlota, quando começámos a viver juntos, também começou a ser introduzida nesta dieta.
CMP: Estava a almoçar comigo no outro dia e eu comi umas batatas e ela disse: ‘mãe, apetece-me uns brócolos’ (risos).
DN: No fim de semana, tivemos um evento na sexta-feira e há sempre uma coisa ou outra que sobra. O jantar de sábado, com amigos, foi uma massa fresca que fui comprar aqui ao restaurante italiano, que fazem massa fresca e vendem para fora, com uma bisque de carabineira. As nossas filhas também já sabem o que é bom. Desde que a minha filha nasceu, faço questão de dar a maior variedade possível. Ou seja, frutos secos, leguminosa, os grãos, os vegetais todos. Come imensos fermentados, misos, massas fermentadas. Tudo aquilo que é do meu universo culinário e da minha proposta. Às vezes percebo que são coisas que se calhar têm demasiada complexidade. Mas depois também se vê que elas querem lá voltar. E lambem-se, já sabem, perguntam, dizem: ‘eu quero isto e não quero aquilo’.

E participam na cozinha?
CMP: Nós fazemos questão de puxar por elas. E elas adoram fazer parte, ajudar, sentem-se super capazes depois.
DN: Acho que esse é o gosto também da nossa vida familiar em casa. É perceber que as nossas filhas também se envolvem nesses processos todos. De uma forma muito natural, o que para um pai é super gratificante. Perceber que realmente há aqui uma dinâmica familiar em casa que é a nossa. E que é a nossa vida, a nossa forma de estar. E perceber que os nossos filhos se integram nisso de uma forma super natural e orgânica. Nós acreditamos que estamos a dar o melhor aos nossos filhos.

Como começou o interesse do Diogo pela cozinha?
DN: Há imensas formas de entrar a cozinhar. Mas pelo menos num contexto mais português, porque às vezes os meus colegas de profissão vêm de um registo tradicional e de memórias mais ligadas à família e tudo isso. Que eu também tenho, obviamente. Mas, para mim, um momento chave de ter começado a cozinhar realmente tem a ver com uma mudança que eu fiz na minha alimentação e na minha dieta aos 17 anos. Os meus primeiros livros de cozinha são todos livros macrobióticos e vegetarianos. Tornei-me vegano com essa idade, muito ligado à macrobiótica. E como tenho uma família grande… Cheguei à casa e os meus pais disseram: ‘desenrasca-te’.

É de onde vem também as experimentações com a fermentação?
DN: Sim. Como estava muito focado nisso, entrei muito a fundo nessa cultura, de base vegetal. E também, na altura, há 20 e tal anos, era um veganismo que, se calhar, não era tão comercial, digamos assim, como é o atual. Não havia tanta abertura, tantas opções de dietas. Obviamente que entrando pela macrobiótica e por uma cozinha mais de base ou de raiz asiática, japonesa e por aí fora, que é onde se iniciou o movimento macrobiótico, naturalmente, e talvez de uma forma não tão consciente, o tema da fermentação sempre me acompanhou e sempre esteve presente. Sendo que nos últimos seis ou sete anos comecei a entrar mais nesta exploração. O tema da fermentação é trabalhoso. Exige algumas condições que às vezes as cozinhas têm ou não têm. Em termos de temperatura, higiene, porque depois há um risco de alguma contaminação. Mas é mais forte e robusto do que as pessoas pensam. Às vezes, quando entram no universo da fermentação, as pessoas acham que isto é tudo muito sensível. Isto não é assim tão sensível. São bactérias, fungos, são todas essas coisas que estão vivas e temos que lhes dar as condições para estarem saudáveis e para não desenvolver outro tipo de bactérias e de fungos e por aí fora. Isto (aponta para um frasco) esteve ali na nossa cozinha com os tamarilhos durante, sei lá, meses. E eu no outro dia, pensei: ok está na altura de filtrar isto e meter no frio. Mas não foi pasteurizado. E agora está ali no frio e eu olho para isto: o que é que eu vou fazer? Vou fazer um vinagre. E faço. É um bocado esta a minha relação com alguns ingredientes e com alguns condimentos.