Em Portugal, os carros menos poluentes pagam mais ISV. Exceptuando os veículos elétricos, a ordem é: tributar, tributar, tributar.
Não é a primeira vez que destacamos os anacronismos da fiscalidade automóvel portuguesa. Se outrora os motores de maior cilindrada eram sinónimo de emissões de CO2 mais elevadas, hoje o cenário inverteu-se, sobretudo com os motores híbridos — explicamos todos os detalhes neste artigo.
Porém, o ISV (Imposto sobre veículos) continua preso ao passado. É verdade que a fórmula de cálculo do ISV, alterada pela última vez em 2007, inclui uma componente de emissões, mas a cilindrada continua a ser responsável pela maior fatia do imposto.
Entretanto, passaram quase 20 anos e nenhum governo teve coragem para, das duas uma: ou extinguir o imposto — era o que estava previsto — ou atualizar a fórmula de cálculo do ISV. O resultado prático é um imposto que faz o pleno: penaliza a carteira dos portugueses e penaliza o ambiente. Pior era difícil.
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Por isso, vamos dar o exemplo de três modelos que chegam brevemente ao mercado português e que ilustram o absurdo: Renault Clio, Hyundai i20 e Toyota Aygo X. Em comum, têm o facto de ser as versões mais limpas e também as que pagam mais ISV. Mas a lista podia continuar.
Renault Clio E-Tech Full Hybrid 2026
Durante mais de 20 anos, o Renault Clio foi o modelo mais vendido em Portugal. Uma posição que a nova geração do utilitário francês, que chega ao mercado no início do próximo ano, tem ambição de recuperar. Argumentos não lhe faltam: design revisto, mais tecnologia e novos motores.

O motor térmico do sistema híbrido cresceu para 1,8 litros de capacidade e, apesar de emitir menos 25 g/km de CO₂ que a versão a gasolina, pagará 14 vezes mais ISV. Fizemos uma estimativa, com base em valores provisórios:
Nota: os valores presentes nesta tabela são apenas uma estimativa.
Hyundai i20 da nova geração
Há uma corrida na Europa aos sistemas híbridos — até a Volkswagen já se rendeu às evidências. Uma corrida que começou nos segmentos mais elevados e que agora está a chegar aos segmentos mais acessíveis.
A Hyundai, que tem uma das gamas mais completas do mercado em termos de variedade tecnológica, vai estender essa variedade ao novo Hyundai i20. Um modelo que já apanhámos em testes.

Porém, tal como acontece com o Clio, a capacidade do motor da versão híbrida do Hyundai i20 será elevada. Prevê-se um motor de 1,6 litros associado a um motor elétrico, enquanto as versões convencionais vão recorrer ao já conhecido motor 1.0 com turbo.
Tal como o Clio, também o i20 vai ser vítima da fiscalidade portuguesa e pagar mais ISV, quando chegar ao mercado, em 2026.
Toyota Aygo X Hybrid é o novo rei dos consumos
A Toyota foi ainda mais longe do que a Hyundai. O novo Toyota Aygo X é o primeiro citadino do mercado com tecnologia híbrida. Faz sentido que assim seja. Recordamos que a Toyota foi a percursora da eletrificação do automóvel, quando lançou em 1997 a primeira geração do Prius.
Uma decisão que vai ter uma consequência direta no preço deste pequeno citadino japonês. Estima-se que o recurso a esta tecnologia represente um aumento de 1500 euros no preço base do Aygo X. Mas a «fatia de leão» vai para o Estado: o Aygo X Hybrid deverá pagar mais de 2000 euros de ISV.
As contas são relativamente simples. Quando chegar ao mercado, no início do próximo ano, o Aygo X Hybrid deverá custar cerca de 22 mil euros em Portugal. Ou seja, ficará no mesmo patamar de preço do seu irmão maior: o Toyota Yaris Hybrid.
Um falhanço que urge ser corrigido
É um falhanço do sistema fiscal português em toda a linha. Se o ISV fosse verdadeiramente um imposto pigouviano — criado para corrigir uma externalidade negativa, a poluição — desincentivaria a compra de carros mais poluentes. Mas faz precisamente o contrário.
Perante a necessidade de medidas de combate às emissões de CO₂ e ao aquecimento global, a resposta do Estado português é um imposto que afasta os consumidores de soluções mais amigas do ambiente. Faz sentido? Naturalmente que não.
Em Portugal, parece que a única tecnologia merecedora de incentivos fiscais são os veículos elétricos. Em todas as outras o princípio é o mesmo: tributar, tributar, tributar. A discussão sobre o Orçamento do Estado 2026 começa brevemente, mas ficaria surpreendido se existissem novidades a este respeito.