Casa Tao / HW Studio - Fotografia de Exterior, Concreto© Hugo Tirso Domínguez

Casa Tao / HW Studio - Fotografia de Interiores, MadeiraCasa Tao / HW Studio - Fotografia de Exterior, ConcretoCasa Tao / HW Studio - Fotografia de Interiores, DormitórioCasa Tao / HW Studio - Imagem 5 de 37Casa Tao / HW Studio - Mais Imagens+ 32

Compartilhar

Compartilhar

Ou

https://www.archdaily.com.br/br/1034394/casa-tao-hw-studio
Casa Tao / HW Studio - Fotografia de Exterior, Concreto© Hugo Tirso Domínguez

Descrição enviada pela equipe de projeto. Algumas casas não se projetam: se relembram. A Casa Tao não nasceu do traço técnico, mas da memória silenciosa de quem a habita. É uma casa que não pretende responder a uma imagem, mas a uma vida. Ou melhor: a uma forma de viver.

Casa Tao / HW Studio - Fotografia de Interiores, Concreto© Hugo Tirso DomínguezCasa Tao / HW Studio - Imagem 7 de 37© Hugo Tirso Domínguez

Gustavo cresceu em uma família humilde. Filho de camponeses e comerciantes de artesanato, pessoas de mãos ásperas e olhar generoso que, embora seus estudos tenham sido interrompidos prematuramente, souberam semear nele o desejo de compreender o mundo. Cresceu em Puerto Vallarta, um lugar na costa do Pacífico mexicano, onde o sol e a umidade definem o ritmo dos dias e onde a sombra não é um acidente, mas um bem precioso, um verdadeiro refúgio. Desde o início, a casa deveria traduzir essa necessidade de amparo, de recolhimento e de frescor. A presença da sombra não foi entendida aqui apenas como um fenômeno físico, mas como uma condição emocional: uma promessa de calma, de respiração, de silenciosa proteção diante de um mundo estridente.

Casa Tao / HW Studio - Imagem 25 de 37Planta – Primeiro NívelCasa Tao / HW Studio - Imagem 26 de 37Planta – Segundo NívelCasa Tao / HW Studio - Imagem 27 de 37Planta – Terceiro Nível

Mas a personalidade de Gustavo — tão rica e complexa quanto o lugar de sua infância — foi o que marcou profundamente o projeto. Com uma curiosidade pouco comum, é um homem que fez do conhecimento autodidata seu caminho. Filosofia, arquitetura, música, fotografia: tenho a impressão de que pouco lhe é alheio. Sua biblioteca, com edições especiais de Alberto Campo Baeza, Fan Ho, Tarkovsky… revela um afeto pela clareza formal, pela geometria essencial, pelos pátios silenciosos que dialogam com o vazio e com a luz. Conversar com ele é mergulhar em um olhar aberto para o mundo, profundamente sensível e ao mesmo tempo preciso.

Casa Tao / HW Studio - Fotografia de Interiores, Madeira© César BelioCasa Tao / HW Studio - Fotografia de Interiores, Sala de Jantar, Madeira, Cadeira© César Belio

Sua história com Cynthia, a segunda habitante, é também parte essencial desta arquitetura. Junto com suas duas filhas; Mila e Anto, empreenderam sua primeira viagem fora do país, ao Japão. Aquela viagem deixou uma marca indelével em seu imaginário: a estética do vazio, a limpeza compositiva, a quietude contida em cada gesto arquitetônico. Nos disseram entre sorrisos: “Gostaríamos de viver dentro de um museu japonês.” Porém, não se referiam à solenidade do museu como instituição, mas sim, à esse tipo de espaço que desacelera o tempo, que a luz entra com cuidado, que o silêncio se torna tangível.

