Há fórmulas que não mudam, antes intensificam-se, em especial num contexto em que ser, estar e comprar de forma diferenciada é cada vez mais difícil — mas provavelmente também mais urgente. Uma década depois da estreia, o universo The Feeting Room projeta-se como “um destino de experiências para quem quer fugir à massificação”, descreve Guilherme Pinto de Oliveira, uma das metades à frente da concept store natural do Porto. Com Edgar Ferreira, acrescenta uma morada ao portfolio de lojas onde o que se leva realmente no saco das compras é um estilo de vida completo, mais do que peças soltas com assinatura de designers independentes. Depois do Chiado, onde abriram portas há três anos, estrearam-se na Lx Factory em modo soft opening no passado dia 15 de agosto. Às 18h do dia 18 de setembro, o evento oficial de inauguração. Para este arranque, apresentam duas peças especiais com o selo da sua marca própria, a Coup d’Etat, lançada em maio, uma t’shirt e um lenço. Fazemos o balanço com os fundadores e antecipamos os próximos passos, com mais aberturas no horizonte.
Como e quando emergiu a ideia de chegarem à Lx Factory?
Guilherme Pinto de Oliveira (GPO) – Fizemos agora dez anos no Porto, a primeira Feeting Room foi no largo dos Loios, passado três anos abrimos no Chiado, em Lisboa. Sempre tivemos muita atenção à Lx Factory; uma vez que 70% dos nossos clientes são turistas teria toda a lógica estar onde ele estão. O problema é que a Lx Factory estava sempre muito à prazo, e quando fechamos um conceito gostamos de fazer uma intervenção forte, trazer o nosso ADN. Não teria lógica vir para aqui para sair passado pouco tempo depois. Em maio deste ano tive a informação de que o plano era manter o conceito com lojas, com foco no retalho independente, que estão neste processo de trazer melhores projetos para a Lx, portanto decidimos que era altura de nos estabelecermos.
O que funcionava neste espaço?
GPO – Por cima era uma tipografia. Acho que há muitos anos era uma empresa de fios, mas neste sítio ainda se vê a máquina gigante por cima, e daí ter tantas colunas no espaço. Entrando no conceito da loja, temos aqui uma peça central. Estamos muito ligados à indústria do calçado, a São João da Madeira, e como esta é uma zona industrial decidimos trazer este carregador, que está nas fábricas para transportar calçado, é uma peça rotativa que leva o calçado entre os diferentes postos do processo produtivo. Esta é a peça principal da loja. Tentamos que todos os espaços sejam diferentes mas complementar com a envolvência.
DIOGO VENTURA/OBSERVADOR
(O sócio Edgar Ferreira entra pela janela enquanto conversamos no interior da loja)
GPO – É o nosso ninja.
Edgar Ferreira (EF) – É a verdadeira concept store (ri-se)
É um bom gancho para continuarmos: como imaginam este conceito de loja passados 10 anos? Ainda esta semana surgiu a notícia do regresso temporário da mítica Colette, em Paris.
GPO – Vai fazer uma pop up. Era uma das nossas grandes referências quando abrimos, e fechou portas anos depois de abrirmos. Ficámos assim… como é que é possível? Sempre quisemos duas coisas. A nível de oferta, trabalhamos com aquilo a que chamamos a next big thing. Gostamos que venham cá e que os clientes descubram as marcas. Formamos os nossos assistentes de vendas para que conheçam bem as marcas e consigam vender a história do produto. É como uma caça ao tesouro. Segundo, é um conceito vocacionado para a experiência. Em todas as nossas lojas temos espaços de estar, cafés de especialidade, na LOT temos restaurante e cocktail bar.
A LOT, ou Labels of Tomorrow, que é outro projeto vosso, num outro segmento.
GPO – Já é uma evolução da Feeting Room, com um price point um pouco mais alto e marcas diferentes. Mas continuamos muito com aquelas duas vertentes, e para aqui também queremos trazer um café. É importante para o espaço se manter vivo e para as pessoas passarem mais tempo na loja. Gostamos de fazer eventos, convidar dj’s, no fundo somos uma curadoria.
DIOGO VENTURA/OBSERVADOR
O calçado esteve na génese do projeto original de Edgar e Guilherme. No centro da loja, a estrutura/prateleiras em tom verde claro reproduz o sistema de transporte industrial
De um certo estilo de vida, conseguir tocar em diferentes áreas.
GPO – Sim, de estilo de vida e independente.
EF – No fundo coisas que as pessoas não conhecem. A nossa perceção sobre o retalho nos últimos anos é de que tem uma parte funcional e outra experiência. A primeira é simples e é muitas vezes apenas o esforço que se faz para se ter uma peça que se deseja, e nós queremos tocar um pouco mais na parte experiencial do retalho. É aí que está a diferenciação. Queremos que seja um espaço de descoberta e transversal a cada área, pode passar pala reputação, ilustração. Procuramos talento independente onde quer que esteja. Que as pessoas possam vir e perder mais tempo a descobrir um disco ou uma marca de calçado.
Imagino que há dez anos implicava muito mais um trabalho de partir pedra do que hoje.
GPO – Uma coisa é ter uma multimarca em que as pessoas se deslocam pelo poder das marcas que lá estão, no começo tivemos que criar tração de outra forma. A pessoa tem que confiar em nós.
DIOGO VENTURA/OBSERVADOR
As sandálias coloridas Maria Carlota são uma das entradas recentes no portfólio de marcas
Pretendem que a grande marca seja a Feeting Room, o coletivo?
EF – A marca é a Feeting Room e [o cliente] tem que confiar, uma, duas, três vezes, que se torna entretanto um símbolo de confiança, se cumprirmos com as nossas promessas.
Por outro lado, que outros desafios se colocam hoje?
GPO – Obriga-nos a estar sempre a melhorar a nossa curadoria de marcas para trazer sempre novidades. Se vendemos novo talento é importante conseguir fazer esta renovação de marcas que aportem. No online é muito mais difícil fazer isso e sobressair, é mais concorrencial.
A experiência que propõem sempre foi muito física. Isso é para manter?
EF – Claro, no online a pessoa não está na loja, não pode tocar.
GPO – Tentamos reproduzir um pouco dessa magia, com hidden gems na cidade, blog posts, anunciar concertos. Mas obviamente acaba por ser muito desafiante. O que acho é que as pessoas procuram diferenciação e nós fomos privilegiados por duas coisas. Primeiro, o hype de Portugal, temos o melhor do que se faz cá e fora. E as pessoas procuram ter algo diferente, vivemos tempos em que se tenta fugir à massificação.