A APDP alerta para o burnout na diabetes, um estado de exaustão profunda provocado pela gestão crónica da doença. O problema, frequentemente ignorado, compromete o controlo metabólico e o bem-estar emocional dos doentes
A gestão diária e implacável da diabetes pode desembocar num cansaço mental severo, um fenómeno distinto do stress comum que a Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal (APDP) resolveu agora sublinhar. A propósito do Dia Mundial da Saúde Mental, a associação chama a atenção para o “burnout na diabetes”, um estado de esgotamento emocional directamente ligado às exigências terapêuticas da condição crónica.
Carlos Siopa, médico interno de Psiquiatria do Hospital de Santa Maria e colaborador da APDP, explica que este esgotamento, reconhecido desde 1983, não é uma mera frustração passageira. “O burnout na diabetes, reconhecido desde 1983, vai muito além do stress diário e pode ter consequências graves para o controlo metabólico e a saúde mental dos doentes. É um processo que resulta num estado de exaustão provocado pelo stress crónico da gestão terapêutica”, afirmou. O médico detalha que os sinais de alarme passam por uma negligência progressiva com as rotinas de autocuidado, uma sensação de impotência e uma visão pessimista sobre o futuro com a doença.
“É importante distinguir o stress relacionado com a diabetes e o burnout”, acrescenta Carlos Siopa. “O burnout é um estado mais profundo e inclui um distanciamento apático que afasta o autocuidado, tão necessário ao controlo metabólico.” Esta retirada tem consequências mensuráveis: estudos associam a condição a valores mais elevados de hemoglobina glicada (HbA1c), um marcador crucial que, quando descontrolado, abre a porta a complicações de saúde futuras.
Os factores que conduzem a este precipício são vários e acumulam-se. A sobrecarga de tarefas é esmagadora – a vigilância constante da glicose, o cálculo de hidratos de carbono, o ajuste de medicação. Tudo isto cria um pano de fundo de pressão permanente. Junta-se a frustração de não ver resultados tangíveis, um esforço que parece, tantas vezes, infrutífero. A consciência aguda de que a diabetes é uma companhia para a vida, sem cura à vista, pode minar a resiliência, enquanto a pressão interna e externa para uma perfeição inatingível nos valores glicémicos gera uma ansiedade que corrói.
Para enfrentar este desafio, a APDP defende uma mudança de abordagem. Estabelecer metas realistas e celebrar pequenos ganhos pode contrariar a sensação de fracasso. A tecnologia, como os sistemas de monitorização contínua de glicose, ao oferecerem dados em tempo real, podem reduzir a sensação de distanciamento e de trabalho invisível. Acima de tudo, sublinha-se a necessidade imperiosa de não enfrentar a batalha sozinho. Procurar apoio emocional, seja em grupos de pares ou em consultas de saúde mental, é visto não como um sinal de fraqueza, mas como um passo estratégico para recuperar o equilíbrio. No essencial, a mensagem é clara: cuidar da diabetes implica, inescapavelmente, cuidar da mente.
PR/HN
Outros artigos com interesse: