Luis Miguel Militão, conhecido como “Monstro de Fortaleza”, deu duas entrevistas em dois dias em que contou como encomendou a morte dos seis industriais portugueses enterrados vivos no Brasil em 2001. Condenado a 150 anos de prisão pelo assassinato dos seis homens em Fortaleza, Militão falou sobre o crime ao Correio da Manhã e à CNN Portugal 24 anos depois, negando estar presente no momento, mas admitindo ter dado a ordem para matar “por medo” de que o roubo do dinheiro viesse a ser descoberto e assim ele e os cúmplices serem presos.
Os contornos do crime cunhado “A chacina dos portugueses” chocaram Portugal e o Brasil: os seis homens foram sepultados vivos, tendo morrido por asfixia mecânica, tendo engolido e respirado areia, tendo sido colocado cimento por cima do local onde foram enterrados. Os seis portugueses foram atraídos para Fortaleza, no Brasil, pelo conterrâneo Luís Miguel Militão. O plano passava por roubo e extorsão: os empresários foram sequestrados, espancados e acabaram por ser enterrados vivos na cozinha de um bar na Praia do Futuro.
Numa saída precária da cadeia de uma semana com pulseira eletrónica, Militão admitiu ter dado a ordem por telefone para matar e enterrar as pessoas, algo que considerou ser “o seu maior erro” na entrevista à CNN Portugal, onde negou ter atraído os seis portugueses para os matar ou para fazer “turismo sexual”.
“Convidei apenas uma pessoa, de forma informal, para que pudesse vir nas férias usufruir das belezas do Nordeste brasileiro”, afirmou o homem.
“Tinha saído há uma semana de Portugal quando um dos portugueses me ligou, ou eu liguei para ele e, numa conversa informal e tranquila, eu disse que estava com algumas raparigas aqui no Brasil e que se um dia ele quisesse vir, viesse”, continuou, negando haver qualquer “motivação criminosa”.
Foi no Brasil que conheceu os seus cúmplices, que diz o terem induzido a fazer mal às pessoas que iriam de férias, que passaram de três para seis homens — com quem diz ter tido poucos vínculos.
“Quando me induziram ao cometimento do crime, eu disse ‘cara, eu não tenho coragem de matar ninguém’. E eles disseram-me ‘Ah, eu tenho’”, continuou, sem especificar nomes pois, diz, “são seres humanos que se arrependeram”.
No dia, Militão nega ter visto ou ter estado lá, afirmando que “fisicamente”, não matou ninguém. “Todos [os portugueses] foram sequestrados, inclusive eu, como uma forma de fazer pensar que eu não estava envolvido no crime, para que facilitasse o fornecimento das senhas de cartões de crédito” dos homens que tinham ficado reféns.
“Com esse fornecimento [das senhas], saí da barraca e não participei, eu não vi, eu não sei como é que foi a não ser pela imprensa”, continuou.
Luis Miguel Militão revelou ainda que o que tinha combinado com os seus cúmplices era a morte dos seis portugueses, encontrados enterrados debaixo da cozinha do Vela Latina, com cimento por cima.
Naquele momento, lembrou, todos os homicidas estavam “com medo e embriagados”. “Sem beber não teríamos essa coragem”, continuou. Foi nesse momento que o condenado foi questionado se iam “mesmo” fazer “aquilo que estava combinado” — “a morte”, não “por crueldade”, mas “por medo”, porque “as pessoas tinham medo de ser descobertas [do roubo e sequestro] e de ser presas”.
O que foi pensado foi que “essas pessoas precisariam de desaparecer para que não fosse descoberto o crime”. Foi aí que Luis Miguel Militão conta ter sido contactado por telemóvel pelos seus cúmplices. Foi nesse momento que cometeu o que diz ser “o seu grande erro”: dar a ordem “indireta”.
“Claro que é ser muito estúpido, ou ser doente, ou estar bêbado, ou ser ingénuo e abraçar a ideia dos outros; ou ter neuroses e psicoses, enfim, nada mais há a fazer a não ser sofrer”, disse ao Correio da Manhã.
Ao mesmo jornal afirmou-se arrependido e adiantou ter pedido desculpa aos familiares das vítimas — António Correia Rodrigues; Vitor Manuel Martins; Joaquim Silva Mendes; Manuel Joaquim Barros; Joaquim Fernandes Martins; Joaquim Manuel Pestana da Costa: “Ninguém me desculpa, nem eu mesmo”.
Condenado a 150 anos de prisão, Militão só tem de cumprir 30 anos, limite máximo imposto pela lei brasileira. Já cumpriu 24 anos, e apesar de ter tentado fugir três vezes, pediu em várias ocasiões a liberdade ao tribunal.
Foram apresentados pelo menos sete pedidos de habeas corpus ao Tribunal de Justiça do Ceará — a maioria feitos pela sua mulher — alegando que, devido ao tempo de trabalho e estudo cumprido em reclusão, já ultrapassou o limite previsto pela lei brasileira para pena máxima efetiva, apelando à “remição da pena” (figura legal que permite a redução do tempo de reclusão conforme determinadas atividades).
No entanto, todos esses pedidos, incluindo dois analisados pelo Superior Tribunal de Justiça, foram rejeitados. O tribunal entende que o abatimento de pena pelo trabalho e estudo deve incidir sobre o total da condenação (150 anos), e não sobre o teto de 30 anos previsto pela lei. Assim, a previsão oficial da data de libertação de Militão está marcada para 6 de dezembro de 2031.