Alexandra Leitão apresentou esta sexta-feira o programa que vai levar a votos pela coligação que junta PS, BE, Livre e PAN — que acabou por deixar de fora o PCP, onde os socialistas já perceberam ter, nestas eleições, um adversário de relevo. Nos debates até agora, João Ferreira mostrou-se empenhado em roubar o voto de esquerda a esta frente e é com isso em mente que Alexandra Leitão vai já avisando que “só há uma única alternativa a Carlos Moedas, e essa alternativa é a coligação Viver Lisboa. É a única alternativa”, repetiu mesmo.
E havia de voltar a dizê-lo, no final da intervenção, deixando clara a sua necessidade de bipolarizar esta campanha, ao mesmo tempo que vai garantindo não está nisto “por taticismos”. Mas a tática impera e no terreno de jogo Leitão quer mover-se de modo a ocupar o espaço todo da alternativa a Carlos Moedas. Embora o programa acabe, depois, essencialmente focado em medidas na classe média, procurando conseguir entrar no eleitorado ao centro.
Promete “construir uma alternativa sólida, aberta e plural, que coloque a habitação, a mobilidade, a sustentabilidade e a qualidade de vida no centro das prioridades”. E embora jure que não é uma coligação “contra ninguém”, aponta baterias a Carlos Moedas: “Não queremos uma cidade de unicórnios” — o seu programa até propõe mudar o nome da “fábrica de unicórnios” de Moedas para “Hub Criativo”. “Lisboa não pode continuar a perder tempo com uma governação assente em propaganda, que atira para outros a responsabilidade pela sua própria incapacidade de cuidar da cidade”, afirmou sobre o atual presidente da Câmara.
Antes de Leitão tinham falado representantes dos outros partidos que fazem parte da coligação e, entre eles (Fabian Figueiredo, do BE, Isabel Mendes Inês, do Livre, e Inês Sousa Real, do PAN), José Luís Carneiro, que também apontou a Moedas.
“Quando, ao fim de quatro anos, olhamos para a principal proposta política do atual e ainda presidente da Câmara Municipal de Lisboa e a sua primeira e mais importante preocupação continua a ser resolver um problema tão básico como a recolha do lixo da cidade, está tudo explicado sobre aquilo que foram os quatro anos perdidos por esta cidade”, atirou o líder do PS. Aqui junta-se a um dos temas de ataque a Moedas, onde Alexandra Leitão diz que a cidade “nunca foi tão mal gerida”, propondo sete dias por semana de recolha de lixo nos pontos mais críticos da cidade — contra os seis dias de Carlos Moedas.
Ao mesmo tempo, Carneiro entrou para fintar as queixas de Moedas sobre as condições de governação na cidade neste mandato, saudando “aqueles que contribuíram para dar todas as condições políticas ao atual e ainda presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Em nenhum momento o atual e ainda presidente se pode queixar da atitude dos vereadores ou dos membros da Assembleia Municipal e eleitos pelo PS”, vincou.
Uma das críticas maiores que Alexandra Leitão dirigiu esta tarde, na apresentação do programa em São Domingos de Benfica, foi sobre o silêncio recente perante a venda de imóveis pelo Estado em Lisboa. “A decisão de vender estes imóveis é um erro estratégico e político grave. E onde está Carlos Moedas? Nem uma palavra lhe ouvimos para defender o direito à habitação dos lisboetas. A confirmarem-se as notícias, o edifício onde a Câmara Municipal de Lisboa se comprometeu a instalar, por exemplo, a Academia de Amadores de Música, também vai ser vendido em hasta pública”, sublinhou.
Nesta matéria concreta, a candidata socialista assumiu mesmo o compromisso de “tudo fazer e de lutar junto do Governo para evitar que imóveis públicos com aptidão habitacional sejam vendidos no mercado livre, contribuindo assim para a especulação e subtraindo a habitação acessível. Se necessário, adquirindo-os para o município”, admitiu.
O programa que foi coordenado por André Moz Caldas — o socialista que é também o candidato pela coligação à Assembleia Municipal — traz à cabeça a habitação e a promessa de ter construídos até ao final do mandato (2029) 4.500 novos fogos municipais. Quando avançou com esta candidatura, em março, a socialista tinha-se comprometido a ter no, total de dois mandatos, “mais do que os 7 mil fogos previstos pelo atual executivo”. O objetivo proposto para quatro anos fica a meio caminho dessa meta para oito anos. As medidas destinam-se sobretudo a conseguir “dar resposta também às famílias de classe média”, define o programa.
