Diferente da média, Robert Redford sempre foi. Por exemplo, tendo nascido em Los Angeles, ao contrário de quase toda Hollywood, nunca viu aquela como uma cidade aonde chegar, mas de onde sair. “Eu nasci no fim do arco-íris. Não vi o arco-íris”, disse ele, morto nesta terça-feira.

Gostava da Los Angeles onde nasceu, em 1936, mas não daquilo em que a cidade se tornou após a Segunda Guerra: enorme e rica. Seu pai era contador. Sua proximidade era com a mãe, que o aproximou dos livros. Isso era uma coisa. A disciplina, outra. Inquieto e rebelde, foi expulso de várias escolas antes de ir para a Universidade do Colorado, com uma bolsa obtida graças a suas habilidades como jogador de beisebol.

Foi lá que, disse, se apaixonou pela natureza. Sua militância ambientalista vem desse momento.

A parada seguinte foi em Paris, onde estudou artes por um ano e meio no começo dos anos 1950. Ali lhe perguntaram sobre sua posição política. Nunca tinha pensado no assunto. Nunca mais deixaria de pensar.

A natureza, a liberdade, a política foram fatores decisivos em sua carreira. Talvez a rebeldia da juventude o tenha levado ali —Redford representou sempre o lado mais humanista e progressista do cinema norte-americano. Consulte-se sua filmografia. Comédia, drama, filme político —é difícil encontrar um filme inconsequente.

Depois de se transferir das artes plásticas para as artes dramáticas, após voltar da França e se fixar em Nova York, encontrou o que seria seu caminho. O início foi no teatro, de onde passou ao trabalho em séries de TV —várias delas boas, como “Perry Mason”, “Além da Imaginação”, “Alfred Hitchcock Presents” —e, finalmente, chegou ao cinema, primeiro com Robert Mullingan, em “A Procura do Destino”, de 1965, e depois com Arthur Penn, em “Caçada Humana”, de 1966,

Seu primeiro papel, o que o tornou conhecido, foi ao lado de Natalie Wood em “Esta Mulher É Proibida”, de 1967, primeiro filme de Sydney Pollack, com roteiro de Tennessee Williams e Francis Ford Coppola.

O que veio depois foi uma enxurrada de sucessos em filmes invariavelmente marcados pela generosidade e olhar liberal, como o faroeste “Butch Cassidy”, de 1969, e a comédia “Golpe de Mestre”, de 1972, longas que consagraram sua parceria com Paul Newman. A preocupação com os povos indígenas dos EUA é clara em “Mais Forte que a Vingança”, também de Sydney Pollack, em que o homem solitário descobre no índio uma fonte de conhecimento e de modos de convivência.

O jornalismo também podia ser uma forma de engajamento, e isso é o que se pode ver em “Todos os Homens do Presidente”, de 1976.

Redford era, ninguém duvida, um rosto bonito, um dos principais galãs de seu tempo. Um ótimo ator, idem. Mas isso não o contentava. Primeiro, instalou-se em Utah, estado de sua primeira mulher, Lola van Hanegen, onde comprou uma propriedade. Fez desse lugar a sede do famoso festival de Sundance do cinema independente, criado em 1978 e destinado a abrigar filmes com ambição artística, num cinema americano que naquele momento se voltava aos blockbusters e a produções criadas em torno de efeitos especiais.

Sua divisa era sempre olhar para frente, não se contentar com o que já havia feiro. Foi fiel a essa máxima. Como produtor, aliás, esteve duas vezes com Walter Salles Jr., em “Central do Brasil”, 1998, e “Diários de Motocicleta”, de 2003.

Passou também à direção, o que lhe valeu o único Oscar que ganhou, e logo na estreia, em “Gente como a Gente” (1980). Foi o primeiro dos dez filmes que dirigiu.

Voltou a concorrer na categoria uma segunda vez com “Quiz Show” (1994), que talvez fosse até superior ao primeiro, mas não ganhou. Levaria um Oscar honorário pela carreira e, de quebra, foi homenageado com a Medalha da Liberdade, por Barack Obama, então presidente dos EUA.