O edição 2025 do programa CaixaImpulse Inovação em Saúde, lançado pela Fundação «la Caixa», em parceria com a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e colaboração do BPI, financiou sete projetos de investigação biomédica em Portugal com 50 mil euros cada, sendo um deles do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S) e outro do INEGI – Instituto de Ciência e Inovação em Engenharia Mecânica e Engenharia Industrial, igualmente sediado na U.Porto.

Uma nova terapia para tratar a dor lombar

Liderado pela investigadora Joana Caldeira, do grupo «Biofabrication» do i3S, o projeto distinguido pretende desenvolver uma terapia inovadora para tratar a dor lombar, uma condição que afeta milhões de pessoas em todo o mundo e é frequentemente tratada de forma insuficiente e invasiva pelas terapias atuais, que não oferecem soluções a longo prazo para muitos doentes.

Inspirada no potencial regenerativo dos ambientes fetais, explica Joana Caldeira, “o objetivo deste projeto é desenvolver um material seguro e padronizado que se apresente como uma solução fiável e duradoura para doentes com dores lombares crónicas e substitua as cirurgias”.

Desenvolvida como uma solução injetável, esta terapia, continua a investigadora, “recria condições que favorecem a regeneração natural e utiliza materiais personalizados para estimular o rejuvenescimento renovação dos tecidos, com o objetivo de aliviar a dor e restaurar a funcionalidade do disco intervertebral. Ao mesmo tempo, reduzirá de forma significativa o tempo de intervenção e os dias de internamento”.

Joana Caldeira dedica-se, há mais de uma década, a desenvolver terapias para a regeneração do disco intervertebral e para a dor lombar. (Foto: i3S)

Ao substituir “procedimentos invasivos por uma alternativa escalável, mais segura e eficaz”, este projeto abre caminho para um envelhecimento mais saudável e ativo, podendo no futuro oferecer uma nova esperança para milhões de pessoas que sofrem de dor lombar crónica e representando um avanço significativo nos cuidados de saúde. O projeto, garante ainda Joana Caldeira, “inclui testes rigorosos em modelos animais, de forma a garantir a segurança e a eficácia, criando uma base sólida para futuros ensaios clínicos”.

Para além do tratamento da dor lombar, esta abordagem, assegura a investigadora do i3S, revela “potencial para a regeneração de outros tecidos, como cartilagem, pele, córnea, pulmão e coração, o que poderá permitir uma aplicação mais abrangente em diferentes áreas da medicina regenerativa, levando soluções de saúde avançadas a um maior número de pessoas”.

A equipa liderada por Joana Caldeira integra também os investigadores Raquel Gonçalves (i3S e ICBAS), Mário Barbosa (i3S e ICBAS), Catarina Milheiro (i3S e ICBAS), Leonor Moura (i3S), Irina Amorim (i3S e ICBAS), Hugo Prazeres (i3S) e o neurocirurgião Paulo Pereira.

Uma nova esperança contra o prolapso dos órgãos pélvicos

Entre os vencedores do programa  CaixaImpulse Inovação em Saúde 2025 destaca-se também o DrugEluMesh  um projeto liderado por Elisabete Silva, investigadora do INEGI, e que consiste no desenvolvimento de um implante inovador para o tratamento do prolapso dos órgãos pélvicos (POP).

Na prática, trata-se de “uma malha/implante biodegradável em policaprolactona (PCL), fabricada por impressão 3D avançada (Melt Electrowriting), com design auxético para maior adaptação ao corpo. Esta malha incorpora ainda fármacos (antibióticos e anti-inflamatórios) que são libertados de forma controlada, prevenindo infeções e inflamações após a cirurgia”, explica a também docente da Faculdade de Engenharia da U.Porto (FEUP).

O prolapso de órgãos pélvicos (POP) é uma condição comum que afeta muitas mulheres ao longo da vida e que compromete fortemente a qualidade de vida, muitas vezes exigindo cirurgia. “As malhas de polipropileno tradicionalmente utilizadas nestes tratamentos revelaram elevadas complicações — como dor, infeção e erosão — o que levou à sua proibição pela FDA para uso transvaginal. Existe, portanto, uma necessidade urgente de alternativas inovadoras mais seguras, eficazes e personalizadas”, aponta Elisabete Silva.