Casa Tao / HW Studio - Fotografia de Interiores, Dormitório, Concreto© Gustavo Quiroz

E assim tentamos. Em um bairro sem grandes vistas, exceto por uma praça arborizada que oferecia sombra e brisa, decidimos orientar a arquitetura para esse frescor. Mas não o fizemos de maneira frontal. Evitamos o uso de grandes superfícies envidraçadas que pudessem intensificar o calor. Em seu lugar, propusemos uma relação oblíqua, enviesada, que permite intuir a presença da praça sem se expor totalmente à pesada luz do sol. O habitar se emoldura de forma indireta, como se a casa observasse em diagonal, com modéstia, apenas deixando passar o vento e a fragrância que nos envia um mar não muito distante.

Casa Tao / HW Studio - Fotografia de Interiores, Armário, Madeira, Prateleira© Gustavo QuirozCasa Tao / HW Studio - Fotografia de Interiores, Escada© Gustavo Quiroz

Localizamos o programa mais amplo — quartos, garagem e serviços — na base, e sobre ele suspendemos uma caixa leve, de dupla altura, que abriga as áreas sociais. Essa estratégia permitiu elevar a vida comum do nível da rua, cercá-la de ar e abri-la para as árvores e o vento salino que atravessa a praça. Os pátios elevados funcionam como terraços de contemplação: pequenas plataformas de onde a fragrância das flores é respirada com maior intensidade e o murmúrio do vento entre as copas das árvores se torna companhia constante.

Casa Tao / HW Studio - Fotografia de Interiores, Concreto© Hugo Tirso DomínguezCasa Tao / HW Studio - Fotografia de Interiores, Concreto© Hugo Tirso Domínguez

Os quartos se organizam em torno de um pátio que busca silêncio e ventilação. Aqui, a intimidade se manifesta no fechamento, não como clausura, mas como um mundo interior. Uma parede curva recebe o visitante com suavidade, marcando um limiar acolhedor, enquanto uma árvore o saúda como se fosse um delicado arranjo floral. A casa não se abre para o bairro: se retrai, como quem busca recolhimento. Mas não se fecha; se abre para o céu, para a sombra, para a praça. Tudo está disposto para que o habitar transcorra de maneira mais lenta, mais plena, mais atenta ao invisível.

Casa Tao / HW Studio - Imagem 5 de 37© César Belio

A materialidade foi uma decisão inevitavelmente tátil e sensorial. A brancura ofusca sob o sol costeiro, enquanto o concreto — pesado, honesto — absorve a luz com delicadeza. É um concreto que se torna quente pelo uso e pelo tempo. Nesta matéria a luz não rebate, repousa.

Casa Tao / HW Studio - Imagem 34 de 37Fachada SudesteCasa Tao / HW Studio - Imagem 31 de 37Corte C

A Casa Tao é, em última instância, uma arquitetura nascida do desejo de habitar o mundo com maior atenção. Uma casa que se retira com discrição e oferece seus espaços como atmosferas de contemplação e memória. Nela, habitar se torna um exercício de estudo, de pausa, de gratidão. Cada canto convida a permanecer, não a transitar, e cada sombra se oferece como uma promessa de bem-estar.

Casa Tao / HW Studio - Fotografia de Exterior, Concreto© Hugo Tirso DomínguezCasa Tao / HW Studio - Imagem 11 de 37© Hugo Tirso Domínguez

Esta busca deliberada pela sombra, como refúgio e como qualidade poética, nos aproxima de uma compreensão do espaço semelhante à que Junichiro Tanizaki descreve em O elogio da sombra. Nele, Tanizaki não celebra a escuridão como ausência de luz, mas como um modo mais sutil de vê-la. Em seu texto, a sombra não é um obstáculo, mas um véu que dignifica; uma maneira de amplificar a profundidade das coisas, de permitir que a beleza emerja lentamente, com humildade. Assim também esta casa: não se ilumina de forma contundente, mas permite que a penumbra insinue, que a luz se filtre sem violência, que cada espaço seja uma experiência sensorial matizada, contida, na qual o tempo se alonga e a vida se aquieta.