Sonho prematuro. A (curta) vida de Yu Zidi dava um filme, ao nível de uma epopeia parecida com os melhores feitos literários e cinematográficos. Nasceu na China, tem 12 anos e, esta semana, está a dar-se a conhecer num dos maiores palcos globais da natação. Numa altura que devia de ser de brincadeira, convívio e de foco na escola, Zidi encontra-se a ombrear com as maiores nadadoras do mundo, numa modalidade que tende a ser precoce, tanto no surgimento, como na “reforma”, como demonstram os exemplos de Katie Ledecky (campeã olímpica aos 15 anos), Kyko Iwasaki (ouro olímpico aos 14) ou Summer McIntosh (ouro nos Mundiais aos 15). Certo é que, para já, Yu Zidi é a segunda nadadora mais jovem a participar no Campeonato do Mundo de Desportos Aquáticos, depois de, em 2015, Alzain Tareq, do Bahrain, se ter estreado aos dez anos.
Na competição que decorre em Singapura, Zidi estreou-se nos 200 metros livres na madrugada de domingo e apurou-se para as meias-finais à tangente, passando como 15.ª e última apurada, com o tempo de 2.11,90 minutos. Na segunda de duas séries das semifinais, a chinesa voltou a surpreender, melhorou o seu tempo em mais de um segundo (2.10,22) e chegou à final com o sétimo melhor tempo que, ainda assim, atirou-a para uma das pistas externas, a número um. Ainda assim, Yu Zidi não se intimidou e terminou a prova no quarto lugar, com o tempo de 2.09,21 e ficou a apenas seis centésimos do bronze, de Mary-Sophie Harvey (2.09,15). Alex Walsh (2.08,58) ficou com a prata e McIntosh (2.06,69) com o ouro. Um dos dados que saltou à vista da final foi que, a 50 metros do fim, a chinesa ocupava o penúltimo lugar, galgando três posições com um final de sonho no estilo livre, em que foi a segunda mais rápida, a apenas um centésimo de McIntosh.
Apesar de a prova ter sido dominada por uma das grande atrações destes Mundiais, parte dos holofotes incidiram na pista 1, onde uma criança de 12 anos tinha ficado à beira de conquistar uma medalha. Essa tentativa vai ficar anulada até aos 400 estilos e os 200 mariposa, as outras vertentes em que vai competir em Singapura. Para já, importa perceber que, a título de exemplo, o seu tempo na final seria suficiente para bater o recorde português, que pertence a Victoria Kaminskaya, que fez 2.13,87 em 2017, bem como o espanhol, que é da autoria de Mireia Belmonte (2.09,45). Nunca ninguém nadou tão rápido em tão tenra idade. Ainda assim, curiosamente, se a chinesa quebrar o recorde mundial júnior, o mesmo não vai ser homologado, dado que as regras da World Aquatics só o permitem a partir dos 14 anos.
Nascida a 16 de outubro de 2012, em Baoding, Yu Zidi teve o primeiro contacto com a natação aos seis anos, com o seu pai a levou a um parque aquático durante o verão. Ali foi observada por um treinador de natação, que a recomendou a nadar de forma competitiva. Aos nove anos mudou-se para Hengshui, ingressando no Hebei Taihua Jinye Swimming Club, um dos mais conceituados do país e onde permanece até aos dias de hoje. Com apenas dez anos já fazia parte da equipa de absolutos e, em 2024, começou a figurar nos rankings nacionais. Aos 11 anos, Yu competiu nos 400 estilos na tentativa de chegar aos Jogos Olímpicos de Paris. Contudo, falhou a qualificação por dois segundos, rubricando o tempo de 4.40,97 minutos. A sua treinadora é Li Bingjie, campeã olímpica em Tóquio, que diz ser o seu ídolo e uma espécie de “irmã mais velha”.
China’s Yu Zidi just made her first world championships final at 12 YEARS OLD! ???? #AQUASingapore25 pic.twitter.com/zPtkggtzRK
— NBC Olympics & Paralympics (@NBCOlympics) July 27, 2025
Diz quem entende que o fenómeno Yu Zidi se deve às suas valência antropomórficas, que lhe permitem nadar tão bem todos os estilos e com pouco treino. “O seu movimento subaquático e o seu movimento de pernas é muito bom. Alinha muito bem o corpo. Leva as costas para o fundo da piscina e depois volta a subir, o que reduz o impacto na água. A sua frequência de nado é muito elevada. Aguentar esta frequência nos 200 é exigente. Ela fez muito cardio. O seu bom alinhamento permite manter a velocidade conseguida na patada e na braçada”, explicou Andreu Roig, biomecânico do Centro de Alto Rendimento Desportivo de Sant Cugat del Vallès, em Barcelona.
Desta forma, Yu Zidi possui um movimento quase perfeito, avançando mais com menos e mais eficientes braçadas, como acontece com nomes como David Popovici ou Summer McIntosh. Segundo o New York Times, que recorreu a documentos do Instituto Provincial do Desporto de Hebei, a nadadora nada 15 quilómetros por dia e passa pelo menos duas horas por dia dentro de uma câmara de hipoxia, onde simula estar a dois mil metros de altitude. Fruto disso, a sua hemoglobina é superior à das mulheres, o seu nível de ácido lático é de 14,3 milimoles por litro e a sua recuperação é 40% mais rápida que a das mulheres adultas. “Nunca vi ninguém assim aos 12 anos. Será um pilar da China. Vai mudar o seu peso e a sua força, e as suas bases de apoio serão outras. Se o crescimento antropométrico não for acompanhado de um trabalho de força e agilidade, pode afetá-la. A mariposa e o crowl exigem uma coordenação especial”, alertou Michael Bohl, treinador da seleção chinesa.
12-year-old Yu Zidi just went 2:06.83 in the 200 butterfly at Chinese Nationals ????pic.twitter.com/kd1917E6Tu
— Kyle Sockwell (@kylesockwell) May 21, 2025
Como exemplo, Bohl lembrou Shiwen Ye que, nos Jogos Olímpicos de Londres, ganhou os 200 e os 400 estilos com 16 anos. Contudo, a partir daí, a chinesa não voltou a alcançar esse nível devido às mudanças que aconteceram no seu corpo. Em apenas um ano, Yu melhorou o seu tempo em cinco segundo e, nos últimos três, passou por 27 controlos antidoping. Para além disso, os estudos ósseos sugerem que venha a medir 1,81 metros, ao nível do portento físico de Katie Ledecky ou Kylie McKeown. Fora das piscinas, a atleta está no sexto ano da Escola Primária n.º 5 de Baoding e mantém o apoio académico durante os estágios. Para já, o seu objetivo passa por estar nos Jogos Olímpicos de Los Angeles, em 2028, onde poderá lutar por uma medalha, se mantiver a progressão anual de 1,5%.
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