O futuro da Europa exige coragem e visão, mas sobretudo vontade política para quebrar bloqueios históricos. Manter a regra da unanimidade é perpetuar impasses que penalizam pessoas e empresas. É urgente avançar para o federalismo, integrar políticas e ceder soberania real. Só assim a União Europeia (UE) atuará como potência global à altura das múltiplas crises que vieram para ficar.
O resultado do atual pântano institucional ficou bem demonstrado com o arrastar do acordo assinado com os países do Mercosul: foram precisos mais de 20 anos de negociações, a Europa sempre refém do veto egoísta e birrento de um ou de múltiplos estados-membro obcecados com o incalculável valor da sua vaquinha ou porco de estimação.
Salta à vista que o consenso absoluto não é um exercício democrático – é paralisia política e nivelamento por baixo. É o mais fácil, que torna tudo difícil. Num mundo marcado pela trágica incerteza, a única solução para a UE é passar a decidir por maioria qualificada, seguindo o exemplo das federações mais eficazes e inteligentes. É verdade: há bons exemplos, basta seguir um deles. Até o suposto mercado único continua muito longe da promessa que anunciou. Não o é para várias profissões, encurraladas no seu canto territorial; não o é no setor financeiro, etc., etc. As contas estão feitas pelo FMI: as barreiras internas equivalem a tarifas de 45% nos bens e 110% nos serviços.
Andamos muito distraídos, mas temos um mega-Trump, o mercador das tarifas, dentro da UE, prepotente e pouco dado à razão. É também fundamental criar um regulador europeu único (por setor) e combater o nacionalismo económico autóctone. Todos querem ter os seus campeões nacionais de estimação, apesar do alto preço a pagar pelos consumidores e pelas economias. Uma Europa a várias velocidades é, portanto, a estratégia certa e não mera fragmentação — só quem quiser vai mais longe, colhendo os benefícios de escala, acesso ao mercado e mais envelopes financeiros; talvez assim os outros, os que beijam e, simultaneamente, empobrecem a própria bandeira, entendam que o orgulhosamente sós é como cometer incesto com o próprio ego. Num contexto globalizado e militarizado, depender da NATO e dos EUA também já não chega — é preciso um exército europeu, com comando integrado e estratégia unificada.
Estamos à espera que o urso russo se espreguice pela Europa quando e como quer? Só partilhando soberania haverá segurança e autonomia política. Mais federalismo significa escala, clareza nas decisões e crescimento, libertando a Europa da armadilha dos limitados interesses nacionais. Quarenta anos (em 2026) depois da adesão de Portugal à CEE, a UE tem de mudar de vida e depressa. Quem nasceu para lagartixa não chega a jacaré – esses irredutíveis que fiquem para trás.