Além disso, Leitão propõe também aumentar o número de bairros municipais recuperados, passando dos atuais 9 mil para 11.500 fogos, onde se compromete a intervir ao nível da “manutenção de elevadores, eficiência energética e equipamentos de proximidade”.
A habitação é classificada pela candidatura como “o eixo 1” e é aquele onde a lista de promessas é mais extensa, passando pela criação de um Fundo Municipal de Reabilitação financiado pelo IMI agravado a proprietários de casas e de terrenos abandonados — e aqui propõe “concluir o levantamento exaustivo” de casos e até o exercício do “direito de preferência municipal” para “imóveis críticos para projetos de rendas acessívei”.
Para conseguir acelerar o plano que propõe na área da habitação, a socialista conta essencialmente com os privados e, por isso, pretende promover incentivos, nomeadamente uma “redução significativa das taxas e impostos municipais” para projetos de habitação com custo ou rendas acessíveis ou ainda uma “majoração na edificação” para projetos com pelo menos 25% da nova construção ou reabilitação para arrendamento acessível. E também o apoio a “cooperativas de habitação”, através de concursos para terrenos públicos e também “financiamento acessível”, com o objetivo a ter entre 80 e 100 fogos neste modelo. Além disso, a socialista defende ainda a “promoção de construção modular e industrializada, para encurtar prazos e reduzir custos” na construção de habitação na cidade.
Outra das medidas para esta área é a proibição de novos Alojamentos Locais em edifícios residenciais, o que acaba também por ligar com outra das prioridades da candidatura que junta PS, BE, Livre e PAN: a contenção do turismo na cidade. Neste ponto, o programa de Alexandra Leitão prevê “limitar usos turísticos em zonas saturadas e impor moratórias a novos hóteis” — suspensões temporárias de licenciamento, aprovação ou construção de novas unidades. Há já freguesias que identifica como pontos onde o controlo tem de ser apertado, nomeadamente no AL: “Vamos restringir o alojamento local, reforçar a fiscalização e dialogar com o Governo para recuperar instrumentos legais que permitam controlar o alojamento local em freguesias como, essencialmente, Santa Maria Maior ou Misericórdia”.
Na apresentação tocou neste ponto ao dizer que não pretende “diabolizar” o turismo, “mas não se pode esmagar o direito à habitação e outros direitos da cidade. O próprio PDM será um documento essencial nesse sentido. Desde 2012, data do PDM que vigora ainda, a cidade mudou drasticamente”, disse apontando também a revisão deste instrumentos legal para planear e gerir o território.
Defende um PDM que dê “prioridade à habitação acessível, bairros inclusivos, quarteirões com escala humana, mais espaço verde e medidas de adaptação climática”. E inclui também um “sistema de mobilidade articulado à escala urbana”, onde o maior destaque é a já conhecida ambição de um “Passe Navegante gratuito para todos os residentes” seja para autocarros, elétricos, comboios, metropolitano ou elevadores e também a “diminuição do tarifário” para quem se desloca entre concelhos. “Moedas falhou e deixou Lisboa refém do automóvel”, disse quando falou no tema da mobilidade.
Também prevê o alargamento da oferta da Carris, seja nos horários, seja na frequência dos autocarros ou na criação de mais corredores Bus. Neste capítulo também inclui a promessa de “um programa de modernização e de reforço da segurança do funcionamento dos ascensores/funiculares” e ainda o “reforço e eventual reinternalização da manutenção da frota e equipamentos da Carris”, medidas que entraram na agenda depois do acidente no elevador da Glória.
Há outra área sensível onde a coligação que junta PS, BE, Livre e PAN tem medidas concretas. Ainda que a candidata já tenha criticado, no passado, respostas à “perceção de insegurança” quando não há sinais nesse sentido em Lisboa, o tema é abordado no seu programa onde prevê “reforçar o policiamento de proximidade e expandir a Polícia Municipal” e também “reforçar e modernizar a iluminação pública e instalar câmaras em zonas críticas”.
Entre os parceiros de coligação do PS nesta frente de esquerda sem o PCP, os comunistas acabaram por estar nas entrelinhas quando os representantes de BE e Livre apontaram a coligação “Viver Lisboa” como a única alternativa a Moedas, em linha com o que Leitão havia de fazer logo de seguida.
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