“Foi um dia importante” para o Governo que marca o fim do “tempo de uma política irresponsável na imigração”. Após o chumbo do Tribunal Constitucional, a nova lei dos Estrangeiros foi esta terça-feira aprovada com votos a favor dos deputados do PSD, do CDS-PP, do Chega, da Iniciativa Liberal e do deputado único do Juntos Pelo Povo (JPP). PS, Livre, PCP, Bloco de Esquerda e PAN votaram contra.
A lei segue agora novamente para o Palácio de Belém. Apesar do voto contra, o PS viu ser aprovada uma proposta de alteração ao texto final, bem como o Chega que viu três aprovadas. Por sua vez, todas as propostas apresentadas pelo Partido Socialista para a Lei dos Estrangeiros foram chumbadas.
Durante o debate, o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, elogiou os “três maiores partidos da oposição” pelas “posturas construtitivas” que demonstraram durante a discussão da nova lei. O Chega adotou um “esforço de equilíbrio”, tal como fizeram a IL e o PS, mesmo este tendo votado contra. O Governo puxou dos galões para assegurar que criou uma lei que classificou como “irrecusável para qualquer partido moderado e de bom senso”.
Para Portugal, defendeu António Leitão Amaro, é mesmo um dia “decisivo e fundamental”. O ministro recorda que o Governo herdou uma “situação preocupante”. “Tinha de mudar e está a mudar. Vamos tomar um passo decisivo para regular a imigração e tratar e integrar com humanidade.” O governante lembrou que entraram milhões de pessoas em Portugal — e foram recebidas sem “humanidade”, causando problemas na coesão social. “Esse tempo de uma política de imigração irresponsável terminou”, declarou.
Por sua vez, o Chega, pela voz de Cristina Rodrigues, apelidou o texto como “suficiente”, antecipando a sua viabilização. Porém, a deputada avisa que o partido “quer ir mais longe” para “efetivamente regular a política migratória”. “Saudamos o Governo por termos conseguido apertar algumas das normas previstas inicialmente e por reconhecer que há abusos na atribuição de apoios sociais que devem ser combatidos. Deixando desde já claro que, para o Chega, quem não contribuiu, quem não descontou para o Estado português, não deve receber qualquer apoio”, disse, numa alusão a uma linha vermelha do Chega durante as negociações — a questão dos apoios sociais.
A mensagem do Chega é que, apesar de ter dado luz verde, Portugal continua a precisar “de regras claras firmes e justas”, defendeu a deputada, que falou mesmo em “remigração”. Essa ideia viria depois a ser recuperada pela deputada Rita Matias durante o debate, sugerindo que pretende expulsar do país todos aqueles que “não se integram” em Portugal.
Para o PS, que foi atacado durante o plenário pelos partidos à direita por ser o responsável pela política de “portas escancaradas”, o deputado Pedro Delgado Alves assumiu que o Governo identificou e até “deu resposta de algum modo satisfatório” a alguns pontos considerados inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional. Contudo, ressalvou que os socialistas consideram que o Executivo “poderia ter ido mais longe nalguns aspetos”, daí “não ter acompanhado a proposta com os termos em que é exposta” — e tendo, assim, votado contra a proposta do Governo.
Os socialistas defendem uma lei que garanta uma imigração “segura, legal e regular”, assim como que “promova o humanismo” na integração de quem vem para Portugal. Para o PS, também é importante “atender às necessidades da economia e dos seus setores-chave que muito necessitam de trabalhadores estrangeiros para assegurar a nossa prosperidade e o nosso futuro”.
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Durante o plenário, pela Iniciativa Liberal, Rui Rocha também confirmou que o partido votaria a favor do “conjunto de iniciativas pelas bancadas que suportam o governo”. O liberal afirmou que não é “sem críticas” que o faz, mas considera que se “perdeu tempo demais” nesta questão. “A nossa posição é muito clara: quem tem trabalho e quem cumpre fica. Quem fica um tempo alargado e adere aos princípios fundacionais da nossa sociedade pode aspirar à nossa nacionalidade.”
Rui Rocha declarou que o multiculturalismo “não funciona e não funcionará”: “As culturas e os valores das diferentes sociedades não são iguais”. O deputado liberal também deixou várias críticas à esquerda por defender o “descontrolo das fronteiras”, categorizando por “ingénuos, por sonsos, por ressabiados e por ortodoxos”. Para o ex-presidente do partido, ainda assim, o PS, “não cabe em nenhuma destas categorias”. Os socialistas seguiram uma visão “pragmática, mas erradas com consequências graves” que visava a manutenção de uma economia de baixos rendimentos.
À esquerda do PS, as críticas à nova Lei dos Estrangeiros foram muitas. O deputado do Livre, Paulo Muacho, disse que a imigração poderia ser uma oportunidade para “o país cada vez mais despovoado” e para “um encontro com a nossa história de migração”. Mas que, ao invés, é “um debate de oportunismo político, de quem decidiu explorar a fragilidade de quem Chega, de quem promove o ódio e divisão, e oportunismo político de um primeiro-ministro que diz que não é não, mas à primeira oportunidade fechou um negócio às escondidas com a extrema-direita para aprovar esta legislação”.
Para Paulo Muacho, “a lei foi mal feita desde o início” e que “em boa hora o Tribunal Constitucional e o Presidente chumbaram esta lei”. O deputado do Livre afirmou que a “escolha é entre linha de imigração com um canal legal que dá direito ou a ilegalidade e entregar estas pessoas a redes ilegais, que as exploram”.
Na mesma linha, a líder parlamentar do PCP, Paula Santos, atacou a proposta do Governo e do Chega — mas também atirou ao PS. “Nem vale a pena falar as propostas do Chega, que querem ir mais longe do ataque”, começou por dizer, lamentando que o PS se tenha tentado posicionar como “quem é o escolhido para uma legislação que ataca os trabalhadores imigrantes”.
O PCP continua a notar que existem atropelos no “reagrupamento familiar”. A deputada comunista descreveu como “desumano” que haja pessoas que trabalham há muitos anos correrem “o risco de não ver a permanência renovada”.
O Bloco de Esquerda, pela voz de Andreia Galvão (em substituição de Mariana Mortágua que está na flotilha humanitária de caminho a Gaza), fala numa “lei cruel”. A bloquista admite que “não está tudo bem com a imigração”, já que “há um modelo baseado em desigualdade que usa o trabalho imigrante para baixar os salários para todo e que explora os imigrantes”.
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