Nos seus livros, as relações e as traições entre casais estão muito presentes. O mais recente, o Outro, fala de um homem divorciado que se apaixona por uma mulher casada. Consegue imaginar que políticos, nacionais ou estrangeiros, podiam ser os três protagonistas?
Acharia muito divertido e bom para o mundo se a Melania Trump se apaixonasse pelo Putin e andasse durante uns tempos entre Nova Iorque e Moscovo.
No tempo dos Reis as infidelidades eram uma constante. Acha que mudou muito de então para cá?
O sigilo profissional impede-me de falar sobre os casais de Reis e Rainhas que fizeram terapia de casal… Mas são conhecidos alguns Presidentes da República que saltavam a cerca. Para mim o mais delicioso foi o Hollande que foi apanhado de moto a sair do Eliseu para levar croissants à namorada. Mas a Valerie vingou-se bem, se bem me lembro, posso estar enganado, disse que ele não prestava na cama.
Qual a razão para a maioria das suas histórias, no que diz respeito a ‘trios’, envolverem quase sempre dois homens e uma mulher?
Nunca tinha pensado nisso, não sei se estou de acordo, atualmente não há diferença entre histórias com dois homens ou duas mulheres. A maior diferença é que elas conseguem manter o segredo mais tempo.
Também já assumiu que há colegas psiquiatras ‘passados da cabeça’. Olhando para a vida política, nacional e estrangeira, quem acha que está mais ‘passado da cabeça’?
Passado da cabeça não sei, porque não os conheço. Mas muitos devem ter graves perturbações de falta de afeto e empatia pelos outros. Todos os ditadores ou os que gostavam de o ser provocam a morte de milhões de pessoas.
Disse, em tempos, que a Europa se vai afundar, não resistindo à globalização e à concorrência de países onde os direitos sociais são menores. Acha que o wokismo, e o contra-wokismo, também contribui para a queda da Europa?
Acho que contribui para as pessoas estarem fartas de conflitos, alguns justificáveis, outros apenas acusatórios e vingativos. Não creio que tenham grande importância na queda da Europa.
Com as desgraças do mundo, a guerra na Ucrânia e o conflito da Palestina, entre outras, tem mais vontade de ir para o Alentejo brincar com os seus 30 ou 40 comboios?
Infelizmente já não tenho a minha coleção de comboios. Ofereci-a ao Museu do Brinquedo de Ponte de Lima, em 2020, que aconselho vivamente a visitarem. Mas quando penso, nos meus 76 anos, no mundo que os meus filhos estão e vão viver, fico triste. Sou da geração que viveu o 25 de Abril, fiz parte do primeiro grupo de médicos que foram para a província, onde as pessoas não tinham qualquer assistência na saúde. Cada vez que penso em Portugal, tento não ser Velho do Restelo, porque sei que, apesar das dificuldades, as pessoas vivem melhor e a liberdade é muito importante.
Ou tem mais vontade de entrar no seu avião e fugir para um destino bem longínquo?
Se pudesse ter um jacto daria a volta ao mundo, num avião monomotor limito-me a ir tomar café dentro do país, ainda que já tenha ido a Paris, duas vezes, a Espanha várias e a Marrocos.
Qual destes três filmes, Uma Mente Brilhante, o Aviador e Voando Sobre um Ninho de Cucos, é o seu preferido? Porquê?
Claramente Voando Sobre um Ninho de Cucos. Quando comecei a minha vida profissional no Hospital Miguel Bombarda ainda existiam doentes, lá internados há 40 anos, sem necessidade, muitas vezes porque as famílias os recusavam e ainda não existiam residências protegidas. Felizmente agora já existem algumas. Mas se fosse eu a escolher filme prefiro o Out of Africa, amor, avião e África é, talvez, a melhor combinação de vida para mim.
Na juventude jogava bridge e ia ao cinema, ao Monumental. Ia ao Galeto, Ceuta e Namur, Gambrinus e Amazonas. O que sente quando passa por alguns desses lugares que já não existem?
Ainda jogo bridge, mas raramente. O Galeto e o Gambrinus ainda existem. Fui lá duas ou três vezes, tudo é igual, mas o meu contexto mudou, já não sabe ao mesmo. Os outros ficaram as recordações, porque vou muito pouco a Lisboa. Mas os amigos com quem lá ia, continuam a ser grandes amigos.
Viveu o Maio de 68. Acha que falta amor e sexo ao mundo atual?
Não vivi o Maio de 68, vivia num Portugal tacanho e isolado. O mais próximo para nós foi o 25 de Abril. Não consigo responder se falta amor e sexo, porque só vejo na clínica quem se queixa dessas faltas, os outros não sei se se queixam. Eu não me queixo…
O culto da transexualidade e dos não-binários enfraquece o mundo ocidental?
Não sei se há um culto, nem tenho experiência suficiente para falar das pessoas que se assumem como tal. Há muitos anos fui atacado por ter sido dos primeiros a defender o casamento entre homossexuais, pelo que de simbólico isso significava para eles. Mas são mundos muito diferentes, sobre os da pergunta não sei, mas acho exagerado dizer que enfraquecem o mundo ocidental.