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Milei se apresentou em show de rock
Na última segunda-feira (6), enquanto o peso argentino desabava 7% em uma semana, o presidente da Argentina, Javier Milei, trocava a motosserra pelo microfone no Movistar Arena, cantando Panic Show como se o pânico fosse apenas uma letra de rock.
O evento marcou o lançamento de seu livro La Construcción del Milagro, com 573 páginas reunindo discursos e publicações em redes sociais. Cerca de 15.000 pessoas estiveram presentes.
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Milei vestiu jaqueta de couro preta, cantou nove músicas, em grande parte clássicos do rock argentino dos anos 1980, como Demoliendo Hoteles, de Charly García, e adaptou letras para ataques ao kirchnerismo.
A apresentação incluiu a Banda Presidencial, imagens de bombardeios no fundo do palco e uma versão de Hava Nagila, canção judaica, em reação a um ataque antissemita recente.
O show durou cerca de uma hora, seguido de discurso político, com custo estimado em US$ 260 mil, pago por apoiadores privados.
“Em 6 de outubro, no meio de seu período mais difícil como presidente, Javier Milei vestiu uma longa jaqueta de couro, entrou em uma arena lotada em Buenos Aires e pulou como uma estrela do rock, cantando clássicos do rock argentino” , registrou a Economist.
Enquanto isso, o Banco Central da Argentina enfrentava uma semana de intensa pressão cambial. Nos últimos dias, foram vendidos aproximadamente US$ 1,1 bilhão em reservas líquidas, incluindo US$ 678 milhões em uma única sessão, a maior operação desde 2019.
O objetivo era defender a banda cambial flutuante, cujo teto atual é 1.475 pesos por dólar. Apesar das reservas brutas de US$ 39 bilhões, as líquidas somam apenas US$ 6 a 7 bilhões, insuficientes para cobrir compromissos até as eleições de 26 de outubro.
No mercado paralelo, o dólar atingiu 1.510 pesos. Analistas alertam para risco de default em dívidas de US$ 34 bilhões até 2027.
A equipe econômica busca um swap de US$ 20 bilhões nos Estados Unidos, anunciado por Scott Bessent, mas projeções do Banco Trust indicam perda de US$ 10 bilhões em reservas até o final de outubro.
Enquanto Milei pulava no palco, o BCRA queimava reservas como se fossem palitos de fósforo. A operação chamou atenção pelo contraste entre o espetáculo e a crise real.
O lançamento do livro, prometendo um “milagre”, se tornou ironicamente um pretexto para justificar gastos bilionários para evitar um default que o próprio presidente dizia combater.
Escândalos de Milei
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Javier Milei ao lado da irmã, Karina
Em fevereiro, ele promoveu a criptomoeda $LIBRA, que subiu 1.300% em poucas horas e colapsou após venda de tokens por desenvolvedores, resultando em perdas de US$ 250 milhões para investidores.
Milei afirmou ter sido enganado, enquanto rumores apontam assessores próximos como responsáveis. Processo por fraude tramita em Nova York.
Em agosto e setembro, áudios vazados atribuíram à irmã do presidente, Karina Milei, a apropriação de 3% em contratos de remédios para deficientes, num total estimado de US$ 500 a 800 mil mensais.
A Justiça federal baniu a divulgação de novos áudios, e a investigação envolveu 15 locais revistados pela polícia.
Governadores provinciais também se afastaram. Em julho e setembro, 24 chefes de província aprovaram leis elevando gastos locais no Senado, forçando Milei a liberar fundos federais retidos.
Axel Kicillof, da província de Buenos Aires, classificou o show do presidente argentino como um “desgoverno”; Nacho Torres, de Chubut, ameaçou cortar energia; e Omar Perotti, de Santa Fe, alertou para o aumento do descontentamento social.
As restrições orçamentárias do governo interromperam obras e subsídios, produzindo um superávit ajustado de apenas 1,8% do PIB.
No mercado financeiro, os sinais de alerta se multiplicam
O índice Merval caiu 50% em dólares em 2025, o pior desempenho global. Bonds argentinos despencaram após a derrota de Milei em Buenos Aires, com investidores reagindo à incerteza eleitoral e aos riscos fiscais. Bitcoin e DAI se tornaram hedge para residentes preocupados com depreciação cambial.
Para analistas e investidores, o show de Milei é visto como um “último suspiro” de seu governo. Enquanto a banda toca no palco, reservas evaporam, mercados se retraem e aliados se distanciam, traçando um quadro de tensão e volatilidade no cenário político e econômico argentino.