Neste domingo houve, como tem havido nos últimos oito anos, influência clara de John McGinn num triunfo do Aston Villa – marcou no 3-1 ao Fulham. Este médio escocês de 30 anos, que marcou também a meio da semana na Liga Europa, é dos jogadores mais incomuns do futebol europeu e mostra que o protótipo do corpo de futebolista pode ser contrariado.
Não há muitas formas elegantes de o dizer: McGinn tem um rabo bastante proeminente, sobretudo para um futebolista profissional. Um pouco à imagem de Eden Hazard, este escocês usa o poder da retaguarda e abraça-o sem vergonha.
“Acho que ninguém corre como eu e ninguém tem um rabo do tamanho do meu”, disse ao Telegraph. Conta até que já houve um treinador que lhe disse “não te vais safar com isso no futebol internacional” e que sente muita pressão para ter o corpo do futebolista “normal”. “Existe uma pressão para que todos os jogadores de futebol tenham corpos definidos. Eu sempre me senti confortável com o meu corpo”, disse.
Mas este detalhe anatómico influi no jogo deste médio? Influi – e não é pouco. McGinn é conhecido pela forma como protege a bola, usando o rabo proeminente para afastar os adversários – no fundo, é mestre a virar as costas, com um “escudo” de volume considerável.
O próprio já explicou que teve de aprender a usar esta característica e torná-la uma virtude. “No início da minha carreira, eu usava-o sempre que recebia a bola, mas não adiantava nada porque era muito óbvio”, apontou, explicando que olhou para Pogba e Hazard para tornar esse recurso mais eficaz e menos previsível: “Em espaços curtos, quando alguém se aproxima eu tento usar isso a meu favor e rodar (…) sou diferente de todos os médios da Premier League e isso tem-me ajudado na carreira”.
Há até uma história curiosa do dia em que McGinn enfrentou um ex-colega de equipa que conhecia esse truque. Esse jogador, num duelo com McGinn, limitou-se a chegar-se para trás e o escocês, que contava com o encosto do rabo no corpo do adversário, ficou sem apoio e caiu para trás – a gravidade fez o seu papel.
Serve isto para explicar que John McGinn usa uma virtude incomum e faz de uma proeminência uma vantagem. Mas não é só nisto que é uma peça rara.
McGinn foi alguém que esteve perto de perder a vida num treino, quando o espigão de uma estaca de treino penetrou na sua perna sete centímetros – esteve a um milímetro de atingir a artéria femoral.
Antes disto, já tinha sido alguém com dificuldades para convencer treinadores. Aos 17 anos, não teve lugar no St. Mirren ainda nas camadas jovens e diz que se lembra dessa época quando vai assistir aos primos mais novos a jogar. Olha para as crianças sentadas no banco dos suplentes e lembra-se do passado em que não era chamado ao terreno de jogo.
Depois de chegar à primeira equipa do St. Mirren e de participar na descida de divisão em 2015, chegou a estar sem clube, com bilhete comprado para Houston, para se aventurar na segunda divisão dos Estados Unidos.
Acabou por não precisar disso, com uma chamada do Hibernian, e foi aí que a carreira descolou: três boas temporadas e transferência para o Aston Villa em 2018, conquistando honra de capitão.
John McGinn é também um dos jogadores-chave da selecção escocesa, cujos adeptos têm um cântico. “Ele é o homem do Steve Clarke, é melhor do que o Zidane” – rima que funciona melhor em inglês.
Talvez estejamos a entrar na zona do exagero, mas McGinn pisa alguns terrenos comuns com o francês. Pode actuar como 6, como 8, como um jogador mais na posição 10 ou mesmo como ala – e já chegou a ajudar como lateral. Mas é, sobretudo, um box-to-box, com uma grande capacidade de trabalho, agressividade, intensidade e valências na chegada à área – aparece bem em zonas de definição e finalização. E finaliza bem: prova disso é que, apesar de ser um médio, já é o sexto melhor marcador da história da selecção escocesa – mesmo que não seja uma selecção que justifique louvores desmedidos por esta estatística.
Depois de anos de rejeições, lesões e gozo pela retaguarda saliente, hoje é capitão do Aston Villa, figura da selecção escocesa e dono de uma das silhuetas mais comentadas da Premier League. Já houve quem gozasse. Agora, olham de baixo para cima – ou de trás para a frente.