Elisabete Silva tem-se destacado pelo seu trabalho de investigação na área da Biomecânica da Saúde da Mulher. (Foto: INEGI)

É neste contexto que a equipa liderada pela professora e investigadora da U.Porto – e da qual também fazem parte os docentes e investigadores António Augusto Fernandes (FEUP/INEGI) e Sofia Oliveira da Costa (FMUP) — se propõe a “criar um malha/implante biodegradável que se adapte melhor ao tecido pélvico”. São igualmente objetivos do projeto “integrar um sistema de libertação de fármacos que reduza infeções e inflamações”, “demonstrar a biocompatibilidade e segurança do implante” e, por fim, “validar a sua eficácia como solução de prova de conceito para futuras fases pré-clínicas e clínicas”.

Em caso de sucesso, espera-se que este projeto ajude a “reduzir as complicações cirúrgicas, melhorar a recuperação das mulheres com POP e contribuir para sistemas de saúde mais sustentáveis, diminuindo os custos associados a reoperações e infeções”. Por outro lado, “o impacto será também social, ajudando a combater o estigma da doença e a devolver qualidade de vida e bem-estar às pacientes”.

Quase 3 milhões para apoiar a melhor investigação biomédica

Este ano, a Fundação ”la Caixa” recebeu 428 candidaturas no âmbito do programa CaixaImpulse, tendo selecionado um total de 31 projetos biomédicos provenientes de centros de investigação, hospitais e universidades de Espanha e Portugal, que serão financiados com 3,8 milhões de euros.

O programa CaixaImpulse apoia projetos biomédicos na área da inovação e da transferência de conhecimento, ajudando os investigadores a validar os seus ativos e a definir a estratégia de exploração e valorização, com vista a aproximar os resultados da investigação do mercado. Para além do apoio financeiro, os projetos beneficiam de mentoria, consultoria e orientação por parte de especialistas internacionais de várias áreas do ecossistema de inovação.

A Fundação ”la Caixa” lançou este programa de apoio à inovação e à transferência de conhecimento em biomedicina e saúde em 2015. Desde então, a organização já atribuiu 28,8 milhões de euros para apoiar 263 projetos, que deram origem à criação de 54 spin-offs. Estas, por sua vez, conseguiram angariar mais de 180 milhões de euros adicionais através de outras convocatórias competitivas ou de investidores privados.

Sobre Joana Caldeira e Elisabete Silva

Licenciada em Microbiologia pela Escola Superior de Biotecnologia da Universidade Católica, no Porto, Joana Caldeira iniciou a sua carreira científica em 2005 com o desenvolvimento de um projeto com o Hospital de S. João  para estudar as bases moleculares da modulação de enzimas de leveduras. Foi depois para Sevilha (CABD), onde iniciou o seu doutoramento em Biomedicina em colaboração com o Ipatimup, sob a supervisão dos investigadores Raquel Seruca e Fernando Casares.

Durante o pós-doutoramento, dedicou-se ao estudo da modulação da matriz extracelular no cancro e na regeneração e quando se juntou ao INEB (atualmente integrado no i3S, juntamente com o Ipatimup e com o IBMC), em 2012, começou a interessar-se pelo estudo do disco intervertebral.

Desde que começou a desenvolver terapias para a regeneração do disco intervertebral e para a dor lombar, Joana Caldeira tem vindo a acumular prémios e distinções: foi premiada pela Eurospine – Sociedade Europeia da Coluna (2018), e pela Orthopaedic Research Society (ORS) conquistou uma Medalha de Honra L’Oréal Portugal para as Mulheres na Ciência (2018), integra uma equipa de investigadores que criou a startup Fetalix, conquistou um dos prémios do programa “EIT Jumpstarter 2020”, do European Institute of Technology (EIT), venceu o Amyris Innovation BIG Impact Award 2021 e recebeu financiamento da Comissão Europeia no âmbito do programa «Women TechEU» (2023), da AOSpine, ON Foundation e da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).

Elisabete Silva, por sua vez, é doutorada em Engenharia Biomédica pela FEUP e desenvolve, desde 2011, a sua atividade científica no INEGI enquanto investigadora na área da Biomecânica da Saúde da Mulher. O seu trabalho incide na otimização das propriedades in vivo dos tecidos moles, no desenvolvimento de soluções inovadoras através de fabrico aditivo, e na simulação de procedimentos médicos e cirúrgicos.

Autora e coautora de aproximadamente 40 artigos científicos em revistas internacionais de referência e de mais de 100 comunicações em conferências nacionais e internacionais, integra várias sociedades científicas nacionais e internacionais, Foi ainda responsável pela orientação de mais de 20 dissertações de mestrado, estando atualmente a orientar quatro teses de doutoramento.

Em 2018 foi distinguida com uma bolsa de Urodinâmica pela ICS/Laborie para investigação nos EUA e, em 2024, recebeu o prémio Biomedical Division Duncan Dowson Prize 2023 pela Institution of Mechanical Engineers.