O clima de tensão que marcou a reunião do conselho de administração do Banco de Portugal do dia 23 de setembro levou ao cancelamento do almoço especial que estava previsto e que marcaria a despedida de Mário Centeno como governador. Estava em causa a apreciação de uma proposta que dizia respeito ao próprio Centeno e ao seu estatuto futuro no Banco de Portugal – e o (ainda) governador acabou por não comparecer no almoço, que acabou por ser anulado.
Em causa estava uma equiparação de Centeno a diretor – o que o colocaria, desde logo, num patamar salarial mais elevado do que o último que teve no Banco de Portugal antes de sair (para ser ministro das Finanças de António Costa, no final de 2015) já que nessa altura era diretor-adjunto.
Tal equiparação é legal, mas uma maioria de administradores entendeu, numa votação renhida, que o tema deve ser apreciado durante o mandato do novo governador Álvaro Santos Pereira.
Cerca de 10 dias depois, numa longa mensagem interna enviada a todos os departamentos do Banco de Portugal, Mário Centeno fez questão de mostrar novamente o seu desagrado (a primeira vez tinha sido no Parlamento) com a investigação que o Observador realizou à nova sede do Banco de Portugal —“uma realidade de muitas horas, para além do limite da física”. Entre a acusação dirigida a quem não terá respeitado “a história, os valores e a ética do Banco de Portugal” e o reviver dos princípios inscritos no “poema do Banco” que o próprio Centeno escreveu em 2023, o ainda governador apelou a que a “boa moeda” expulsasse no futuro a “má moeda” — processo ao qual o próprio Centeno deverá assistir, visto que anunciou que continuará na instituição “nos próximos anos”.
Pelo meio, o Governo fez questão de enfatizar na Resolução de Conselho de Ministro que nomeia Álvaro Santos Pereira que o novo governador tem o “perfil de competências e experiência profissional compatíveis com o exercício de uma liderança do Banco de Portugal que assegure a independência e transparência na sua atuação e, bem assim, a credibilidade e a sua afirmação como autoridade pública em matéria das suas atribuições.” Um recado para quem o Governo entendeu não reconduzir: Mário Centeno.
Era suposto que a reunião do conselho de administração de 23 de setembro fosse a última de Mário Centeno como governador do Banco de Portugal. Tal como estava combinado que, no final da reunião, seguir-se-ia na sala do conselho o tradicional almoço de despedida de Centeno, como costuma acontecer com todos os administradores e governadores que cessam funções.
Mas nem aquela reunião foi a última, porque o Governo demorou mais uns dias a nomear definitivamente Álvaro Santos Pereira; nem o almoço de despedida aconteceu. Tudo porque a reunião de trabalho acabou mal e num ambiente tenso que levou à anulação do almoço.