Pinguim e Arlequina em uma viagem sobrenatural onde enfrentam os erros e as dores de seu passado. Parece uma fanfic elaborada, mas trata-se do filme A Grande Viagem da Sua Vida, que promove o encontro de duas estrelas da DC, Colin Farrell e Margot Robbie. Num mundo saturado de filmes de heróis e blockbusters, é até curioso ver um romance filosófico encontrar seu espaço nos cinemas. Mas será que ele entra para a história como uma vitória ou uma derrota do gênero?
Qual é a história de A Grande Viagem da Sua Vida?
Sony Pictures
A Big Bold Beautiful Journey (no original) começa acompanhando David (Colin Farrell), um cara meio solitário e deprimido com a vida que está prestes a viajar para o casamento de uma amiga. Após um incidente, ele aluga um carro numa excêntrica companhia, mas consegue chegar ao seu destino. Lá, ele conhece Sarah (Margot Robbie), que tem uma visão pessimista do amor.
O que ninguém esperava é que ambos foram clientes do mesmo aluguel de veículos, que conta com um GPS mágico que irá orientá-los para – literalmente – abrir portas para seus passados. Nessa jornada emocionante, David e Sarah ainda terão que descobrir se conseguem funcionar como um casal e superar os seus traumas para construir uma vida feliz.
A Grande Viagem da Sua Vida é uma jornada ao passado
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A direção fica sob o comando de Kogonada, que investiu anteriormente em filmes independentes como o sublime Columbus; porém não há muita sutileza em A Grande Viagem da Sua Vida. Tudo começa nas suas cores, com forte uso de tons saturados, como vermelho, azul e amarelo – o que, sinceramente, eu até aprecio. Porém, ao mesmo tempo, não existe algo inventivo em sua forma de filmar as cenas.
O roteiro de Seth Reiss (que participou do excelente O Menu) também não ajuda muito a transformar este longa em algo marcante. A história tem grande potencial e, certamente, não ofende ninguém. Só é meio esquecível. Eu literalmente já tinha esquecido o nome do protagonista quando comecei a escrever essa crítica. E minha memória pode não ser das melhores, mas é muito boa para cultura inútil. Me pergunta sobre comédias românticas e filmes de vampiros para você ver…
Enfim, esse é o grande problema de A Grande Viagem da Sua Vida. Com um título tão imponente como esse, você cria altas expectativas, mas estamos diante de uma história comum, mesmo com o uso da fantasia – que, por sua vez, nunca é explicado, o que não é necessariamente um problema, mas também não deveria ser tratado de forma tão comum. “Ah, olha, é uma porta que abre para os meus tempos de ensino médico. Ah okay.” Cadê o choque? A surpresa? Ou o encanto de viver algo mágico?
Um toque de romance filosófico que nem sempre funciona
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Nessa mesma vertente, os problemas dos protagonistas não são os mais criativos… Ele ouviu que era “especial” a vida inteira, mas tem uma vida ordinária e nada é o suficiente. Eu preciso ter pena que David teve pais amorosos que o mimaram demais? Moço, se eu te contar os problemas que existem no histórico da minha família e o trauma geracional que está presente na maior parte da sociedade, você vai agradecer e ficar quieto. Ok, talvez eu esteja pegando pesado, mas foi difícil sentir empatia pelo personagem.
Por sua vez, Sarah tem problemas emocionais mais complicados. Por um lado, ela segue o recente padrão dos romances no qual a mulher é a destruidora de corações, o que foge do clichê antigo, beleza. Por outro lado, a mulher sofre com a perda da mãe e se arrepende de ter perdido tempo com besteiras. A ideia de não conseguir se perdoar por erros que não podem ser consertados é algo bem identificável.
Justamente por conta de seus problemas pessoais, nenhum deles consegue investir em relacionamentos – o que culmina numa cena em um restaurante onde encontram seus antigos parceiros. Nada muito profundo, mas é um dos momentos mais honestos do longa e cruza bem os caminhos de David e Sarah. Pena que depois disso, a história cai em uma série de clichês sobre o desejo de investir no amor, mesmo sem saber se ele vai dar certo. A mensagem é maravilhosa, mas a execução falha. Principalmente em comparação a outras inspirações deste filme como As Pontes de Madison e a trilogia Antes do Amanhecer.
Margot Robbie e Colin Farrell estrelam A Grande Viagem da Sua Vida
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No geral, Colin Farrell e Margot Robbie estão bem representando os conflitos de David e Sarah. Afinal, sabemos que ele consegue viver um personagem deprimido como ninguém, e ela consegue ser uma musa capaz de expressar grandes sentimentos. Não vai ficar para a história como um casal com uma das maiores químicas do cinema, mas funciona e é agradável vê-los em tela.
O surpreendente é ver como vários rostos conhecidos de Hollywood fazem pequenas aparições nesse filme com cara de produção independente: Phoebe Waller-Bridge e Kevin Kline interpretam os funcionários da fantasiosa empresa de aluguel de carros e possuem alguns momentos divertidos, mas raros. Já Hamish Linklater, Lily Rabe e Billy Magnussen estão em cenas mais dramáticas, mas são participações de luxo. Por fim, Jodie Turner-Smith é voz do misterioso GPS que serve de conselheira e casamenteira.
Vale a pena ver A Grande Viagem da Sua Vida?
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Dentre os defeitos citados acima, o que mais gosto de A Big Bold Beautiful Journey é sua ideia. Esse potencial de abrir portas para o seu passado e reviver aquilo que mais ama ou que mais te traumatizou, revisitar sentimentos contrastantes, experienciar novamente a esperança antes da primeira vez que partiram seu coração… Isso é legal. No Brasil, o máximo que a gente teve foi a Porta dos Desesperados do Sérgio Mallandro.
Porém, Kogonada acabou entregando uma direção pouco sutil para um roteiro que não entrega os momentos emocionais que tanto demanda. Não é uma perda de tempo, afinal quem curte um belo romance, vai gostar de investir nessa aventura. Mas eu não consigo deixar passar a sensação de que podia ser algo muito maior… Espera, será que eu virei o David nessa crítica? Eu virei justamente aquilo que mais odiei? Será que esse filme é, na realidade, uma experiência muito mais interessante do que eu esperava e não percebi? É, acho que você terá que comprovar com os seus próprios olhos, pois cada experiência – assim como a vida – é única.